sábado, 10 de fevereiro de 2018

"Em Louvor a Jáder de Carvalho", por Bruno Paulino

Jáder de Carvalho, por Audifax Rios, para O Canto Novo da Raça

O escritor, poeta, político e jornalista Jáder de Carvalho é um dos maiores nome da história da literatura cearense, seu poema “Terra Bárbara”, indispensavelmente evocado quando se pensa e discute a identidade do povo do Ceará é a síntese de um sertão que não existe mais, e que, no entanto permanece vivo em muitas marcas e símbolos.
Jáder de Carvalho era quixadaense, nasceu na Serra do Estevão em 1901, e mudou-se para Fortaleza em 1915, no ano da grande seca que inspirou o romance de Rachel de Queiroz. Jornalista combativo, fundou o jornal A Esquerda, depois foi preso por 364 dias durante o Estado Novo (1943) implantado por Getúlio Vargas. Logo que conseguiu liberdade fundou o jornal Diário do Povo (1947). Esse período é estudado pelo historiador João Alfredo Montenegro no livro Jáder de Carvalho e o Diário do Povo (2011).
Hoje em dia muitos dos livros que publicou precisam ser reeditados. Dos seus romances apenas Aldeota consegue ser encontrado com certa facilidade em sebos e livrarias. De vasta produção poética, é apontado como um dos precursores do modernismo nas letras cearenses, com a publicação em 1927 do livro Canto Novo da Raça, em parceria com Franklin Nascimento, Sidney Netto e Mozart Firmeza. Porém o poema que mais gosto de Jáder de Carvalho, e que parece ser também um dos que o próprio poeta mais gostava, é de outra safra, e trata-se de “Em Louvor de Quixeramobim”, na qual a voz daquele que confessadamente foi “um menino lírico” consegue misturar seus sentimentos e impressões ainda vivos da infância com personagens e passagens da história da cidade:

“Não quero gravata. Não me tragam o relógio de pulso. Quero o gibão, quero as perneiras. Quero o chapéu de couro. Quem vai a Quixeramobim não é o professor, o bacharel, o jornalista Jáder de Carvalho.
Quem vai é o neto de vaqueiro, o menino que não esqueceu o pátio das fazendas.
Quem vai é o rapaz que, longe do mato, longe do Banabuiú, punha o ouvido na areia da capital e ouvia (ah, como ele ouvia!) o tropel de certo poldro ‘Andorinha’.
O mugido da vaca ‘Esperança’.
Quixeramobim, fala do coronel Jucá!
Fala de Antônio Conselheiro!
Conta-me a história do infeliz Luciano e da famosa Joana Batista Barreira! (Aqui no ouvido, Quixeramobim: Estavas no juízo, quando no papel, destronasse o imperador Pedro I e, de uma pernada só, derrubaste a dinastia de bragantina e proclamasse a república em 24)
Olha, no chão, que os teus gados pisam com ternura andou o pé revolucionário do meu bisavô João Aires de Olival.
Rapazinho, vindo do sertão para o Liceu, não vi nada de novo nos teus rios, nas tuas serras, nos teus campos. Tudo era conhecido velho. Até a cruz, gravada na pedra, perto do trem, me pareceu familiar. Eu não vira a todos, com antecipação de quase um século, pelos olhos de João? Às vezes, pego a pena e me sinto o padre Mororó, Às vezes, de pálpebras fechadas, sou um vaqueiro de Muxuré. Às vezes, ardo em rancor: limpo então o bacamarte, selo o cavalo, sou um Maciel a quem tomaram a terra. Um Maciel a quem mataram um parente. Ah, Quixeramobim, eu adivinho poesia, Até na vida dos teus ladrões de gado! Até na vida dos teus escravos! Até no adultério das senhoras das casas grandes! Até na sentença de morte dos teus primeiros jurados! Até nos despachos – ásperos e rápidos despachos – do juiz leigo, meu parente capitão Antonio Duarte de Queirós! Até na tosse dos tísicos que te procuram!
Chegou a hora, outra vez chegou a hora de pôr o ouvido no chão da capital: lá vem o tropel do podtro ‘Andorinha!’. Lá vem os aboios dos vaqueiros do Muxuré e do Logradouro, Lá vem a súplica do matador de Luciano ao pelotão de fuzilamento:
– Meus amigos, eu só peço que não me deixem sofrer!
Lá vem mais perto o poldro ‘Andorinha!’, Meninas, tragam o meu gibão! Tragam as perneiras! Tragam as esporas! Tragam o meu chapéu de couro! É assim eu vou a Quixeramobim.”

Sobre o poema acima transcrito, o próprio Jáder Carvalho comentou depois o seguinte: "[...] eu amo esse poema por dois motivos: porque ele saiu do sertão, saiu da minha alma e foi ouvido pela primeira vez em Quixeramobim numa festa centenária do município, em que esse poema foi lido na rádio para todos os quixeramobienses que se encontravam na cidade. É um poema consequentemente que tem sua razão de ser, preso a minha vida, está preso à história do Ceará e que está dentro da emoção do poeta, emoção que nunca morreu em mim"
Pois bem: a poesia da história se tece e Jáder de Carvalho vive em poesia!

Bruno Paulino, escritor




2 comentários:

  1. Meu tio Jáder, orgulho de toda a família, “cabra macho”❤️👏🏼👏🏼

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  2. Ola, me chamo carlos magno e sou muito fã deste grande poeta!!!

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