quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Votos de um feliz Ano Novo, por Raymundo Netto para seus amigos, colegas e familiares


Não apenas o ano que passou, mas todo os demais percorridos, mesmo aqueles ainda em preto e branco, nem teriam sentido não fosse a necessária existência e/ou presença dos familiares e verdadeiros amigos.
O passar dos dias aligeirados pelos tempos a galope, muitas vezes não nos permite contemplar a beleza das folhas das árvores a cruzar hoje as nossas vistas como nódoa verde e sem vida, assim como silencia o canto dos pássaros e mesmo o das estrelas, que apenas nas nossas memórias mais distantes emitem com seu piscar celestial um cricrido de paz.
Noutros tempos, éramos nós a sentir o brilho do sol num afago de nuvens, a noite esparramando luares, as verdes palmas reverenciando aos ventos assoprados de marés, as areias finas e brancas a calçar-nos os passos alheios à maldade, a incompreensão e às dúvidas. Éramos nós, a sentarmos à mesa e a nos permitir conversas delongadas com sabor de café adocicado de histórias e afetos. Éramos nós, construindo a experiência única de sermos apenas nós.
Em 2016, que deixemos os “éramos” e “sejamos”, que corramos para a vida, para o que ela nos dá de graça – o que fica para sempre, geralmente assim nos chega –, e não nos esqueçamos do outro, esse universo paralelo de sempre desconhecido; sempre presente; sempre necessário. Lembremos: “É impossível ser feliz sozinho”.
Desejo assim, a todos aqueles que compartilham essa minha tela de vida, um ano realmente novo, em desafios, e mesmo quando a derrota ou a tristeza persegui-lo(a), que possa erguer-se novamente, como se adentrasse outro ano e a vida se renovasse na sua própria e próxima respiração.
Com o abraço e a gratidão de Raymundo Netto


sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

"Papai Noel com Alzheimer", de Raymundo Netto para O POVO


Papai Noel dá descarga, sai da privada e não lava as mãos. É verdade. Nunca antes havia sabido do bom velhinho ter tais necessidades, mas quem anda em shopping vê de um tudo.
Época culturalmente festiva, o Natal alimenta o comércio, muitas vezes o salvando de prejuízos de um ano inteiro de investimentos com design e campanhas de vendas incompatíveis com a saúde financeira do consumidor ainda programado a “ter que comprar” presentes. Há algum tempo se dizia que bom mesmo era o presente original, preparado artesanalmente, com cheirinho de grude ou cola branca, polvilhado de glitter colorido num pequeno riscado de lápis de cores e canetinha hidrocor. Ora, ninguém tem mais tempo nem ideias para isso. Até os cartões de Natal já vêm com texto prontinho adequado ao freguês. Sentimento, sentimeeento de verdade é duvidoso, embora as famílias ainda se encontrem, cada vez mais numerosas, mais sonolentas, mais glutonas, menos interessantes.
Nas ruas é possível cruzar com pessoas que nos desejam um Feliz Natal, ainda que não nos conheçam, e nós respondemos, ou não, com alguma mesura ou com os mesmos votos, pensando qual o sentido disso tudo ou não pensando em nada completamente, a não ser na nossa rotineira pressa de fazer qualquer coisa da vida, menos viver, pois que nos seria insuportável.
Pessoas cheias de Jesus em seus corações – ou pelo menos cheias na língua – continuam destruindo ou planejando destruir os outros, que não reconhecem como irmãos, mas frutos de uma divina pulada de cerca celestial, tais como os praticantes das religiões africanas, os negros (pobres), os doentes (pobres), os moradores de comunidades (pobres) – para muitos, todos traficantes, drogados e prostitutas – ou em situação de rua (pobres), ciganos, entre outros, além daqueles que não concordam com as suas opiniões ou gostos, seja eles qual forem.
Nunca entendi por que para eu me sentir bem deveria olhar para o meu redor e ver que muitos estão em condição pior do que eu. Essa psicologia de contentar-me com a miséria alheia sempre me foi intragável, assim como sempre afirmei que só os egoístas serão felizes, pois não me sinto no direito de empurrar nos olhos esse colírio desagradável de conforto, enquanto assisto à injustiça, corrupção, descaso, exploração, intolerância, desigualdade e, por que não dizer, de maldade bem vestida (nua jamais) e crua (em forma de sashimi), temperada com presunção e extremo individualismo.
Nas igrejas, as pessoas clamam ridiculamente pela SUA salvação (o mundo que se vire), melhores dias para os seus, a megasena da virada para torrar em viagens ao redor do mundo, em banheiras com torneiras douradas, privadas automáticas, no carro do ano de nunca arrancar os plásticos dos estofados de couro, em silicones, acessórios de luxo e de grife. É uma pobreza espiritual de dar dó e pau em doido, nesse imenso mundo de vendilhões em busca de bons negócios espirituais.
Eu só acreditaria no Natal se Jesus viesse com chicotes arrastando as ovelhas e os bois, despertando a humanidade de sua sonolência salteadora – só existe o rico porque existe o pobre – para a prática da gentileza e da gratuidade, do amor incondicional, do reconhecimento do outro numa enxurrada de empatia e de amor, coisa que não se pratica muito comumente, nem é valorizado por aqui, mesmo por aqueles que os pregam pateticamente em praças, calçadas e ônibus por meio de berrantes aparelhos sonoros de baixa qualidade, de CDs de padres e pastores, esbanjando a sua falta de noção. Aliás, já era tempo do Senac oferecer um curso de “Noção”. O povo precisa e muito.


segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

"Da Noite pro Dia", com Alan Mendonça e convidados, HOJE

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Espetáculo
Da noite pro dia
de Alan Mendonça
- Celebração de 15 anos de escrevências -
Data e Horário: 14 de dezembro, às 20h
Local: SESC Iracema, Fortaleza/CE
Lançamentos
CDs “Mesmo que seja tarde” e “Do tempo faltando um pedaço”
E do livro “De peixes e aquários (poemas signos)”
Sobre o espetáculo: Celebrando 15 anos de escrevências, o escritor e compositor Alan Mendonça lança os CDs “Mesmo que seja tarde” e “Do tempo faltando um pedaço”, e o livro “De peixes e aquários (poemas signos)”. Os CDs são compilações de músicas suas gravadas por grandes nomes da música cearense e de além fronteiras. No livro, há um ciclo de poemas sobre os signos do zodíaco que ganharam uma versão sinfônica pelo talento de Liduíno Pitombeira. As ilustrações são assinadas por Yuri Yamamoto e o prefácio por Fabiano dos Santos Piúba, Dércio Braúna e Liduíno Pitombeira. Haverá, no hall de entrada do teatro, uma exposição contando sobre momentos marcantes dos 15 anos de escrevências de Alan Mendonça. Participarão, em sons e palavras, artistas como Aparecida Silvino, Mona Gadelha, Marta Aurélia, Ayrton Pessoa, Makito Vieira, Thiago Arrais, Jânio Florêncio, Carlos Hardy, Marcos Paulo Leão, Daniel Sombra, Rodrigo Castro, Felipe Rubens, Joyce Custódio, Lenine Rodrigues, Felipe Breier, Fernando Rosa, Simone Sousa, Andréa Piol, Rafael Torres, Cinco em Ponto, Pingo de Fortaleza, Auri D’yruá, Linda Pedra, Ana Rios, Fernando Leão, Lauriene Marreiro, Henrique Beltrão, Francélio Figueredo, Raymundo Netto, Ivânia Maia, entre outros e outras...

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Para quem acha que conhecia a casa onde nasceu José de Alencar...

