O professor Sânzio de Azevedo, em suas
“Palavras Prévias” à biografia Adolfo
Caminha: vida e obra*, observa: “Poucas são as vidas de romancistas do Realismo
brasileiro que se relacionem estreitamente com a sua obra ficcional. Uma delas
é a de Adolfo Caminha, uma existência breve e ao mesmo tempo atormentada.”
Nascido há 150 anos, em Aracati, e
falecido há 120, no Rio de Janeiro, Caminha alcançaria o prestígio de ser,
mesmo sem ultrapassar os 30 anos de vida, e com três romances (A normalista, Bom-crioulo e Tentação –
este, póstumo), um livro de viagem (No
país dos ianques) e outro de crítica (Cartas
Literárias), um dos maiores nomes da corrente realista-naturalista no país.
Aos 13 anos, órfão de mãe, foi levado ao
Rio de Janeiro, onde iniciou-se no exercício literário escrevendo poemas para
as revistas Fênix Literária e Revista Escola de Marinha. Lá, na Escola
da Marinha, cometeu seu primeiro grande ato de rebeldia quando da, então recente,
morte de Vitor Hugo. Convidado a discursar como representante do grêmio
literário a seus colegas, autoridades da marinha e ao imperador Pedro II, ao
final, bradou: “Ah, não poder ele assistir à nossa marcha triunfal para a
Abolição e à República!”. Como o imperador compreendera ser aquele apenas um arroubo
da mocidade, a constrangida direção deixou passar. Entretanto, também em 1885, escreveu
um manifesto e recolheu assinaturas contra o tradicional “castigo da chibata”, decidido a publicá-lo em jornal, não fosse descoberta a sua intenção pela direção que
novamente o repreenderia, agora cogitando a sua disciplinar expulsão, o que não
aconteceria.
Em 1888, já oficial, por motivo de saúde,
pediu transferência a Fortaleza. Com tanta paixão à literatura, não demorou
para envolver-se e conquistar a admiração de seus pares, participando e
fundando agremiações e publicando em periódicos, até que a sua “paixão” voltou-se
também a jovem Isabel, o que não seria de se estranhar, não fosse ela casada,
inda mais com um oficial do Exército. Uma das cenas que se destaca em sua história,
é quando Isabel, após uma briga com o marido enciumado, deixa a sua casa, de
braços dados, à luz do dia e de todos, com o amante, indiferente às ameaças de
morte e aos receios de amigos. Caminha, mais tarde, diante das insistentes pressões
de comando, acaba por pedir demissão da Marinha, em prol de assumir de vez o
seu maior romance.
Em 1891, com a certeza de não existir
crítica literária no Ceará, Adolfo lançaria a sua Revista Moderna. E é nela que iniciaria extensos embates com
reconhecidos autores da época, como Antônio Sales – que mesmo assim o
convidaria para integrar a Padaria Espiritual – e Rodolfo Teófilo, ao mesmo
tempo que protestaria contra a construção da estátua de um governador falecido,
o paulista Caio Prado, enquanto José de Alencar, escritor a quem o Ceará tanto
devia, nunca, até então, havia recebido similar homenagem.
Em 1893, já residindo no Rio de Janeiro,
lançaria A normalista: cenas do Ceará,
sentida por alguns críticos como uma vingança do autor contra a “barbaria
semicivilizada de uma capital provinciana”, como Araripe Júnior descreve a
Fortaleza de então. Dois anos depois, O
bom-crioulo, por ter como temática o homossexualismo, em pleno século XIX,
como protagonista um negro e como cenário a mais antiga das Forças Armadas
brasileiras, causou repulsa e a incompreensão social, a “execração pública”,
como afirmou o próprio autor, vítima de “ato inquisitorial da crítica”. Curiosamente,
nos anos de 1930, durante o Estado Novo, o Bom-crioulo chegou a ser confiscado sob a alegação de ser obra “comunista”
e mesmo nos próximos 30 anos, renomados críticos não recomendariam a sua
leitura.
Enfim, muitos são os fatos que nos comprovam
a personalidade controvertida de um temperamental e abusado Adolfo Caminha, de
forma que, ao mesmo tempo que demonstra em alguns momentos a presença de
espírito e caráter, noutros parece não ter nenhum, entretanto, é impossível
tirar-lhe o mérito de ficcionista criativo, audacioso, experimentalista, que
nos legou obras que marcam seu merecido assento na literatura brasileira.
(*) Em breve, a editora Armazém da Cultura divulgará o lançamento de Adolfo Caminha: vida e obra, de Sânzio de Azevedo, revisto e atualizado, fonte de referência para o estudo sobre o personagem.
A temática do homossexualismo ? Não seria homossexualidade ou como já é utilizado por muitos autores, relação homoafetiva.
ResponderExcluirSegundo Houaiss:
ExcluirHomossexualismo: a prática de relação amorosa e/ou sexual entre indivíduos do mesmo sexo. O mesmo que homossexualidade.
Homossexualidade: condição de homossexual; homossexualismo