quinta-feira, 12 de março de 2015

Lançamento "A Parede Cor-de-Rosa de Rodrigo Blue", de Júnior Ratts, na Livraria Cultura (13.3, às 21h)


No conto infantil para adultos de Júnior Ratts, Rodrigo Blue é um garoto, como o nome indica, azul. Azul mesmo, até as raízes do cabelo. Blue representa a cor atribuída ao sexo masculino, a dos meninos, mas pode ser compreendida – talvez seja melhor dizer ampliada – no sentido de tristeza e melancolia, que são sentimentos que envolvem o conflituoso personagem em estado de revelação ou insight.
Rodrigo há semanas mudou-se com os pais para nova casa e a ele foi destinado um quarto no qual há uma parede quase que completamente cor-de-rosa, a das meninas. Rodrigo de súbito enamorou-se de paixão, literalmente, pela parede: “Aquele menino amava a sua parede. Uma parede realmente linda (...) Rodrigo Blue poderia desenhar pássaros e borboletas aos montes naquele espaço em rosa de seu quarto não muito claro.” – o autor insiste muito no fato do quarto não ter janela maior, apenas uma pequena e perto do teto, e ser escuro.
Sofria Rodrigo em ver uma prateleira de madeira negra avançando impiedosamente contra a indefesa parede rosa, machucando-a com seus parafusos apertados, oprimindo-a: “tinha [o Rodrigo] finalmente a certeza de que não somente a parede estava presa, mas também ele, para sempre, naquele quarto, quase sem luz.”
Esse é apenas o primeiro grande momento da angústia e de construção de reflexões de Rodrigo Blue. Em outros momentos, como criança que é, prefere fechar os olhos e sonhar. E é nos sonhos que percebe que não quer nem precisa de outras cores, pois aquela, a rosa, lhe satisfaz. Abre os braços, ainda em sonho e sem medo, “e se deixa tocar pelo rosa”.
Nos sonhos, o “gigante” Rodrigo se une a aranhas, bola planos para derrotar aquela prateleira odiosa e perversa – auxiliada por um grupo de soldadinhos de plásticos furadores de olhos, presentes de seu avô –, libertar a amada de suas garras, digo, parafusos, e se vai a lugares cheios de borboletas, “para que o amor não acabasse nunca mais”... mesmo quando ele ainda se joga embaixo das cobertas com medo daquela sinistra risada no escuro adentro.
Rodrigo gostava daquela nova casa. E se gostava tanto, por que mudar? Poderia morar ali para sempre e daquele jeito! E assim deveria ser a sua parede – o pai ameaçou mudar de cor –, ou ela não teria o direito de escolher a sua cor e de ser o que ela é? Como fazer seus pais entenderem que nada havia de errado naquela parede e em sua cor? Que incômodo ela trazia que carecia que fosse transformada em algo que realmente ela não era? E qual a vontade da parede? Afinal, “como amar sem saber que aquele amor era uma vontade dos dois?” ou se você me amaria se eu mudasse de cor?
Chegam momentos de impasse na vida e, como Rodrigo Blue, quem não gostaria de “fechar os olhos e se deixar envolver por uma ausência de aflições”?
A parede cor-de-rosa de Rodrigo Blue, ilustrado pela designer Dedê Oliveira, ganhador do Prêmio Rachel de Queiroz de Literatura Infantojuvenil da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará, em 2011, é uma narrativa onde o autor se arrisca em tratar do traço mais íntimo do ser humano que é a sua sexualidade. Melhor ainda: de sua descoberta e afirmação. Na experiência do adolescente Rodrigo há atração, pulsão, desejo, toque, descobertas das sensações e muitas conjecturas, passando pelos afetos, sonhos, na busca da identidade – ou de sua compreensão –, da fuga do dogma sexual, num aparente monólogo pulsante – afinal é ele e a sua parede –, a partir do primitivo, quase instintivo, mas indo bem mais profundo do que isso numa relação surreal, simbólica de exploração de sua condição humana.
Por meio de metáforas claras e cores-de-rosa, o texto de Ratts fala da diversidade sexual fugindo dos clichês, dos estereótipos. Faz pensar sobre a ideologia normalizadora e a sua desconstrução.
Um quarto. Uma parede. Não há doença, nem perversão, nem se pensa ou se fala em pecado. Limpo como um conto de fadas. Vibrante como num liquidificador, e apoteótico como num momento, por exemplo, em que Rodrigo percebe que passava tanto tempo se preocupando com aquela vil prateleira na parede, que se esquecia de contemplar a sua parede amada, devotar seu tempo e dizer-lhe, com todo apreço, como ela era linda!
Parabéns ao autor por essa singela expressão e viva a cultura de paz, afinal, “as mãos quando querem atravessam todas as cores!”

Serviço Lançamento A Parede Cor-de-Rosa de Rodrigo Blue, de Júnior Ratts
Data e horário: 13 de março de 2015 (sexta-feira), às 21h
Local: Hall do auditório da Livraria Cultura (Shopping Varanda Mall – av. Dom Luís)
Antes do lançamento, a palestra “Literatura e Diversidade Sexual e de Gênero”, parte do projeto “Diálogos Diversos: diversidade e literatura em questão”.


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