quinta-feira, 28 de novembro de 2013

"Drogadição e violência são abordadas em campanha para jovens da Rede Pública Estadual" (28.11)


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Nos próximos dias, cerca de 1500 crianças e adolescentes de 10 a 14 anos, de todo o Ceará, irão receber o acervo da Campanha Educativa de Prevenção sobre o uso indevido de drogas. A ação é encabeçada pelo Projeto Eu Sou Cidadão – Amigos da Leitura, idealizado pela Associação para o Desenvolvimento dos Municípios do Estado do Ceará (APDMCE), com parceria da Fundação Demócrito Rocha (FDR), e que há mais de 10 anos trabalha temáticas de cunho social, convidando à reflexão e contribuindo com a formação cidadã de jovens cearenses.

O lançamento da campanha será no dia 28/11, das 14h às 17h, no Complexo das Comissões da Assembleia Legislativa do Ceará; e será marcado com o lançamento do livro “A Comédia nada divina de Dante da Silva no mundo das drogas”, de Arlene Holanda e Stélio Torquato Lima. Através da musicalidade do cordel, a problemática das drogas é enfocada nessa obra, que faz alusão ao clássico “A divina comédia”.

A campanha terá duração de pelo menos um ano e, durante esse período, coordenadores e Amigos da Leitura irão disseminar o tema das drogas por todo o município. Eles estarão nas escolas, centros comunitários, associações de moradores, CRAS, programas de rádio, entre outros espaços, lendo o livro e abordando a comunidade de forma criativa e lúdica.

A programação do lançamento contará com palestra da Dra. Socorro França, assessora especial de políticas públicas sobre drogas do Governo Estadual. Na oportunidade, o acervo de 6.000 livros e 2.000 cartazes será entregue aos coordenadores, que chegando aos seus municípios, deverão fazer a distribuição e o repasse da capacitação sobre a temática do livro e da campanha.

O lançamento será a culminância do Curso de Prevenção à Violência e o Uso de Drogas, destinado aos coordenadores municipais do projeto Eu Sou Cidadão, que estará acontecendo desde o dia 25/11, em Fortaleza. Para a capacitação, a APDMCE firmou parceria com a Divisão de Proteção ao Estudante (DIPRE)órgão integrante da Superintendência da Polícia Civil do Estado do Ceará, que tem como objetivo desenvolver atividades preventivas minimizando violência e o uso indevido de drogas.

Lançamento – Campanha Educativa de Prevenção sobre o uso indevido de drogas
Dia: 28 de novembro de 2013

Hora: 14h às 17h

"Pois é", de Chico Buarque e Tom Jobim (28.11)




Pois é
Fica o dito e o redito por não dito
E é difícil dizer que ainda é bonito
Cantar o que me restou de ti.

Taí
Nosso mais-que-perfeito está desfeito
E o que me parecia tão direito
Caiu desse jeito sem perdão.

Então
Disfarçar minha dor eu não consigo
Dizer que nós somos bons amigos
É muita mentira para mim.

Enfim
Hoje na solidão ainda custo
A entender como o amor foi tão injusto
Pra quem só lhe foi dedicação.

Pois é, e então...


quarta-feira, 27 de novembro de 2013

"Literatura Cearense? Na UFC, AGORA, tem disso sim!", Raymundo Netto para O POVO (27.11)


