quinta-feira, 5 de maio de 2011

"Nova festa, 30 Anos Depois", de João Soares Neto, para O Estado


Hoje será o dia da festa da insanidade coletiva. Estações de Televisão de todo o mundo disputarão lugares estratégicos em um trajeto de pouco mais de dois quilômetros. Dignitários, nobres, bobos da corte, com fraques — muitos deles, alugados — e cartolas; ladies, catadoras de convites e celebridades ocasionais em vestidos curtos ou longos, joias ou semi-joias, estarão à procura de câmeras para os seus sorrisos e, portarão, em seus bolsos, máquinas fotográficas para, furtivamente, registrar o acontecimento. Depois, mostrarão, orgulhosos, às suas famílias e amigos. Vocês sabem que cada convidado recebeu um Manual de Procedimento para dizer horários, lugares a ocupar quais as vestimentas adequadas, as condutas certas e como devem ser os cumprimentos e até meneios de cabeça para os integrantes das muitas famílias reais presentes? Vocês ainda acreditam em contos de fada? Preferem Cinderela? Carruagens mostrarão o anacronismo da tradição que teima em ficar à tona. Uma família, dizem, com graves problemas comportamentais finge se unir e se apega às verbas anuais de um tesouro combalido. E.Burke, político inglês do século 19, já dizia: “Quanto maior é o poder, mais perigoso é o abuso”. O que faz uma família real neste século 21 assolado por grave e contínua crise econômica em toda a Europa?

Cerca de 1.900 convidados estarão presentes à abadia, 650 irão à recepção e apenas 300 comparecerão ao jantar, dito íntimo. Como se vê, haverá, entre os convidados, seleção de castas. O mundo, depois do fim da guerra fria, do ataque de 11 de setembro de 2001, do vertiginoso crescimento da China e dos combates fabricados no mundo muçulmano não pode se dar ao luxo de uma ostentação inócua, inconsequente e dispendiosa de uma boda que pode – ou não – dar certo.

No dealbar desta segunda década, a Europa está em processo anunciado de fadiga econômica. Tenta manter-se altiva e engendra soluções emergenciais para países que posaram de ricos e passam por cortes em orçamentos, pedem empréstimos de organismos internacionais e acreditam que o bloqueio à entrada de imigrantes de países que, em boa parcela, foram colonizados pela velha Albion, pode ser uma das soluções. Domingo, televisões, jornais, tablóides e revistas sérias de todo o mundo, trarão edições especiais da pantomima. É o começo da primavera por lá, mas, se chover, será um sinal lacrimoso do desperdício e da falta do que fazer. Repete-se o que aconteceu há 30 anos e, todos sabem no que deu. Traições e morte. Parafraseando La Rochefoucald: os nobres são como certos quadros: para admirá-los não se deve olhá-los muito de perto. God save the insanes!

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