domingo, 13 de junho de 2010

"As Leituras, as Viagens", crônica do leitor-escritor Carlos Vazconcelos

Capa de "México: história duma viagem" de Érico Veríssimo

Todos dizem que ler é viajar. Isso é fato consumado, mesmo na opinião de quem nada lê.

Ler Josué Montello, por exemplo, é transportar-se para o Maranhão. Jorge Amado nos leva à Bahia. Com Machado, retrocedemos ao velho Rio de Janeiro imperial (e às profundezas da alma humana). João Guimarães, Graciliano e Rachel nos conduzem a uma pátria chamada Sertão. E assim segue o leitor, nas mais variadas e pitorescas aventuras, turismo espiritual. Desse modo, quem tem boa biblioteca possui de saldo uma agência turística virtual, sem os protocolos e a burocracia das convencionais.

Pois estive viajando, esses dias. Li Érico Veríssimo e viajei ao México...
– Ao México, tchê?
Sim, senhor! E de trem. Mas tudo bem, compreendo a estranheza. Quem lê Veríssimo viaja não é para os pampas? E escuta aquela música ao longe (talvez um solo de clarineta), vinda do tempo e do vento, que varre os lírios do campo pelos caminhos cruzados?

Floreios à parte, explicarei melhor. Estou me deleitando com a leitura do livro intitulado México, do escritor gaúcho. É daqueles livros injustamente esquecidos. Como se dizia antigamente, o lado B do long play. São notas de viagem, testemunhos de vida, capítulos de humanidade de um escritor que, ao sentir-se sufocado pela vida diplomática, em Washington, consumido pelo desejo de umas férias, chega em casa e sugere à mulher:
– Vamos ao México?
Esse bem poderia ser o título do livro, pois realmente o convite se estende ao leitor.

Qualquer um o aceitará prontamente depois de ler o Prólogo, onde o autor trava um delicioso colóquio com o mestre William Shakespeare em torno das razões que o aliciam a arredar pé da metrópole americana. Lá, "tudo funciona direitinho, um modelo de organização, um primor de urbanismo". E sentindo-se um gato preto em campo de neve, desabafa ainda: "Sinto saudade da desordem latino-americana, das imagens, sons e cheiros de nosso mundinho em que o relógio é apenas um elemento decorativo e o tempo, assunto de poesia".

Sempre em que se tratar de um grande autor, devemos dispensar um pouco mais de atenção a alguns livros considerados menores. Um grande escritor é multifacetado e dificilmente sua pena admite um rótulo impostor.

Para uma grande pena, não existe literatura amena. Exemplo: na consagrada obra machadiana, não esqueçamos jamais de ler O Alienista.

Com tantas investidas assediantes em torno de Gabriela ou Tieta, alguém se lembrará de ler Terras do Sem-fim, de Jorge Amado, talvez o seu melhor romance?

Da vasta bibliografia de Érico Veríssimo, num cantinho escuso de prateleira, achamos o México, a paisagem do México, o sentimento do México.

Viaje! Não perca tempo! Vá à biblioteca ou livraria mais próxima, solicite seu livro. E quando puder (não desaconselho) solicite também seu passaporte. Você viajará com conhecimento de causa.

Aproveite as palavras veríssimas do mestre Érico: "A vida não merece bocejos".
E hasta la vista!

Para acompanhar o trabalho de Carlos Vazconcelos, acesse o blogue A Inquietude da Busca: http://ainquietudedabusca.blogspot.com

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