A Universidade Federal do Ceará me surpreendeu desta vez, tenho que admitir.
Entre os dias 10 e 13 de dezembro de 2013, acontecerá a 10ª edição de seu tradicional “Encontro Interdisciplinar de Estudos Literários do Programa de Pós-Graduação em Letras”, realizado por meio de seus alunos de pós-graduação e reunindo pesquisadores, professores e escritores, não apenas locais, e que, dentre seus objetivos, visa promover o diálogo entre a produção acadêmica sobre estudos literários com as demais áreas de conhecimento, o que é muito edificante, sabido que a literatura é, dentre as artes, a que mais facilmente usa de empréstimo todas as possibilidades de uma vida e, com emprego das palavras, as acolhe e as transfigura em beleza.
O tema do Encontro é “Para onde vai a literatura?” Claro, se Chauí estivesse aqui talvez nos perguntasse: “E ela precisa ir para algum lugar?”, “E o que nos interessa para onde ela vai?”, “E se ela vai, ela volta?”, “Afinal, e para que serve a literatura? Para nada - nos responderia -, e defenderia o direito de ela ser assim, desse jeitinho...” ou coisas do tipo Marilena clarividente de ser. Mas, até aí, nenhuma novidade...
O que me tomou de feliz assombro foi a realização, integrando o evento, do “I (primeiríssimo) Simpósio sobre Literatura Cearense”, que “contemplará os estudos sobre a produção crítica e literária de autores cearenses, contribuindo com o estímulo ao conhecimento e pesquisa dessa vasta e importante produção bibliográfica, retirando-a do ostracismo e ressaltando seu caráter original, irreverente e pioneiro [...]” Ou seja, além de contar com a presença de alguns autores e fomentadores da literatura cearense, teremos oportunidade de conhecer os novos pesquisadores da produção local, além de abrirem espaço para lançamentos de obras contemporâneas e realizarem sorteios de livros raros da nossa bibliografia do “Siará Grande”.
Sinceramente, eu já vinha perdendo as esperanças com a UFC, desde as últimas ausências de oferta da disciplina (infelizmente ainda) optativa de Literatura Cearense I ou II ou de ambas, o que, diante da semestral incerteza, ainda é um problema. Também nos é preocupante que muitos dos professores de literatura não tenham afinidade nenhuma com o passado literário do Ceará, e perceber que raros são os que encontramos em eventos literários na cidade. Também difícil constatar a ignorância de alguns jovens alunos das disciplinas de pós-graduação a investirem contra a literatura cearense, por birra, preferindo ostentar no peito a mineira, a paulista, a carioca, a baiana, a do Sri Lanka, mas quando se fala na cearense, torcem a boca azeda de papagaio: “Isso é bairrismo!”
Imagino o quanto deve estar sendo difícil para esses corajosos estudantes da comissão organizadora ousarem falar em literatura cearense logo onde: no Ceará! Deus os livre! Mas cabe a nós, CEARENSES, e afins da literatura, que assistimos todos os dias a essa ausência, que nos apropriemos dessas iniciativas, que as incentivemos, que estejamos lá, participando, dando a nossa cara ao que é nosso e que até pouco tempo parecia ser quase um tabu.
Entendamos que estamos levantando a bandeira de um patrimônio, o literário, que as editoras se negam a publicar, pois acusam não ser do interesse leitor, e que, certamente, aos poucos, vão se resumindo em obras raras de bibliotecas, também abandonadas pelo poder público, simplesmente porque a elite tabletizada e ebuquizada não precisa delas. Melhor seria investir em mais parques aquáticos ou aquários. Muita água, de deixar um Ceará inteiro sequinho.
Bem, gente, o evento é aberto a todos e as inscrições também. Para nós, ouvintes, o valor é uma ninharia. Vamos participar, divulgar e compartilhar.
E quando nos perguntarem “Para onde vai a literatura?” Que possamos dizer: “Para onde nós quisermos que ela vá!”


terça-feira, 26 de novembro de 2013

Leitura crítica de Lúcia Facco para "Os Acangapebas", de Raymundo Netto (26.11)


