domingo, 6 de julho de 2014

"A Pílula Azul", de Raymundo Netto, para O POVO


Estava eu de bobeira, acompanhando um grupo masculino para não falar em "roda" de amigos escritores, quando papo vai e papo vem alguém desfiou no centro da toalha vermelha da mesa o nome "Viagra".
Como toda conversa besta regada à cerva nem tem começo nem fim, e por motivo nenhum precisa ter nenhum motivo, perguntei se algum desses confrades já havia provado da tal lendária e fabulosa pílula azul.
A resposta não surpreendeu. Quase num clamor de hino em dia de decisão de campeonato de futebol, sentenciaram: ninguém nunca havia sequer chegado a ver a cor, aliás, ter ciência da sua diamantina cor azul niágara, disseram-me, já comprometia a reputação do ora escrevinhador dessas perfeitas e digitalmente traçadas linhas.
Entretanto, curiosamente, após disfarçadas risadas, um de cada vez começou a relatar, com certo ar de sobriedade, que, apesar de nunca de jeito nenhum e jamais ter sabido o que diabo era aquilo ou o que fazia, todos, vejam só, todos conheciam alguém que já usara daquele recurso para não ficar literalmente na mão. Um ou outro ainda arriscou a confissão de que pensara um dia em fazer um teste... Só pra ver no que dava, porque precisar, precisar, precisava não... Foi quando um deles levantou-se, de repente, para atender na esquina o telefonema da esposa cobrando a sua hora de chegar em casa.
A vítima de suas histórias passava sempre pelas beiradas. Era um vizinho de endereço do passado, um primo distante, um amigo cujo nome não se lembrava, um cidadão que cruzava a calçada ou dividia um assento no ônibus... Enfim, o que importa era a narrativa sempre introduzida pelo assim dizer: "Eu vi aquele negócio e não sabia o que era. Foi quando ELE me disse que era o diacho do Viagra. Falou que funcionava..." Daí, se soubessem, aproveitavam o silêncio do imaginário libidinoso alheio e largavam outras aventuras que não ouso repetir aqui, apenas porque mentira não se repete, de extraordinárias orgias, bacanais e outros eventos quiméricos de deixar o nosso queixo caído pela cara de pau de tamanha gabolice.
No mais, a maioria da plateia era severa: felizmente, nenhum deles precisava daquilo. Eram resolvidíssimos. Graças a Deus ou ao Diabo, nisso não estavam tão bem resolvidos, "davam no couro". Os mais antigos entre nós na convivência com o planeta, os denominados "conselheiros" ou "primeira divisão", extrapolavam: "podiam vir quente que já estavam fervendo!" Era quando alguém, por maledicência, soltava ao ouvido mais próximo: "Essa fervura não dá caldo, é só banho-maria..."
Entre nós, um mais calado, lembrou-se da história de uma senhora, já idosa, que sentindo a falta do vigor do esposo, hoje um retrato na parede de Itabira, procurou um médico que sugeriu que ela oferecesse a pílula azul ao companheiro. Ela pulou para trás. Ora se ele não tomava remédio nem pra dor de cabeça. Era um orgulhoso, um cabeça-dura!
O médico, astutamente, falou para colocar a pílula dentro do lanche que o velhinho mais gostava. E assim, soube depois, a senhora o fez. Porém, ela confessou: estava super arrependida. "Não funcionou?" Ah, funcionou, sim. E até demais, doutor! Ali mesmo tive a melhor transa de minha vida, mas acho que depois daquilo nunca mais nós poderemos colocar os pés no shopping...


8 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Fantástico rir sozinha aqui na minha sala de mais uma dessas delícias que você escreve. Meu Cheiroooo te alcance neste momento! Lovyu!!!

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  3. Bem oportuno ! Muitos falando sobre a pílula miraculosa......
    Abração

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  4. Boa, Raymundo Neto! arrasou, como sempre. Meu amigo Zé do Horto me disse que também nunca precisou da propalada pílula mas me confidenciou que um amigo usou e disse que era algo sensacional e daí admitir a possibilidade deu qualquer dia desses, fazer uma experiência, "só pra ver"; tipo aquele colega nosso que na juventude fumou um baseado, só para saber dizer alguma coisa quando o papo-cabeça rolasse sobre o assunto. Zé é macaco velho!

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  5. Netto, você está cada dia mais comédia...
    Bj

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  6. Bel, sempre bem-vindos os seus comentários. Abração.

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  7. Natércia, que bom "vê-la" por aqui... Essa semana eu darei notícias, tá? Bj.

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