O Clube do Bode fecha o livro de atas de número 451, com relatórios assentados desde o franzino caderninho inaugural, lá se vão oito anos e lá vai pedrada. A confraria, sem nome, destino ou pretensão, estava em fase embrionária, apenas reuniões de poetas, músicos, jornalistas, amigos e leitores da Livro Técnico que iam à sede na rua do Dom Joaquim nas tardes de sexta para jogar conversa fora. Os pioneiros: Barros Pinho, Almir de Castro, Mariano Freitas, Giordane Carvalho, Juarez Leitão, Tarcila Machado, Hélio Catunda e outros poucos. O anfitrião, Sérgio Braga, o livreiro, cuidou de trazer feijão verde de casa e abriu, generosamente, a adega particular. E o caldo engrossou aos sábados com outras personas que, em torno do então senador Lúcio Alcântara, vinham a fim de discutir sobre política.
Pintou, então, a ideia de batizar a estranha confraria, informal e sem ideário, um nome besta que fosse, a título de identificação ou mesmo referência de informação. O nome surgiu da cabeça do poeta do Parnaíba, criado nas securas dos caratiús: Clube do Bode, e assim ficou. Surgiu como se batizássemos um time de botão ou um rebanho de nuvens feito carneirinhos de sonhos. Hoje procuram-se justificativas de roupagem social, associando bode à resistência; cá pra nós era mais uma conotação fuleiragem para uma patota heterogênea que apenas pretendia descontrair, fofocar, conversar miolo de pote. Mas que assim seja, fica bem esta casaca intelectualizada e ideológica, afinal o Clube do Bode nasceu na calçada de uma livraria, de uma editora.
Encontrado um nome, a coisa pesou e pensou-se logo em transferir responsabilidades. E aí coube ao Sérgio Braga um dos dois únicos cargos, o de Pai de Chiqueiro Mor, que seria, em termos sérios, o de presidente da agremiação. Com isto sugerimos um livreto para apontar as presenças e registrar alguma coisa digna de nota que porventura acontecesse naquele pedaço de calçada. Então nos autonomeamos, democraticamente, para o honroso cargo de Chiqueirador, trocando em miúdos, o secretário. Com uma justa defesa: éramos (porque novel abstêmio) a única pessoa capaz de, no dia seguinte, dar conta do que se havia passado durante a noite. E foi inaugurado o famigerado livro de atas.
Na verdade, o relicário da anti-ata, este conjunto de relatórios está mais para uma miscelânea, à moda das que as moças prendadas e suspirosas de antanho faziam lá pelos anos dourados, quarenta, cinquenta... Parece um almanaque, tem de um tudo: recorte de jornal, desenho, retrato, santinho de político, bilhete de namorado e receita de bolo. Às vezes pende para o humor negro e não deixa de dar suas alfinetadas, puxando o colarinho de quem não quer andar nos trilhos. E tem sobrado pro secretário, até ameaças cartoriais.
Tentamos democratizar a escritura de tais relatos, porém ninguém quis topar a parada. Mesmo assim já fomos substituídos nas raras visitas à Santana por Erasmo Pitombeira, João Soares Neto, Giordane Carvalho e Falcão. Ultimamente a missão vem sendo fielmente cumprida por Narcélio dos Anjos e Tatiana Ribeiro. Já vou pra minha terra bem mais tranquilo. Os bodes e cabritas estão em boas mãos.
* Audifax Rios, para O POVO