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Será aberta domingo (13), às 10h, a exposição Casa de José de Alencar: há 50 anos patrimônio brasileiro, que celebra o cinquentenário do tombamento pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) da casa onde nasceu, em 1829, e viveu até os nove anos de idade o romancista cearense José de Alencar.
Em 1964, o então presidente Humberto de Alencar Castelo Branco providenciou a compra do imóvel e de oito hectares ao redor da construção, transferindo para a UFC a administração e a guarda desse patrimônio histórico para ser um equipamento de extensão acadêmica e de incentivo à produção literária.
De caráter permanente, a exposição reúne cerca de 50 peças, entre imagens das décadas de 1910 a 2000 e raridades encontradas na prospecção arqueológica feita nas ruínas do engenho que foi propriedade do senador José Martiniano de Alencar, pai do escritor. Há louças, moedas e artefatos de ferro do início do século XIX.
Entre as fotos expostas estão algumas da antiga casa grande; do antigo engenho (o primeiro movido a vapor do Ceará); da inauguração oficial do equipamento cultural em 1966, com a presença do presidente Castelo Branco e do reitor Antônio Martins Filho; e dos trabalhos da prospecção arqueológica realizada em 2000, por equipe comandada pelo prof. Marcos Albuquerque, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
A exposição, que integra a programação dos 60 anos da UFC, tem curadoria e organização da própria Casa de José de Alencar, com apoio do Memorial da UFC.
EQUIPAMENTO DA UFC – Em 1964, a casa grande do sítio Alagadiço Novo já havia sido demolida e as únicas edificações que restaram foram o pequeno imóvel tombado e as ruínas do engenho do senador José Martiniano.
Atualmente, o sítio Alagadiço Novo é um equipamento cultural pertencente à UFC, que possui, além do patrimônio histórico tombado pelo IPHAN, a Pinacoteca Floriano Teixeira; o museu reunindo as coleções Arthur Ramos (cultura afro-brasileira) e Luiza Ramos (renda de bilros), além de peças de couro, pano, barro, cerâmicas e instrumentos líticos (de pedra); a Biblioteca Braga Montenegro; a Sala Iracema, com 33 desenhos a bico de pena em nanquim feitos por Descartes Gadelha; restaurante; centro de treinamento com salas e auditório, e considerável área verde, onde são realizadas diversas atividades culturais, como o Pic-Nic Literário do Clube da Sivozinha.
A Casa de José de Alencar está localizada na Av. Washington Soares, 6055, em Messejana. Visitas ao acervo do equipamento podem ser feitas de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, e aos sábados e domingos, das 8h às 12h. O Acesso é gratuito. Outras informações são encontradas no site da CJA.


Fonte: Frederico Pontes, diretor da Casa de José de Alencar – fones: 85 3276 2379 e 3229 1898

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quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

I Festa Literária do Humor Cearense, de 10 a 20 de dezembro, no Museu do Humor Cearense


De 10 a 20 de dezembro de 2015, o Museu do Humor Cearense apresenta a I Festa Literária do Humor Cearense.
Como tema, a homenagem aos 140 anos de Quintino Cunha e os 100 anos do bode Yoyô, além da comemoração do Dia do Palhaço.
A programação é diversa, incluindo lançamento de livros e cordéis, palestras, exibição de filmes e vídeos, espetáculos e brincadeiras infantis, cantorias, recitais de poemas, shows de humor, entre outros. Programação para todas as idades e, de quebra, você poderá conhecer o Teatro Chico Anysio e o maior acervo (incluindo o literário, na biblioteca Professor Raimundo, e peças/curiosidades do próprio Chico) deste que, sem dúvida, é o maior humorista brasileiro de todos os tempos.
Entre as obras a serem lançadas, Crônicas Absurdas de Segunda, de Raymundo Netto, O Genial Quintino Cunha, de Stélio Torquato Lima, Leandro Gomes de Barros: o mestre da literatura de cordel, de Arievaldo Viana, álbum Fortaleza a Pé, de Gerson Linhares, O Teatro de Jorge Ritchie, de Jorge Ritchie, Causos, de Totonho Laprovitera, Paula Ney: o primeiro humorista cearense, de Jader Soares, O Direito de Rir e Vir, de Giovani de Oliveira.
E ainda há espaço para ações não programadas, ou seja, VOCÊ pode se candidatar a fazer parte dessa grande Festa Literária do Humor Cearense. Entre em contato com Jader Soares, curador dessa Festa: (85) 3252.3741/99991.0460.
O Museu se localiza na Av. da Universidade, 2175, Benfica.

Não perca. A programação completa pode ser conferida em museudohumorcearense.com.br



