Anton Pavlovich Tchekhov
Existem
aqueles escritores que são mais lidos – citados, e até copiados – por outros
escritores. São os chamados “escritores de escritores”. O anglo-americano Henry
James é um deles, com seu estilo sinuoso e pleno de sutilezas agrada muito a
seus pares; o canadense-norte americano Saul Bellow também é bastante
prestigiado por colegas de ofício; na América Latina o uruguaio Juan Carlos
Onetti é mais mencionado por outros escrevinhadores que pelo público leitor em
geral. Talvez o pernambucano Osman Lins seja o caso mais acabado de “escritor
para escritores” entre nós: admirado, propalado, mas pouquíssimo lido.
Nosso
Moreira Campos volta e meia citava o russo Tchekhov, seja em informais
conversas com amigos ou em palestras sobre literatura; me recordo de umas
quatro vezes em que o ouvi citar de cor frases do famoso contista: “Se a
espingarda não vai atirar, retire-a da sala” era uma das sentenças mais
lembrada; repetia entre risos a que afirmava: “se um personagem tosse no
primeiro parágrafo, fatalmente morrerá tuberculoso ao final do conto”. Também
outro “monstro sagrado” das nossas letras, o paranaense Dalton Trevisan – ele
mesmo bastante apreciado por outros contistas mundo afora – paga sempre tributo
ao criador do exaustivamente mencionado A
dama do cachorrinho; num texto em que enumera as verdadeiras “delícias da
vida”, o “Vampiro de Curitiba” confessa babar por “um que outro conto de
Tchekhov”.
Mas Tchekhov
foi um caso singular entre os “escritores de escritores”, começou sua carreira
literária escrevendo bem-humorados continhos em jornais para ajudar no sustento
da família, que era muito pobre. Ainda cursando medicina, criou fama com suas
engraçadas historinhas, revelando acima de tudo o lado ridículo da gente mais
simples. Só tempos depois, já bem de vida, foi que passou a escrever, digamos –
lembrando que mesmo seus primeiros textos eram de qualidades insuspeitas, como
atestam as muitas coletâneas que ainda hoje os reproduzem em todas as línguas
–, seus “contos pesados”, que revolucionaram a narrativa curta e o tornaram um
dos mais citados autores do século XX.
Diferentemente
dos contos, suas peças teatrais não agradaram de início, até seu mestre e amigo
Tolstói lhe dizia que as detestava: já hoje, Jardim das cerejeiras, A
gaivota, Tio Vânia e As três irmãs se tornaram “cult” e são
encenadas no mundo inteiro com enorme prestígio. Deixou, como todo verdadeiro
mestre, uma legião de seguidores: desde os simples diluidores aos recriadores
mais poderosos: entre os mais famosos estão a neozelandesa Katherine Mansfield,
o russo Ivan Bunin e o brasileiro Dalton Trevisan. E mesmo já se passando mais
100 anos de sua morte é comum lermos resenhas sobre novos escritores começarem
com diretas comparações a ele, frequentemente alguém é tido – com razões ou
forçadamente – como seu discípulo: inclusive a recém-ganhadora do Prêmio Nobel
de Literatura, a discreta canadense Alice Munro, não tem seu nome citado sem
que ao lado não esteja a sombra poderosa de Anton Pavlovich Tchekhov.
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