Raymundo, seu texto é excepcionalmente bom. Um dos grandes prazeres em trabalhar com leitura crítica é justamente a oportunidade de me deparar com textos como o seu.
Para começo de conversa, devo dizer que tenho uma grande simpatia pela narrativa curta. Gosto muito do formato "conto". Logicamente, apesar dessa "preferência", o que me agradou no seu livro foi muito mais do que isso.
Sua escrita é impecável. O léxico utilizado é excelente, inclusive com a ousadia (especialmente se tratando de um autor iniciante) de criar neologismos, como um "aprendiz (ou antes, discípulo) de Guimarães Rosa". Você maneja as palavras com desenvoltura e criatividade, explorando toda a gama possível de significados.
Sem dúvida alguma, sua maneira de escrever deixa claro que você é um leitor treinado, íntimo de textos de autores sofisticados.
Sua linguagem é bastante expressiva e os temas tratados têm o caráter universal da "grande literatura". Cada conto é um mergulho na alma humana com suas peculiaridades, seus segredos, como o da mulher que guarda uma singela boneca no sótão, deixando a todos intrigados, ou o da cruel velhinha que, como a bruxa de João e Maria, cuida e alimenta os gatos para poder devorá-los. Há um desfile de personagens que nos emocionam com suas frustrações, decepções, seus despertares para um auto-conhecimento triste e para a sua invisibilidade e insignificância para o mundo que os cerca.
Podemos encontrar também contos que trazem uma amarga ironia, como o da mulher que, no fundo, no fundo, fica feliz por descobrir que o marido tinha um caso com a empregada, por sentir-se livre de um fardo: o sexo com um homem a quem não ama mais.
Enfim, seus contos exploram a complexidade humana de uma forma profunda e criativa.
Eu analiso os textos em dois níveis: o da forma e o do conteúdo. Os seus contos são excelentes nos dois aspectos da leitura.
Não me admiro nada com o fato de você ter recebido o prêmio da Academia Cearense de Letras.
Se seu livro não tivesse sido publicado, com certeza eu daria uma belíssima carta de recomendação para as editoras.
Não percebi nenhum aspecto negativo no seu texto e, portanto, tenho apenas uma sugestão a fazer: continue escrevendo!

Um abraço, Lúcia Facco.

Lúcia Facco é graduada em Letras (português-Francês), especialista e mestre em Literatura Brasileira, doutora em Literatura Comparada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), crítica literária e escritora. Tem Várias publicações técnico-científicas, além de livros de ficção. É autora dos livros As heroínas saem do armário (GLS, 2004), Lado B (GLS, 2006) e Era uma vez um casal diferente (Summus, 2009). Ganhadora do Prêmio Alejandro Cabassa (Melhor Livro de Contos), da União Brasileira de Escritores, e o Prêmio Arco-Íris de Direitos Humanos, na categoria “Literatura”. Editora da “e-mosaicos”: Revista Multidisciplinar de Ensino, Pesquisa, Extensão e Cultura do Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira (CAP-UERJ)