sábado, 28 de novembro de 2015

"Luar de Luana", de Raymundo Netto, para O POVO


Luana Rachel. A Lua. A de “brinco ouro”, como se distinguia da irmã de abrigo natal, a “de pérola”, por encontramento recente, olhando-nos ainda de estranhos: pais e filhas.
Das duas, a mais simpática. A menor, cujo maior sorriso. Ao traçá-lo banguela, apertava os olhos, mas noutro caso, trazia-os descortinados para o mundo.
Cedo, cedo, convivemos muito próximos, ela por sobre mim, cabeça encoberta em meu pescoço. Era à noite; era ao dia. Quantas vimos o Sol nascer ao balançar lento à cadeira de palhinha. De então, pomos à estreita amizade enamorados a uma ternura gratuita.
Já de pequena, a Lua gostava o desenho — mania de criança expressar-se a toda forma — sem pressa, com detalhes, mundos fantásticos, sempre estrelados, com seres de corpos finíssimos a sustentar uns cabeções, em cabriolas de cores impossíveis — mau hábito de adulto estragar-lhes um céu de ser azul e grama há de sempre verde, num realismo monótono decepcionante.
Já criadas pernas, inda sem cabelos — durante muito tempo só fiapinhos laçados por preciosismo de coração materno —, Lua e Lia me davam as mãos a passeios vesperais. Alumbrava-me a descoberta do “dar de mãos” dos filhos. Engraçado sentir num gesto tão trivial, a entrega absoluta incondicional, algo de nos dar de um todo em confiança e amor, podendo de ali ser levados a qualquer lugar e a tempo, pois que quando um filho nos dá a mão ele se dá por completude, no que confia de vero, na mais autêntica sinceridade.
"Criança não mente", isso, sim, uma mentira. Criança emprega da mentira, e é da dificuldade de pais fazer com que não precisem usar-se dela a costume. Dela o mundo sobeja e se farta.
À criança não se subestima, não se diminui, não se cobra de adulto, não se ensina a ser super, muito menos a faz espelho de corrigir passados e malfeitos. À criança todas as liberdades de ver o mundo, de recriá-lo, de acolhê-lo em significados particulares de nova aurora, mas a saber-se nunca só, pois na solidão o ser padece.
A Lua sempre de vez gostava surpreender com tiradas de espírito sobre assuntos comuns. Curtia-me percebê-la tão menina a maquinar o pensamento em busca de chamar-nos atenção e, exitosa, gargalhar de criança e repetir-se noutro dia, e noutro, para que não mais esquecêssemos seu feito extraordinário.
Escritor, há quem credite, é gente que trabalha ao tempo-vai, mas que ninguém entende. É na beira da praia, enxerido à conversa de ambulante, no ônibus pela cena engraçada de um esquisito trocando falas, na leitura derreada de livro cheio de ideias no sofá, assistindo à película de cinema, enfim. Para minhas crianças, mas como todos, só veem que o pai-escritor está em casa, ali, sentado o tempo inteiro — "será que papai é paraplégico?" — e, em meio àquela cena sofrida escrita a suor, momento particularmente tenso e intenso, me chega Luana, desencucada da vida, e rebola à frente, um desenho a lápis da boca do forno:
— Pai, olha... sabe o que é isso?
Olhando o rascunho de contorno grafite, de ligeiro, para não perder a brasa da forja: "Filha, é um cavalo. Que bonito, meu amor..."
— Ô, Pai... olha direito, não é um cavalo...
Lanço novo olhar, ainda de pressa ao início de nervoso: "Filha, me desculpe, mas isso é um cavalo, sim!"
— Papai — ressentindo-se a tão adulta ignorância. —, é uma zebra...
Paro, então. Respiro fundo de sem jeito. Coloco o desenho no colo. Miro aquele projetinho de artista sério em olhos amendoados e brilhantes, e ainda assim, desconfiando-me, sentencio:
— Luazinha, isso é um cavalo... As zebras têm listras!
— Mas pai, ela tem listras... só que são brancas!


terça-feira, 24 de novembro de 2015

INSCRIÇÕES ABERTAS: Fórum de Reconstrução Social I Encontro Diálogos pela Paz (26, 27 e 28 de novembro)


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Fórum de Reconstrução Social
I Encontro Diálogos pela Paz
Segurança e cidadania

Quando: 26, 27 e 28 de novembro de 2015
Onde: Escola Superior da magistratura do Estado do Ceará

INSCRIÇÕES GRATUITAS

Convidados
Contardo Calligaris, Alba Zaluar, Silvia Ramos, Camila Dias,
Débora Diniz e Christian Dunker

Sobre o I Encontro Diálogos pela Paz

Considerando a relevância e a urgência de um debate mais amplo com a sociedade, o Fórum de Reconstrução Social realiza o I Seminário Diálogos pela Paz. Com o entendimento de que questões como segurança, violência, sistema penitenciário são problemas sociais, com especificidades históricas e antropológicas, formamos debates com diferentes segmentos políticos e culturais do campo social para viabilizarmos frentes variadas e contínuas de discussões.
Estudantes, pesquisadores, gestores públicos, profissionais do direito, da imprensa, intelectuais, cidadãos, enfim, são convidados a comparecer, acompanhar e encaminhar criticamente as perspectivas dos nossos palestrantes e debatedores.

