I - Caça ao turista.
Férias, sol, suor e cerveja: alegria na cidade!
Está aberta a nova temporada de caça ao turista.
O taxista engrena três meninas novas no pedaço, combinam porcentagens, discutem locais... o porteiro do hotel da Beira-Mar, do motel da Parangaba e do quitinete no Centro concordam com os índices. Os pais das meninas também.
Os restaurantes confeccionam novos cardápios, sempre com alguns números a mais.
Os meninos doiradinhos de sol descem o morro, canelas secas e ligeiras atrás do “gringo velho”, que desapareceu no Novo México e, dizem, reapareceu em Iracema.
Os sujeitos das vans caçam vítimas, “atenção!, senhor, três praias por 80 réis.”Bugues assassinos esperam novas vítimas, enquanto isso cavalos, burros e jumentos cagam na onda branquinha.
O paredão de som ameaça com o mais novo sucesso da Axé Music e do Forró Eletrônico.
Três novos garçons foram contratados na barraca, os olhos vermelhos miram câmaras e celulares.
No velho teatro, pseudo-humoristas desenferrujam velhas piadas, bufônicas, histriônicas e carregadas de preconceitos. Sacaneiam o carequinha, o gordito, o branquelo...
Arrancam o riso a fórceps. Fecham o velho turismo nosso dos “três pés”: Praia, Prostituição Infantil e Piada de Mau Gosto.
“Está aberta, senhores, a nova temporada de caça aos turistas. Mas, por favor, não os assustem para que voltem! Vivos!”
II - Para-didáticos
Depois da famigerada corrida às compras de Natal e Ano Novo, os esfomeados comerciantes já afiam novamente suas garras por trás dos mil livros escolares...
Além, os primos pobres ensaiam sadismos entre as árvores da Praça dos Leões:
— Olha aqui, freguês!, me mostra sua lista! Aqui a gramática novinha, já com o novo acordo ortográfico... Não tá riscada!... Custa 80 paus na livraria.
O “freguês” se esquiva do vendedor, do trombadinha e vai atrás do Papai Noel, que cortou a barba e é especialista em para-didáticos...
Quando se sente segura telefona para o marido, “que é melhor comprar no colégio dividido em seis vezes”... Não chegam a um acordo e ela sai apressada, arrastando o menino e três sacolas cheias na direção do Passeio Público.
III - Pré-carnavais
Ano bom que se preze só se inicia depois do carnaval, o meu apenas após a Semana Santa. E olhem lá!!!
E uma das desculpas preferidas do cearense é a de que “o carnaval não, mas o pré-carnaval aqui é ótimo”. Lenda urbana, igual ao “Perna Cabeluda” (que é de Recife), “a Loira do Banheiro” e a recente “Railux Preta”. (Aliás, somos pródigos em lendas urbanas, as mais variadas e nocivas possíveis: a de que o turismo beneficia a todos, a de que temos por aqui futebol, a de que a cidade é bela... e outras mil mais.)
Pois bem, se o carnaval em três dias (?) já incomoda meio mundo, imaginem os diversos pré-carnavais em cada canto desta nossa desvalida loirinha desvirginada pelo sol. Do Periquito da Madame ao Vai dar o Carlito, da Cachorra Magra ao Rosca de Chifre do Zé Walter, do Num Ispaia senão Ienche, do Luxo da Aldeia ao finado Quem é de Bem fica. E tomem marchinhas mal tocadas pelos ouvidos afora, e tomem fedor de mijo pelas calçadas semana adentro, e tomem cerveja quente pelo fígado alheio, e tomem “saidinhas” de bloco pelas ruas adjacentes... E tomem, nós, insossos fortalezenses, barulhos sem fins pelo mês de janeiro em diante... E tomem, todos nós, no...
Pedro Salgueiro escreveu O Peso do Morto, O Espantalho, Brincar com Armas, Dos Valores do Inimigo e Inimigos, todos de contos; além de Fortaleza Voadora, de crônicas.
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