Sátiro era realmente de um azar medonho!
Imagine
que no escritório, nos bares, cinemas, sebos, no círculo de leitura, até na
padaria, e seja lá onde mais estivesse, não era incomum assanhar a mulherada. Sem
esforço, as seduzia com a fala mansa, os ouvidos pacientes e o olhar
desinteressado. Porém, entre todas as mulheres do mundo, a única que não lhe dava
o menor cartaz era justamente Artemísia, a sua esposa. Muito pelo contrário,
ela parecia se deliciar em humilhações com o marido. Desmentia o coitado na frente
de amigos e o desfazia para as amigas. Não o deixava descansar em casa, sempre
reclamando da vida, da sua inutilidade, exigindo-lhe mais do que podia, e, à
noite, o rejeitava na cama. Dizia abertamente ter nojo de seus modos, do seu
cheiro, além de irritar-se com sua voz e conversa monótona: “Você não presta, Sátiro!”
Não importava. Ele a amava, e a amava solitário e profundamente, como um coveiro
ama a morte.
Os amigos
se solidarizavam: “Rapaz, seja homem. Ninguém merece passar por isso. E, tenha
dó, se a patroa não se dedica, há de ter aquela amiga...”
Nessas
horas, ele deixava escapar um sorrisinho malicioso de coisa guardada a 7 chaves
– que ele daria tudo para se lembrar onde esquecera ao menos uma: “ Ah, vocês
não entendem... Mas é por que não sabem... e ainda bem que não!” Mesmo ali, em sua
miséria pessoal, sorvia a sua cervejinha arrogante, como triunfal, porém
incompreendido, vencedor.
Certa
noite, após um dia intenso de trabalho, chegou em casa e perguntou pelo jantar.
Ela, após um costumeiro “Não sou sua empregada”, pediu que sentasse: “Não gosto
de embromação, você sabe. Pois bem, vai ser duro para nós dois, mas sou franca:
eu te traí hoje!”
“Traiu?”
Aquela palavra rebentou em seus ouvidos como um estampido de revólver, uma
bomba atômica, a expulsão do Paraíso. Hesitou: “Como assim, amor?”
A mulher
se aborreceu. Colocou as mãos nos quartos: “Como assim? Quer que eu conte em detalhes,
seu abestado?”
Sátiro, tremendo-se
todo, empertigou-se e levantou rapidamente: “Tenho que tomar um ar”.
Saiu zonzo
de casa, enquanto a mulher, exausta, foi-se deitar com a leveza de um querubim.
Chegou ao
bar, onde encontrou a turma animada a comemorar o resultado do futebol. Ele,
pálido e sem pedir licença, lançou-se por cima da mesinha de plástico, virando
copos e espetinhos, caindo num pranto frouxo e dolente de moça largada. Contou
seu drama. A mulher tivera coragem de trair o compromisso. Justo com ele, mais
fiel do que ponteiro de balança.
Os colegas,
pasmos com a pungente confissão, reagiram. O primeiro: “Que piranha! Com todo
respeito, Sátiro, mas essa sua mulher não vale o que o gato enterra... Paga na
mesma moeda. Reaja, homem, ela está pensando que você é o quê?” Outro dava
ideia: “Beba, beba... Isso não pode ficar assim. Joga as tralhas dela na rua.
Beba que ajuda.” Aquele era mais enfático: “Se fosse comigo, não estava mais aí
para contar história... Acha que vai ficar assim e pronto? Você tem sangue de
barata, por acaso?”
Então,
súbito, Sátiro pôs-se em pé. “Não, isso não ficaria assim, mesmo. Reagiria!” Sem
dizer mais nada, dirigiu-se à saída com uma passada longa e forçosa.
Os amigos
pensaram: “Vai fazer uma besteira. Está doido, fora de si.”
Compraram
umas latinhas extras de cerveja e correram eufóricos para a casa do atraiçoado,
chegando a tempo de assisti-lo, choroso, apertando ao peito um buquê de rosas, de
joelhos e prostrado aos pés da mulher, suplicando-lhe o mais sincero e servil
perdão.
MISÉRIA PESSOAL foi ótimo. Kkkkkk...o texto me fez lembrar um professor, meu colega. Devotado pela mulher kkkkkkk
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