Um dos recantos que
mais me encantavam quando cheguei à nossa loirinha destrambelhada pelo sol, lá
pelo começo dos anos 1980, era a Barra do Ceará, principalmente o lado de lá da
Barra: uma novidade pra mim, que vim de uma cidadezinha à beira da nascente do rio
Acaraú, quase sempre seco. Aventura que se tornava mais emocionante porque
temperada pelo medo de quem não sabia nadar. Agarrava-me com unhas e dedos o
beiço do barcote que nos transportava por uma ninharia, então eu fechava os
olhos e rezava em silêncio, perdendo parte daquela beleza de paisagem.
Dia desses, vendo uma postagem nas redes
sociais do meu amigo jornalista Eliézer Rodrigues (que divide comigo tanto o
amor à Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção quanto ao pequeno Fortim, à beira
do rio Jaguaribe) vi uma linda foto em preto-e-branco dessas embarcações que
atravessavam para o lado de lá da Barra do Ceará, acompanhada do texto: “O
OUTRO LADO DA BARRA DO CEARÁ – Antes da construção da ponte sobre o rio Ceará
que liga Fortaleza a Caucaia, em 1997, uma das diversões dos fortalezenses,
principalmente aos domingos, era ‘tomar banho no outro lado da Barra do Ceará’.
E a travessia era realizada por pequenos barcos artesanais, denominados de ‘bateira’,
trabalhados em madeira de louro ou de cedro. Cada embarcação transportava 20
pessoas, e a passagem custava 1 cruzeiro, moeda da época, por cada passageiro.
Ao todo, trabalhavam na domingueira cerca de 50 embarcações”. (As informações
são detalhes contidos na primeira reportagem realizada pelo jovem Eliézer no jornal
O POVO, no seu primeiro plantão de fim de semana, num domingo de janeiro de
1975).
O episódio me lembrou duma história que o
saudoso amigo Nilto Maciel sempre me contava (e eu fazia questão de sempre
fingir que não a tinha ouvido dele já uma dezena de vezes, esperando sempre um
detalhe que ele acrescentava ou modificava nas inúmeras versões). Dizia de um
casal de amigos recém-casados, que viera em férias com ele de Brasília, e depois
de visitarem, num sábado de manhã, os pontos turísticos mais badalados da
capital resolveram deixar as esposas voltarem de carro para o hotel e seguiu,
com o empolgado turista brasiliense, para lhe mostrar um recanto belíssimo, de
um pôr de sol inigualável; pegaram um barquinho nas areias do rio Ceará, deslizaram
nas ondas calmas até o outro lado, deram uma volta pelos arredores e depois se
sentaram numa barraquinha de palha, onde uma sujeito lhes serviu cervejas
geladas em imensos isopores com gelo.
Conversa vai, lembranças vêm,
assustaram-se com o adiantado da hora, o sol ainda nem acabara de mergulhar nas
águas, pediram a conta apressados e procuraram os barquinhos. Nada, nenhum
deles, um senhor lhes informou que aos sábados o último voltava às 16 horas, o
desespero bateu, a inevitável escuridão os acalmou, com a ajuda do barraqueiro,
que os deixou dormir nuns bancos e caixas de conservar peixes; esperaram o
primeiro transporte do domingo para atravessar o manso rio, de onde pegaram táxi
de volta ao hotel.
Resumindo a involuntária aventura: os
familiares estavam em polvorosa, alguns tinham ido às rádios divulgar o
desaparecimento, outros procuraram nos hospitais, até um mais pessimista fez
visita ao IML. A vergonha das explicações, a confusão dos disse-me-disses
resultaram numas férias interrompidas e quase um casamento desfeito.
Valeu, Pedro Salgueiro. Obrigado pela citação da minha postagem.
ResponderExcluirAdorei!
ResponderExcluirPerfeito. A Barra do Ceará esconde muitas histórias... sinto orgulho de fazer parte de algumas delas!
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