sábado, 23 de novembro de 2013

"Kennedy: a história recontada, 50 anos após Dallas", por João Soares Neto


“A mudança é a lei da vida. E aqueles que apenas olham para o passado ou o presente irão com certeza perder o futuro.” (JFK)
Hoje, 22 de novembro, é data forte na história recente da humanidade. Há 50 anos, John Fitzgerald Kennedy- JFK, presidente dos Estados Unidos, morria assassinado na cidade de Dallas, Texas, vítima de um isolado atirador ou de complô, até hoje não bem esclarecido.
O menino “Jack”, seu apelido de família, era o segundo filho de Joseph Kennedy, empresário descendente de irlandeses, poderoso e, segundo muitos, sem escrúpulos. Joseph ganhou dinheiro de forma não republicana, como muitos ainda o fazem hoje no Brasil e no mundo. Achega-se a políticos, apoia-os generosamente, e, posteriormente, cobra, com denodo e ágio, o que doou. Joseph Kennedy chegou a ser, em uma das contrapartidas aos seus favores, embaixador dos Estados Unidos na Inglaterra. Quis que o filho JFK chegasse a Presidente. Assim aconteceu, mas as tragédias que se seguiram consumiram quase toda a sua família.
Joseph criou os filhos para o sucesso, mas a vida é caprichosa. O seu primeiro filho, também Joseph, morreu prematuramente na Segunda Guerra e coube, a John, educado com rigor e aprumo, com distinção na Harvard University, a honra de ser o primeiro escolhido, embora fosse tímido, mas brilhante. “Jack” também esteve na Segunda Guerra e dela saiu como herói da marinha por ter salvado colegas em um naufrágio. Assim, tempos depois, ingressa na política, elege-se deputado federal, senador e, em 1960, concorre com Richard Nixon à presidência. Sai vitorioso, ao lado da bela e elegante esposa, Jacqueline Bouvier, Jackie, descendente de franceses, que dava “finesse” ao casal. Segundo alguns historiadores, a vitória apertada foi discutível do ponto de vista ético.
Eleito, proclamou, na posse, um discurso histórico, feito a muitas mãos. Acercou-se de secretários (ministros, no Brasil) de alto nível e começou a governar. É bom lembrar, de passagem, que o mundo vivia a Guerra Fria, os EEUU brigavam com a URSS pela hegemonia espacial e a entrada dos soldados americanos no Vietnã foi respaldada por JFK.  Além disso, Fidel Castro, que derrubara Fulgêncio Batista, o velho ditador de Cuba e amigo da América, assume ser comunista e recebe total apoio russo, inclusive com a entrega de mísseis apontados para os Estados Unidos. Asilados cubanos nos EEUU, especialmente Flórida e de outros estados, em abril de 1961, tentam, com discreto apoio de JFK, uma invasão (Baía dos Porcos) atabalhoada para aniquilar Fidel e são derrotados. JFK fica silente. A tensão aumenta, mas o governo americano fica quieto, apesar de impor embargo econômico total – e ainda vigente – sobre Cuba, a pequena ilha, calo eterno do gigante americano. Quase houve uma guerra nuclear.
 Por outro lado, JFK e Jacqueline deixaram que se criasse o mito do casal perfeito, ressurgindo a lenda do castelo do Rei Arthur (século VI), conhecido pela peça “Camelot”, baseado no livro de Geoffre de Monmouth. JFK admitia que seu governo fosse uma espécie de Távola Redonda, com muitos Cavaleiros. Assim, a Casa Branca, tornou-se requintada e receptiva, fazendo convites a chefes de Estado, intelectuais, celebridades, escritores, poetas, personalidades e artistas. Acreditem, até a grupo de jovens líderes/estudantes universitários brasileiros - que estava cumprindo estudo na mesma universidade que ele cursara - e do qual eu fazia parte, foi convidado e bem recebido. Conversamos com ele, nos jardins internos, local onde recebia os chefes de Estado. Isto é, entretanto, mero e irrelevante detalhe.
O fato é que a reconhecida e proclamada virilidade de JFK foi despertada por muitas beldades, destacando-se Marilyn Monroe que teve a audácia de cantar, de forma adocicada, os parabéns no aniversário do Presidente, em festa palaciana, na presença da primeira dama, a cuidar de dois filhos pequeninos. Marilyn morreria logo depois, sem “causa mortis” esclarecida.
Assim, chegamos a novembro 1963. A administração de JFK, louvada pela maioria, sofria oposição dos republicanos e de parte da imprensa. Já em campanha para a reeleição, o casal sorridente e belo, chega ao Estado do Texas. O Texas fora tomado, narra a História, em batalha no século XIX, do território do México e, regularizado, posteriormente, por um ridículo acordo financeiro entre os dois países.
Na bela e trágica manhã/tarde de 22 de novembro de 1963, ensolarado e ameno outono, em carro aberto, desfilava em Dallas, o casal “Camelot”, elegante e radiante, acompanhado pelo governador Connaly e Nelly, sua mulher, era aplaudido pela multidão, cercado por carros e motocicletas com policiais e dois agentes dentro do veículo. JFK foi morto, na Praça Dealy, com tiros certeiros de fuzil, provavelmente por Lee Oswald.
Hoje, 50 anos depois, centenas de teses, estudos e biografias – autorizadas e não autorizadas, filmes de ação e documentários, levantam dúvidas sobre o fato, sequer esclarecido pela Comissão Warren, sobrenome do então presidente da Suprema Corte americana, equivalente ao Supremo Tribunal Federal. O relatório foi apenas conveniente e nada profundo. A maioria dos americanos acredita, ainda hoje, em conspiração. Máfia? Cuba? URSS? Texanos? Adversários/ L. Johnson?
Faço-me longo, mas não poderia deixar de me repetir, pois já escrevi – e escreverei  sobre JFK. Ele, aos nos receber, risonho e jovial, disse: “Quantos de vocês serão candidatos a presidente do Brasil?”. E a conversa foi bem além disso, apesar do protocolo.