Assim, pretendemos com nosso primeiro encontro inaugurarmos uma obra aberta, feita de intervenções e ideias que renovem a abordagem e a prática desses temas.

AlmanaCULTURA In Dica: "O Deserto dos Tártaros", de Dino Buzzati


(*) Dica de leitura do quadro "Vamos Ler" da REVISTA O POVO na rádio O POVO/CBN, com Maísa Vasconcelos e participação quinzenal de Raymundo Netto (terças-feiras, das 15h30 às 16h) – 1º de dezembro de 2015

O Deserto dos Tártaros me chegou pela curiosidade e como surpresa. Não conhecia Dino Buzzati, o seu autor. Fui presenteado – devo-lhe ao Pedro Salgueiro, crítico-mor dos sebos da região – com A Queda da Baliverna, cujo projeto gráfico e título, a princípio, não me atraíram. Após a primeira leitura dos contos de tal Queda... , senti uma coceira de conhecer o romance sobejamente anunciado como a sua obra-prima: o alegórico O Deserto dos Tártaros.
Li e, sobre a obra, escrevi, em 2013, em crônica publicada em O POVO:
“Difícil leitura, mas não por culpa do autor. Aparentemente um livro monótono, tenso, marcado por uma sequência de nadas e vazios desconcertantes. Giovanni Drogo, um jovem tenente, recebe posto no forte Bastiani, na planície fronteiriça de um cantinho qualquer esquecido do ‘mondo’. Como todo bom soldado, queria ser herói, fazer algo de relevo, ter uma carreira brilhante, viver grandes amores, ganhar o mundo. Só que não. Ao percorrer a enfadonha trilha militar do forte, a cada momento tinha a certeza de que só podia ser um engano. Nada mais morto, mais desinteressante, mais inútil que aquela vida besta, a ponto de escrever cartas mentirosas na tentativa de se enganar, antes do outro. Tentou sair do forte, procurar outra ocupação, pedia transferência aos seus superiores, e tudo isso lhe parecia sempre bem possível, pelo menos é o que, pacientemente, lhe diziam, mas nunca, nunca que saía de lá. Alguns o alertavam do que o forte poderia fazer com ele se não saísse logo e, mesmo assim, deixou-se vestir o manto de esquecimento.
O tempo passou. Drogo sendo promovido, anestesiando-se ao som regular dos passos das sentinelas, virando todo apatia. Seus nervos pouco o beliscavam na procura das glórias roubadas, do sonho a congelar por trás das muralhas nuas em noites de lua, à espera dos tártaros, povo bárbaro que, como diziam as lendas, um dia chegariam e tentariam destruir tudo. Neste dia, ah, neste dia, então, sim, toda a sua existência teria um significado e a sua vida valeria a pena. Bastava-lhe este dia para coroar de louros a longa espera. Mas os tártaros, se é que um dia existiram, nunca chegavam. Via sinais: pequenos pontos luminosos em meio a sombras noturnas, um fluxo misterioso na linha do horizonte, murmúrios noturnos com os ventos, e, de repente, mais nada. Apenas o nada de todos os dias de uma vida inteira!
‘Numa fenda dos penhascos vizinhos, já encobertos pela escuridão, atrás de uma caótica escadaria de cristas, a uma distância incalculável, imerso ainda no sol vermelho do poente, como que saindo de um encantamento, Giovanni Drogo avistou um morro pelado e no topo dele um traçado regular e geométrico, de uma singular cor amarelada: o perfil do forte. Oh, tão longe ainda. Quem sabe quantas horas de estrada, e seu cavalo já estava esfalfado. Drogo o fitava fascinado, perguntava-se o que podia haver de desejável naquele casarão solitário, quase inacessível, tão separado do mundo. Que segredo ocultava?’
O livro, meus amigos, é de uma inquietação poética. Uma grande interrogação mancha de filosofia as páginas vagarosas que parecem nos capturar no mesmo exílio de Drogo, sendo capaz de nos fazer sentir o hálito úmido das paredes de pedra, cobertas de limbo, do forte Bastiani, e de ouvir o silêncio frio das noites angustiantes que custam a passar. Fazemos escolhas, mesmo quando não conscientes, renunciamos da vida, nos tornamos estrangeiros de nós mesmos no passar dos anos de O deserto dos tártaros. Assistimos a nossa história ser consumida numa fogueira silenciosa, dia após dia, em troca de nada, a não ser da paciente espera de algo que, chega a parecer, nunca acontecerá! Descobrimos, entre uma xícara ou outra de café ao pé da janela triste caiada em luar, que o maior deserto é aquele que colhemos em nosso peito; aquele que, lentamente, nos devora o corpo e a alma, e, quando menos esperamos, o mastigamos e o encontramos entre os dentes em nome da nossa cara e amante solidão.”


