Há meses Giselda desconfiava de Artur,
o marido.
Puxava conversa, vasculhava e cheirava
suas roupas, revolvia a carteira, ligava para o trabalho dele sem motivo
aparente, mas não conseguia apurar nada. Mesmo assim, estranhava as suas
atitudes: do jeitão indiferente à gentileza excessiva: “Tem caroço nesse angu!”
Inconformada, confessa para a irmã, em
prantos, a sua dúvida. Juliana, por ainda ser solteira ou por qualquer outro
motivo, manifestou certa satisfação: “Tá vendo, maninha? Homem é tudo igual. Não
presta. Por isso não caso!”
Giselda, aflita, suplicou: “Você precisa
me ajudar. É reservada, esperta. Descubra se ele me trai!” Juliana, ainda com
um sorrisinho, aceita, mas já garante: “Todo homem trai!”
Com disponibilidade e muito empenho,
Juliana passa a segui-lo. Checava que horas chegava ao trabalho, que horas saía,
onde almoçava e com quem, perseguia discreta o seu roteiro de ônibus, conferia mensagens
de celular e páginas de redes sociais, provocava assuntos mais íntimos, quando
a irmã estava ausente à mesa, e ela mesma passou a fuçar as roupas, armário e
as coisas dele.
Não demorou muito e, sem descobrir
qualquer evidência, irritou-se. Não mais se escondia em sua perseguição diária,
interrogando-o por qualquer coisa, ligando para o escritório, e abordando-o na
rua, caso ele estivesse conversando com qualquer estranha. Um verdadeiro cão de
guarda.
Numa manhã, ao acordar, soube que ele
viajara. “Uma reunião, por conta do escritório”, explicou Giselda, com muita
naturalidade. Ela se danou: “Sua tonta, você não entendeu? Que oportunidade! O
malandro vai se aproveitar. Ah, vai!”
Naquele dia, sua indignação converteu-se
em ira e, à noite, não conseguiu pregar os olhos. Ainda pela manhã,
impacientava a irmã: “E o canalha ainda não voltou? Homens!” Chegou a ligar
para ele e cobrar o seu retorno imediato. E ele voltou. E, ao voltar, no quarto
ao lado da cunhada, a cama do casal parecia trovejar: “Cínico! Tem culpa aí, só
pode!” Assim, pela primeira vez, sentiu a dor pungente de uma solidão.
Na manhã seguinte, sendo-lhe
insuportáveis os paparicos e olhares lascivos do casal, Juliana dispensa o café
da manhã e se queda ao portão a mirar a vida a passar furtiva na calçada,
quando Artur, finalmente, sai da casa. Parou, sorriu para ela, lhe perguntou qualquer
bobagem ao ouvido. Ele é doce e dá-lhe um beijo no rosto. O coração de Juliana,
então, curvou-se à apoteótica conclusão: estava perdidamente apaixonada pelo
cunhado. Ela abriu o portão e saiu, seguindo o rumo do nariz, entorpecida de
qualquer coisa mundana. Descortinava-se um outro mundo, injustificado, porém alucinante.
Naquela noite, ela chamou a irmã ao seu
quarto escuro. Giselda estranhou o tom austero e sentou-se ao seu lado na cama.
Juliana, com olhos em lágrimas, pegou a
sua mão e diz que descobriu tudo. Ela estava certa. O marido a traía e ela
própria, Juliana, era a causadora do infortúnio da irmã. Contudo, diante da
torpeza de sentidos e assombro de Giselda, sem remorso, arrematou: “Trair com a
irmã é até uma prova de amor!”