Finalizo: Charlei Bartlett, jornalista americano, ganhador do Prêmio Pulizter, a maior honraria da imprensa, escreveu, ainda em fins de 1963: “Nós tivemos um herói como amigo. A coragem dele era incomum. Tinha ele um senso de humor incrível, uma inteligência penetrante marcada pela curiosidade e, em geral, uma incomparável galhardia. Ele era o que possuíamos de melhor... e, vamos com o passar dos anos recontar a história, com um pouco de assombro”. Foi o que tentei.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

"GeRatão Coca-Cola", crônica de Raymundo Netto para o almanaque "De Um Tudo" (10.2013)


O rato roeu a rolha do rem... não, gente, isso é coisa do passado. O rato entrou mesmo foi numa garrafa de Coca-Cola. Dentre todos os refrigerantes, ele, que é rato mas não é besta, escolheu o melhor, o que “dá vida a tudo!”, porém, não leu o manual de instruções, inebriou-se de caramelo IV até as fuças, tal qual um d. Ratão da história da dona baratinha, que morreu porque enveredou com a cara e a coragem num latão fervente de feijoada, tendo semelhante e trágico final. Acho que era isso que o poeta Fernando Pessoa queria dizer quando escreveu o slogan luso da xaropada: “Primeiro, estranha-se; depois, entranha-se", o que convenceu o diretor de saúde de Lisboa a jogar uma carga inteira de Coca no infante mar português, que de salgado ficou doce, feito as lágrimas das raparigas.
A Coca-Cola tem diversos defeitos, mas há um mais imperdoável de todos: ser sucesso! A Pepsi, por exemplo, “pode ser”, mas a Coca “é isso aí”. Tem mais de 120 anos – foi criada em 1886, mas apenas em 1893 foi registrada –, tempo este em que ostenta, com certa adaptação, a belíssima caligrafia original da logomarca.
Nos começos, ninguém nem queria pagar por aquilo, era dada de graça, depois vendida em lojas de doces (com tampas de rolha), em bar, sorveteria, em farmácias, no meio de rua, afinal, quem conseguia classificar o que diabo era aquilo: remédio, refresco, enfeito? Só se sabia que fazia umas cosquinhas no nariz e ventava à boca. Só em 1916 ela viria naquela garrafinha bojuda que conhecemos. O designer queria fazer algo parecido com a fruta do cacau. Vai ver pensava que aquilo era de chocolate.
Nos anos 30, foi a Coca a enrolar as criancinhas com o gordo (de tanta Coca) Papai Noel rubro-negro. Durante a Segunda Guerra, numa estratégia brilhante e pra lá de curiosa, a Coca convenceu o governo dos Estados Unidos a levar na bagagem das tropas americanas, ao invés da foto de cabeceira da família, uma megareserva (e pequenas fábricas móveis) de Coca, o que fez dos soldados “cabeças de papel” os seus maiores divulgadores por todo o mundo. Inclusive, em Fortaleza, as mocinhas modernosas, fãs de cinema, comedoras de pop corns e fãs de pracinhas estrangeiros do Cassino do Estoril, logo, logo seriam rotuladas, como as garrafinhas, de “coca-colas”, sendo criticadas pela Igreja – sempre equivocada com as “boas novas” – e pelos rapazes da vizinhança que descobriam não ser a última Coca-Cola do deserto e que nem de longe beijavam como o Gable e o Bogart... “Eu tomo uma Coca-Cola, ela pensa em casamento”.
Contam-nos as línguas marrons que o Ministério da Saúde getulista teve de aumentar, nos seus protocolos, a quantidade aceita de ácido fosfórico em refrigerantes para que a Coca pudesse ser liberada no país. Na época, em experiência com ratos, sempre os melhores degustadores da Coca, os ossos esfarelavam. O problema, enfim, não é a Coca-Cola, é a falta de coador, gente. Tá vendo se vou parar de tomar esse troço... Já não fumo, não bebo, não como açúcar, não ouço funk nem forró de plástico... desse jeito vou viver muito e eu não quero não, ó. Viver dói demais...