(*) O livro pode ser encontrado, além dos sebos, em edições novíssimas e bem tratadas, com mais luxo, capa dura, na Livraria Cultura, ou em edição de bolso, na Saraiva.


segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Rádio AlmanaCULTURA: "Cavalo-Ferro", com Ednardo, Rodger Rogério e Téti


Para ouvir a música

Montado num cavalo ferro
Vivi campos verdes, me enterro
terras trópico-americanas
Trópico-americanas, trópico-americanas
E no meio de tudo, num lugar ainda mudo
Concreto ferro, surdo e cego
Por dentro desse velho, desse velho
Desse velho mundo

Pulsando num segundo letal
No planalto central
Onde se divide, se divide, se divide
O bem e o mal
Vou achar o meu caminho de volta
Pode ser certo, pode ser direto
Caminho certo sem perigo, sem perigo
Sem perigo, sem perigo fatal


Raimundo Fagner e Ricardo Bezerra


sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Estudo para tombamento estadual do Náutico Atlético Cearense

A reunião do Conselho Estadual de Preservação do Patrimônio Cultural (COEPA) realizada na manhã desta quarta-feira, 18 de novembro, no Pavilhão dos Conselhos (rua 24 de Maio, em um dos antigos galpões da RFFSA, ao lado da Estação João Felipe, no centro de Fortaleza) deliberou, entre outras questões, sobre a abertura de estudo para possível tombamento do Náutico Atlético Cearense, em nível estadual. A deliberação do Conselho pela abertura do estudo implica, conforme a legislação, tombamento provisório do bem, que não poderá sofrer modificações até que seja concluído o processo de estudo, ao fim do qual o próprio Coepa deliberará por aprovar ou não o tombamento definitivo.
O Coepa debateu o tema após receber formalmente, na reunião desta quarta-feira, recomendação do Ministério Público Estadual, bem como a solicitação do "Movimento Náutico Urgente" para abertura de estudo de tombamento do Náutico em âmbito estadual. O conselho deliberou pela abertura de estudo de tombamento por 13 votos a favor e uma abstenção.
De acordo com o presidente do Coepa e também secretário da Cultura do Estado do Ceará, Guilherme Sampaio, conforme a legislação pertinente, o processo de tombamento do Náutico Atlético Cearense irá para a análise da Coordenadoria de Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (Cophac), da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará (Secult), para que faça um relatório preliminar sobre o tema e o submeta à apreciação do Coepa.
“Nos termos do parágrafo 10º do artigo III, da Lei de Proteção ao Patrimônio, o Náutico Atlético Cearense se encontra provisoriamente tombado, até que o Coepa delibere sobre a abertura ou não de estudo de tombamento definitivo”, destacou o presidente do Coepa.
Fonte: Secult/CE


Rádio AlmanaCULTURA: "Na Emenda", com Trio Nordestino


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Para ouvir a música, acesse:

Na emenda
Amarre a corda direito
Na emenda
Pra corda não rebentar
Na emenda
Mas dê um nó de respeito
Quero o povo satisfeito
Bincando de emendar
Atenção, Pessoal
Esse ano vamos brincar de roda
Todo mundo emendando
E vamos emendar

Na emenda
Tem moça que quebra jura
Na emenda
Depois não pode emendar
Na emenda
Mas cantador de viola
Arruma a rima na hora
E não deixa rima quebrar

Na emenda
Eu vou fazer um engenho
Na emenda
De corda de Caruá
Na emenda
É um trabalho bonito
Mulher torcendo o cambito
Fazendo a corda acochar

Na emenda
Os velhos tavam brincando
Na emenda
Depois deram pra brigar
Na emenda
A tristeza criou dó
Vovô enganou vovó

Na hora de emendar


quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Rádio AlmanaCULTURA: "Vento Aracati", de Eugênio Leandro e Oswald Barroso, com Eugênio Leandro.


