"Se
o nosso destino
Não
for tão mesquinho
Ai
pro mesmo cantinho
Nós
torna a voltar"
Triste
Partida
(Luiz Gonzaga)
Fui, sou e serei apenas um matuto exilado
na cidade grande. Vim aqui apenas para sobreviver, terminar os
estudos, ganhar a vida, criar os filhos, como muitos irmãos que
foram para o Norte da borracha, para o Oeste desbravar fronteiras,
para o Sul futurar sustento.
Sou aquele nordestino que saiu do Sertão
dos Inhamuns há quase 70 anos e ainda hoje vive sonhando em voltar à
terra em que nasceu a cada chuvinha que cai nos subúrbios mais
distantes da cidade grande, a cada ventinho (eterno Aracati) que
varre as ruas mais longínquas das favelas em que está
irremediavelmente incrustado feito pedra de calçamento.
Este homem já quase cego que guarda no
baú antigo os muitos discos de Luiz Gonzaga, as fitinhas de São
Francisco de Canindé, a imagem de Padre Cícero, a rede com o fundo
já trocado mil vezes, a mala de couro cru, a chinela de rabicho
ainda com o barro seco, a lamparina de lata de óleo, a cartucheira e
a espingarda socadeira.
O que lembra toda noite de cada vereda do
torrão natal, de cada terreiro, de cada vaquinha (e até do timbre
de cada chocalho), de cada São João, de cada apanha e debulha, de
cada inverno e estiagem, de cada surra dos pais, do gosto de cada
canapum de beira de caminho, de cada canto de passarinho, de cada
relâmpago no nascente...
Um sertanejo triste que espera
pacientemente um dia retornar para uma visita aos parentes, para
enfim conhecer os que nasceram depois de sua partida, ou acender uma
vela nas covas dos que já se foram.
***
Sou um daqueles que espera, mesmo que
morto, um dia voltar.
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