“A mim
me salvaram as crianças. De tanto escrever para elas, simplifiquei-me”.
Monteiro Lobato
Era uma vez um menino nascido ao
meio-dia de uma sexta-feira. O mundo estava em guerra. Não por tal razão
chorava. Havia saído a fórceps do útero de mãe primípara, por obra e graça de parteira
diplomada. Seu pai só tinha 20 anos, era ciumento e não deixou a jovem mulher ser
assistida por médico. Paparicado por jovens tias maternas, pois o casal estava
com pressa de povoar o mundo. Depois dele, não veio o dilúvio, mas oito
crianças.
Uma das tias sugeriu e os seus pais
aceitaram, iniciá-lo, aos quatro anos, nos estudos em escola experimental
americana. Ia só. Quem o acompanhava, ficava longe. Infelizmente, durou pouco. Matricularam-no
em ginásio formal. Um dia, não lembra a razão, foi o último a sair do recreio
para a sala de aula. De repente, o diretor puxou-lhe a orelha, ralhando.
Conseguiu um telefone do próprio ginásio e ligou para o pai contando o fato.
Disse: não estudaria mais ali. Dito e feito.
Dezenas de anos passados, ele, já com
netos em idade escolar, tenta aproximação de formas diferentes. Meio sem jeito,
desde o tempo de pai. Criara (seria o prenúncio de um ficcionista?), dois
personagens, a Rosinha e o Paulinho, crianças-exemplos. As filhas procuravam
conhecê-los. Ele driblava com evasivas: moram um pouco distante daqui,
viajaram, estão de férias etc. Rosinha e Paulinho eram bons filhos, estudiosos
e serviram de modelo invisível para as ainda crédulas filhotas.
Agora, conta um pouco do “seu-sem-jeito”
como avô. Há anos combinou com uma filha: levaria as crianças dela para a escola.
Tentava maior aproximação. Entravam no carro ainda bocejando. Ele, o avô,
colocara no toca CD músicas infantis e ia, desafinando, solfejando com eles. A
festa durou pouco mais de uma semana. Um dia, perguntou se fazia diferença ir
apanhá-los manhã cedo ou outra pessoa servia. Triste, ouviu: tanto faz.
Domingo desses, combinou com outra
filha, ir apanhar o seu primogênito para levá-lo a uma feira de numismática. O
neto, rosto cheio de protetor solar e saco com lata de moedas repetidas.
Sentados no banco da frente, cintos de segurança atados, foram conversando ao Parque
da Liberdade, no Centro, a “Cidade das Crianças”, concepção pedagógica da
professora Zilda Martins Rodrigues.
Lá, pessoas maduras fazem o escambo e
a venda de moedas. Sentou-se em uma banca. O neto, em outra. Fez as suas barganhas
e, ao final, o neto queria vender, a qualquer preço, as moedas repetidas.
Arrazoou: você não está precisando de dinheiro. Comprou novas moedas para o
neto, inclusive, cédula de dólar com a cara do Mickey, só circulante no mundo
da fantasia e no dos numismatas.
Depois, foram almoçar. Antes, o neto
pediu para tomar sorvete. Concordou, claro. Do almoço provou pouco, mas bebeu
duas latas do excêntrico guaraná Jesus, hoje marca da Coca-Cola. Mais um
sorvete e tomou o caminho de volta. Papos, risos e abraços. Ficaram combinados,
voltariam à feira.
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