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Inéditos de "Os Acangapebas" I: Tentação, de Raymundo Netto para O POVO (13.11)


"Você é um velho. Um velho!" Assim o espelho do banheiro o saudava todas as manhãs. Mas isso nem de longe seria sua maior aflição. Logo em seguida, sua esposa sairia, linda e fresca, do chuveiro, a beijocar-lhe o rosto, levemente, como se beija...um pai! Esta, sim, lhe era, seguramente, a mais perversa e assídua humilhação de sua vida.
Há 20 anos, o casal perfeito. Ele, um professor quarentão, muito reconhecido e mesmo invejado pelos seus pares; ela, aos 20, uma aluna, ansiosa em iniciar a carreira na esteira daquele homem a orientá-la com a segurança de um farol. Ambos tão dedicados a mesma coisa que nem precisariam de filhos ou de ninguém. Se bastavam em tudo: conversas de entrar noite e dia, dia e noite, com intervalos generosos para o amor, por vezes selvagem, beirando o obsceno, como num romance, na ânsia de um destino ditoso, improvável e feliz.
Mas o tempo foi se chegando e, nas ancoretas, ao invés de vinho, vinagre. O professor, aposentado, pôs-se a envelhecer numa melancolia de dar dó, agarrando-se a sua solidão, a quem sinalizava a "única companheira fiel", enquanto a esposa, ao contrário, progredia a olhos vistos, viajando costumeiramente, convidada para as mais diversas atividades, cumprindo o plano que traçara junto daquele a quem um dia rogou juras de um amor irresponsavelmente eterno.
Difícil confessar, mas para ele, vê-la ali, todos os dias, ouvi-la em seus sucessos, tornou-se um castigo. Ela era o verdadeiro retrato de sua decadência. Com os anos, era inegável, estava mais segura, mais radiante, e muito, mas muito mais bonita. O tempo, pensava, rasgava-lhe com os dentes, enquanto com ela, apenas lambia.
Para o professor, incomodava as poucas vezes em que ia à faculdade, em homenagens chorosas e sem sentido, de culto ao passado, a só lhe enaltecer o obsoletismo. Como lhe doíam as lembranças daquilo que fora e tivera, mas que nunca mais. Irritava-se também com os modos cavalheirescos dos professores a rodear-lhe a esposa sempre sorridente e solícita, como se a qualquer momento fosse dançar num salão. Poderia ser feia, ignorante, fria como a miséria, mas não, muito pelo contrário, era tudo aquilo que sempre pedira a Deus, mas a um Deus analfabeto, que escreve por linhas tortas. Daí no que deu.
Marcílio, um jovem colega do departamento, se mostrava um dos tais que não largava das saias da mulher. Sempre inventando projetos novos, ligando altas horas da noite, convocando para reuniões a qualquer momento. Sabia o professor, no entanto, que abusava do ofício para ganhar alunas, tendo sido até flagrado certa feita, no que resultou um inquérito frustro. Por isso, mais difícil ainda compreender a amizade dela com a figura. Ruim de engolir, mas cria: ela  já havia caído nos braços daquele insistente cafajeste.
A esposa, na verdade, numa ingenuidade distraída de mulher honesta, encontrara em Marcílio um bom ouvido. Contara da indiferença do marido em casa, da sua pouca paciência com assuntos de rotina, de sua recusa em passeios antes comuns, da estranheza e diferenças entre os dois. Queria colo e o encontrava na dissimulação de desinteressado amigo, que a abraçava e dizia poder contar com ele para qualquer coisa, "Qualquer!", insistia. Sim, a desejava, mas não se preocupasse: respeitaria a sua condição fiel. Nisso, na determinação do seu fingimento e com a trama da intimidade, a mulher num feio dia lhe segredara: temia pelo marido. Parecia sempre tão deprimido e trazia, na cabeceira da cama, um revólver. Não gostava nem de ver. Pensaria em se matar? Será? Pensaria?
Tarde de uma noite, como tantas, ela não havia chegado. O marido, mergulhava em seu mundo de escritos, sentado à sombra da possibilidade da traição daquela mulher que um dia se disse sua, "Só sua!". Foi quando Marcílio soleirou à porta da casa. O professor desconfiou, gritou com ele, perguntou pela esposa. "Cadê ela?" Marcílio sorriu sem cerimônia:
– Ela é boa demais para você, velho. Não aguenta mais. Por que não morre logo, diabo?
Foi a gota d'água. Indignado, ele correu para o quarto, seguido pelo suposto amante, e pegou o revólver na cabeceira, apontando para o rival. Mas que erro! Marcílio era forte. Tornou com facilidade a arma em direção ao professor e, usando de sua própria mão, apontou-lhe à boca, forçando o gatilho. E foi lá mesmo, no nó de engasgos em sua garganta, onde se enlojou a bala, a mesma que, desde muitas noites silenciosas e de espera, ele desejava, mas não ousara plantar.
Por ironia, ou não, pela manhã, a própria mulher esclareceria para a polícia:
– Eu devia saber que não podia deixá-lo sozinho. Faz tempo, desconfiava que isso poderia acontecer. Ele estava tão estranho... tão... – e chorava lágrimas sem fim.

