— Vai ficar bom, seu Aldair. Vai ficar bom...
— Vou... vou... — ruminava em monossílabos envelhecidos pelo cansaço.
A enfermaria lhe era um espaço familiar. Conhecia-lhe cada leito, antigos pacientes, enfermeiros. Todos o tratavam como a um patriarca, sábio em suas poucas palavras.
— Vou... vou...
— Se Deus quiser! — emendava a enfermeira, em ritual quase hipnótico que atraía todos a ecoarem em ladainha:
— Se Deus quiser!
Ele permanecia imóvel, olhos no teto. Percebia-se, no entanto, que seu olhar ultrapassava o velho gesso encardido de tempo e de dor, na tentativa de atingir algum ponto-além, uma libertação indefinida.
Adoecera da vida, da fadiga de ser, da monotonia da incompreensão. Incompreendera-se da vida.
— Vou... vou...
E já voara, antes mesmo do coro repetir o tédio da insistência.
(Fortaleza, Hospital N. Sra. da Conceição,
25 de janeiro de 2000, 6:45 a.m.
Enfermaria 1
Meu pai, Chico Menezes, voaria no dia seguinte).
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