Para ouvir a música, acesse o link

Nesse trecho de terreno
A natureza é tirana
A tristeza é mais antiga
Que a onça suçuarana.
O ar pesa em riba das ramas
Feito fardo de algodão.
A natureza reclama
Assujeitada no chão.
As umburana não geme
Nem resmunga a juriti
Nenhuma folha se treme
Tudo é morto por aqui.

Tudo dorme num cansaço
Pulo chão de pedra dura.
Só a fulo do mormaço
Se espalha nessa lonjura.
Mas eu não me desespero
Nem me arretiro daqui.
Após alta noite espero
Vir o vento Aracati.

Roda roda, redemuin.
Venta vento a ventania
Arribando as capoeiras
Antes da barra do dia.
E um berra que não se queixa
Um pula que não tremia
Sopra o vento aracati
Antes da barra do dia.

Eugênio Leandro/Oswald Barroso


terça-feira, 17 de novembro de 2015

Um domingo diferente, musical e plural na Casa de José de Alencar. Imperdível (22.11)

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Venha passar um domingo (22 de novembro) diferente, musical e Plural na Casa de José de Alencar e depois almoçar com amigos e familiares no restaurante da Casa, com comidas regionais, à sombra de árvores centenárias, aos ventos que trazem os ecos das ruínas do primeiro engenho a vapor do Ceará e, lá no fundo, ouvir a jandaia ainda chorar por sua Iracema. Saiba mais:


Lançamento do CD PLURAL: Henrique Beltrão e Amigos
e inauguração da Casa da Música do Ceará (UFC)
Data e Horário: 22 de novembro (DOMINGO), a partir das 10h
Local: auditório da Casa de José de Alencar
(Av. Washington Soares, 6055)
Participações especiais:
Aparecida Silvino, Jord Guedes, Pingo de Fortaleza, Calé Alencar, Isaac Cândido, Edmar Gonçalves, Rogério Franco, Daniel Sombra e Vitor Duarte, Marcelo Kaczan, Rodrigo BZ, Rafael Lima, Jean-Robert-Poulin e Henrique Beltrão.
ENTRADA FRANCA
Contatos: beltraohenrique@gmail.com – Fone: (85) 99101.1820
Apoio
“Todos os Sentidos” e “Sem Fronteiras: Plural pela Paz”, Rádio Universitária FM 107,9


Sobre o CD Plural: Henrique Beltrão e Amigos

Plural é o título que bem traduz o espírito do CD que Henrique Beltrão traz a público. O trabalho abrange 12 faixas com parcerias feitas a partir de 2005 com diversos artistas e gravadas de 2008 a 2015 em discos de vários intérpretes. São composições feitas com poemas inéditos ou publicados em Vermelho (2006) e Simples (2009), livros de poemas e canções de Henrique, assim como em No Ar, um Poeta, narrativa autobiográfica poética, fruto de sua tese de doutorado. A pluralidade pulsa nesse CD que abraça a música em suas diversas matizes.
Dentre os integrantes no CD, Jord Guedes, Isaac Cândido, Rogério Franco, Paulo Branco, Marcos Paulo Leão, Alan Mendonça, Dalwton Moura, Aparecida Silvino, Joana Angélica, Lorena Nunes, Simone Guimarães (com participação especial de Fagner), Calé Alencar, Edmar Gonçalves, Pingo de Fortaleza, Marcelo Kaczan, o cantor do Québec (Canadá) Jean-Robert-Poulin e o próprio Henrique Beltrão.
Henrique Beltrão é poeta, compositor, professor da UFC e radialista (responsável pelos programas “Todos os Sentidos” e o “Sem Fronteiras: Plural pela Paz”, projetos de extensão da Universidade Federal do Ceará - UFC e programas da Rádio Universitária FM 107,9, os quais juntamente com a própria emissora apoiam o CD Plural.

O lançamento do CD Plural acontece com um show de Henrique Beltrão e seus amigos comemorando o aniversário do artista na manhã do Dia da Música e de Santa Cecília, padroeira dos músicos, na inauguração da Casa da Música do Ceará, projeto de extensão da UFC, coordenado pelo músico, radialista e professor Pedro Rogério, que se propõe a ser um lugar para lançamento de discos e livros, ensaios, exposições e encontros. Antes do show, às 9h30, também na programação de inauguração, abertura das exposições Ecoarte Musical, de Marcos Melo, e Fortaleza dos Maracatus & Maracatu Solar, da Associação Cultural Solidariedade e Arte - Solar.