No velório, não se afastou do caixão, numa vigília doce e prolongada. Marcílio chegou, de roupa nova e cheiro de colônia, pegou em seu ombro e com todo o calor de seu corpo a consolou num abraço. E, oferecendo-lhe amizade incondicional, deixou cair a mão com leveza, roçando a bunda provocante da jovem viúva que, naquele instante, sentira num arrepio do corpo o alívio de um remorso.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

"Bastardos", no Cinema do Dragão (3.11)


No sábado assisti, pela primeira vez, um filme nas salas do Cine Dragão do Mar, agora sob a regência da Fundação Joaquim Nabuco.
O cinema está uma beleza, mas o público continua variando entre nenhuma a algumas almas perdidas. Claro, devo levar em consideração que assisti a sessão das 16h num Dia de Finados.
Conheci o café contíguo à sala de projeção. Fui muito bem atendido por moças simpáticas. Ainda bem.
O filme era "Bastardos" (Les salauds, 2013), dirigido por Claire Denis. Os filmes franceses sempre me fazem crer que perdi alguma coisa ou que demitiram o continuista. Mas é só o péssimo costume e o hábito MGM de ver o mundo que quando são um tanto quebrados, assim como nas
Na história, de personagens nada carismáticos nem agradáveis, que bem poderia ser um conto de Nelson Rodrigues, se fosse menos extenso e tivesse algum motivo de riso, o personagem Marco Silvestri (Vincent Lindon), um capitão de marinha mercante, recebe a informação de que seu cunhado se suicidara. Abandona o navio, deixando para trás os ratos (que geralmente o deixam primeiro), para acudir a irmã (Chiara Mastroianni), só no mundo com a filha Justine, que está pinelzinha, de andar nua nas ruas escuras de uma não Boulogne parisiense. Toma conhecimento da falência do casal, da má administração de uma fábrica de sapatos (competir com Louboutin não é fácil não...), herança de seu pai, e do estado desequilibrado da sobrinha. Pensa que o culpado de tudo é o velho empresário Laporte, e se aproxima de amante, a jovem Raphaelle. Obviamente, a nouvelle vague, Marco e Raphaelle se descobrem apaixonados. Marco é um personagem sombrio, com uma necessidade de proteção à família exemplar, sabe-se lá os motivos, e, durante o filme, abre mão de tudo que tem para descobrir o que aconteceu de verdade e proteger a todos (são muitos) os que lhe são caros. O fim é inevitável, mas eu não vou contar não.
Cenas fortes (traição, pedofilia, estupro, drogas), idade indicada de 18 anos.
O que importa: vamos dar vida ao cinema do Dragão!

Confira a programação: cinemadodragao.com.br 

"Autores & Ideias", 5 anos no centro das discussões (4.11)

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O programa "Autores & Ideias", da FM Assembleia 96,7, está completando 5 anos no ar. Em comemoração, apresenta uma série especial em novembro, com a participação de nomes representativos da literatura cearense, dentre os quais de Ana Miranda, que aconteceu no sábado (2.11), mas que será reprisado, como de costume, na terça-feira, AMANHÃ, às 20h.
No programa, uma entrevista sobre seu novo livro, a novela "O Peso da Luz: Einstein no Ceará", lançado pelo Armazém da Cultura. Ana discorre não apenas sobre a obra em si, mas a contextualiza diante de sua obra, fala sobre o processo de criação, da sua técnica narrativa, de expectativas editoriais, dentre outros assuntos de muito interesse para quem escreve, lê e publica.
O livro pode ser adquirido no site do Armazém e outras informações basta ligar para o telefone no cartaz anexo.
Acessem e curtam a página do Facebook do "Autores & ideias" e fiquem a par dos melhores lançamentos e entrevistas com seus autores: 
https://www.facebook.com/ProgramaAutoresIdeias?fref=ts

