Há mais de meio século tento (sem
sucesso, claro!) uma fórmula competente para começar bem o ano novo. Desisti
faz tempo das antigas listas de desejos, metas impossíveis e promessas
mirabolantes, pois nunca cumpri razoavelmente nenhuma; poucos itens foram levados
adiante – seja pela falta de forças, ou mesmo por culpa dos ventos (ou espumas)
irregulares dos dias que nos surpreendem com novíssimas vontades, imposições
prementes...
Entretanto vamos
lá novamente arriscando renovar pelo menos as velhas esperanças... Tentarei
(inutilmente, bem sei) cuidar um pouco mais da combalida saúde, diminuir uns
bons quilos, regrar os excessos de bebidas e comidas e raivas; ler melhores
livros, aqueles fundamentais que vamos deixando eternamente de lado tangidos
que somos pela brisa fácil das novidades...
Enfim, mais preocupações de pousos
que de voos; de terra que de mar e ar – cousa da idade (ora direis!), que nos
vai (ou seria se esvai?) apertando, encantoando-nos nessa antiquíssima sinuca
de bico que chamamos simploriamente de velhice.
Mas deixemos de coisas e cuidemos
da vida (pois senão...), procuremos – ora, pois-pois! – as pérolas bem
escondidas, aquelas raras, já que pouco tempo teremos pras banais... Porém
tenham cuidado (e lá vou eu com os conselhos inúteis!), pois as mais valiosas
se encontram frequentemente nos estercos da lida, pelos monturos das velhas
amizades de infância, das paixões antigas, dos sonhos perdidos, daqueles medos
evitados...
E vamos, pouco a pouco, buscando
desbravar menos os longínquos horizontes; entanto seria prudente cuidar mais do
jardim e quintal; melhor tirar boas horas do dia para tanger os ventos que –
roseanamente – redemoinham pelos terreiros; depois, então, sentar numa gasta
cadeira que já foi do avô, simplesmente olhando, mais e mais, para as tortas
unhas dos pés; enfim, espreitar menos espelhos... Fazer menos arrodeios!
Contudo, se o leitor quiser mesmo
começar melhor o ano novo, deve evitar principalmente ler velhos cronistas
ranzinzas, desesperançados! Pule direto para os jovens otimistas, moços
novidadeiros que adoram (como todos vós, não é mesmo!?) lustrar em público o
limpo umbigo.
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