Coronel
Oswaldo era um viúvo octogenário. O síndico perfeito. Homem de temperamento
forte e austero, se distinguia pela invulgar habilidade de comando, fruto de
anos dedicados às Forças Armadas de um Brasil. Procurassem, fosse na hora que
fosse, acolhia pacientemente as lamentações das moradoras — os maridos não lhes
davam a menor bola — que o palmeavam e o exaltavam na hora da janta: “Que homem
esse é o seu Oswaldo!”
Entretanto,
guardava ele um silêncio: a doraguda de um falo desanimado. Para o orgulhoso
militar, imperdoável. Soube, porém, num fortuito dia, e decidiu implantar uma
prótese peniana. Tudo envolto no mais absoluto sigilo, claro, e que Deus o
livrasse se alguém supusesse um dia de a sua vergonhosa fragilidade!
Com a
tecnologia a seu favor, Oswaldo não deixaria mais de bulir em seu brinquedo.
Nem não acreditava naquilo. Soubesse, teria feito antes... Passou a querer a
toda hora, a todo instante. Fosse mulher, passasse a vista, agora sabia:
apertava aquela bombinha na mais segura possibilidade.
As
domésticas, diaristas, as mocinhas da rua e mesmo uma ou outra colega de
faculdade da filha, vacilassem, o coronel as colocava em sua linha de fogo.
Mas, de
iniciada a brincadeira, ao acionar a bombinha milagrosa, tinha ele a mania de
exigir da companheira a apresentação de continência ao “glorioso estandarte”,
como assim apelidara o membro ora ascendente e vigoroso.
As
coitadas, a princípio, o faziam por graça, depois percebiam-lhe o modo estranho,
exigido cerimonialmente a cada nova intervenção. Atrevessem dispensar-lhe tal
continência, o desagrado era profundo, de esboçar uma carantonha, puxar as
parceiras ao colo e dar-lhes tapas vigorosos na bunda, que era para
discipliná-las. A ordem, então, seria no tapa!
Daí, em
pouco, a mania do coronel passou a povoar o clássico fuxico das áreas de
serviço do prédio. As senhoras fingiam, outras nem tanto, mas enojavam-se da
tara do velho. Os moleques de rua, montados em bicicletas, passavam-lhe a
prestar continências gargalhosas. Os maridos não deixavam mais suas mulheres
trocarem miúdos com aquele homem, outrora muleta útil do matrimônio alheio,
que, por fim, teve a sua primeira grande derrota em campanha sindical, desde
que passara a residir no “Morada das Palmeiras”. Estava, enfim,
des-mo-ra-li-za-do!
Sem o
posto, vítima de chacotas, amargando a solidão da popularidade, o pobre e
inútil coronel tombou. Encostou os coturnos.
A
cerimônia fúnebre se deu no salão de festas do condomínio. As senhoras rezavam
pela alma daquele pecador que, apenas em seus últimos tempos, seduzido foi pelo
mundano. A filha era, de fato, a única a dispensá-lo o pranto sincero. Foi
quando o absurdo se deu: ao jogar-se com uma coroa de flores sobre o corpo
paterno, sabe-se lá como, acionou a dita bombinha e o velho
"estandarte", resistindo à morte, apontou ao céu. Abismada e sem
saber o que fazer, a filha caiu para trás numa vergonha não apenas tão grande
quanto à da plateia feminina que, maquinalmente, batia a desejada continência
ao coronel.
Raymundo
Netto. Contato:
raymundo.netto@uol.com.br
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