O "Autores e Ideias" é produzido e apresentado por Lílian Martins, sob a coordenação geral da jornalista Fátima Abreu.


domingo, 3 de novembro de 2013

"Interior", do Grupo Bagaceira de Teatro (2.11)


Ontem, na Casa da Esquina, assisti à "Interior", com o Grupo Bagaceira de Teatro, projeto aprovado no edital de manutenção de grupos e companhias teatrais da Petrobras. A peça já passou pela assistência de algumas cidades interioranas, onde realizaram as pesquisas que culminaram com o espetáculo, dentre elas: Itarema, Tauá, Icó e Beberibe.
Na peça, o público é convidado a integrar uma roda de cadeiras na calçada (em forma de arquibancada), o que muito me atrai. A princípio, duas velhinhas, duas campesinas, interpretadas com muita competência pelas jovens Samya de Lavor e Tatiana Amorim, em figurinos (trajes e máscaras/caretas) impagáveis, assinados pelo também diretor Yuri Yamamoto, se encontram e põem-se num diálogo que, por vezes, parece não existir, assemelhando-se à lembrança, a algo surreal. Depois, concretiza-se o encontro concreto onde se criticam, ralham, brigam, trocam figurinhas e retratos antigos que dizem de um passado artístico, dum imaginário cultural encontrado nas buscas do Grupo.
Nas "calçadas", o público enredado na trama é servido de bolinho, ouve rádio ("Gavião Calçudo", sucesso de Pixinguinha e Cícero de Almeida) e ouve as historinhas de vovós, bisavós, tataravós e outras parasempre vós de nunca morrerem. Era Dia de Finados, então, a temática caiu muito bem. Eu, pelo menos, fui acometido da saudade da dona Zilma e da dona Alice (esta, inclusive, era tão do contra, que "decidira" nascer no dia dos finados, veja só).
O diálogo, ao final, corria ligeiro, embolado como cantoria de cordel, texto muito bem escrito por Rafael Martins, que também faz uma ponta em "Interior", até a apoteose de músicas do grupo "Acasos das Dramistas", de Beberibe, interpretadas ao final, com o também envolvimento do público.
O Grupo está de parabéns e aconselho demais "Interior", que será apresentado nos sábados e domingos de novembro, às 19h (foram pontuais), na Casa da Esquina (rua João Lobo Filho, 62 - por trás do Hospital Antônio Prudente), com preço de R$ 20,00 (inteira) e R$ 10,00 (meia).


Dica para o público: Não aconselho sentarem nos extremos das arquibancadas, a perda da visibilidade e da proximidade das atrizes/personagens compromete a sua introspecção.

Rádio AlmanaCULTURA: "O que Será (à Flor da Pele)", de Chico Buarque (2.11)


Para ouvir: http://www.youtube.com/watch?v=Oe7IZHW51c4

O que será que me dá
Que me bole por dentro, será que me dá
Que brota à flor da pele, será que me dá
E que me sobe às faces e me faz corar
E que me salta aos olhos a me atraiçoar
E que me aperta o peito e me faz confessar
O que não tem mais jeito de dissimular
E que nem é direito ninguém recusar
E que me faz mendigo, me faz suplicar
O que não tem medida, nem nunca terá
O que não tem remédio, nem nunca terá
O que não tem receita
O que será que será
Que dá dentro da gente e que não devia
Que desacata a gente, que é revelia
Que é feito uma aguardente que não sacia
Que é feito estar doente de uma folia
Que nem dez mandamentos vão conciliar
Nem todos os ungüentos vão aliviar
Nem todos os quebrantos, toda alquimia
E nem todos os santos, será que será
O que não tem descanso, nem nunca terá
O que não tem cansaço, nem nunca terá
O que não tem limite

O que será que me dá
Que me queima por dentro, será que será
Que me perturba o sono, será que me dá
Que todos os tremores me vêm agitar
Que todos os ardores me vem atiçar
Que todos os suores me vêm encharcar
E todos os meus nervos estão a rogar
E todos os meus órgãos estão a clamar
E uma aflição medonha me faz implorar
O que não tem vergonha, nem nunca terá
O que não tem governo, nem nunca terá
O que não tem juízo