O cronista é aquele gato vagamundo que
perambula pelos quintais (reais ou imaginários), afastando telhas, dando susto
em lagartixas; tudo pelo simples prazer de vagar por aí sem pai nem mãe; um
bichano daqueles bem reles, que sequer tem dono; come quando lhe sobram algumas
migalhas – e até quando faz amor incomoda. Raramente tem prestígio, vez e voz
(claro, há os felídeos de apartamento, de pelo lustroso, porém não resistem ao
simples contato com a terra suja dos monturos).
É lido junto com pão de todos os dias,
rapidinho antes que o café esfrie na xícara; tem quase obrigação de não
assustar o recém-acordado, mas nem sempre consegue: conheço senhora que se
engasgou ao ler certos despautérios de colega mal educado; ouvi falar de
cismado patrão que demitiu mais de um funcionário depois de conferir uma
crônica sem pé nem cabeça de um camarada sem sensibilidade – dessas
croniquinhas que querem somente chocar o quase ainda dormindo madrugador.
Há os que aprendem a pôr a farinha na
forma com maestria, lépidos, rápidos e fagueiros, escrevem suas crônicas até
caminhando, comendo, dormindo... São de palavras fáceis, corretas, escorreitas,
leves e livres; nem carecem alegar nada para agradar o incauto leitor; são
quase máquinas, legítimos mágicos, se acham máximos. Existem, ainda bem, os
pesquisadores natos, que engrossavam braços no manejo de dicionários e
enciclopédias; hoje usufruem da leveza rápida do Google pai. Pululam por aí os inveterados umbiguistas, que fazem de
suas nem sempre exóticas entranhas o farto prato de todas as mesas; conquistam
amigos do peito, igualmente desafetos aos borbotões. Encontra-se também os que
entortam bigornas na procura do tema certeiro, e batem que batem martelos que
nem ferreiro à beira do fole na busca do estilo correto; verdade que acertam
aqui e acolá uma foice que preste, um machado de mestre; mas na maioria das
vezes apenas estragam ferro... esquentam a braguilha, tostam o bigode e as
sobrancelhas.
Mas o cronista maior é mesmo aquele
falsamente displicente, estudadamente arrogante, despudoradamente cínico; mas
que não seja nem mesmo alegre, de modo algum triste, muito menos poeta. Diz
tudo o que o fiel leitor (esse canalha exigente) quer ouvir e nunca teve lá
muito tempo, tudo o que o ledor sempre quis dizer e jamais criou coragem de
pronunciar; tudo o que ele (esse, convenhamos, famigerado leitor) sequer
imaginou.
O cronista bom mesmo é aquele que nem
mesmo possui o nome de cronista impresso na cabeceira da página, que é apenas
mero colaborador, colunista, convidado, sujeitado... Um quase escritor
fantasma! Que escreve pelo simples prazer (e vaidade, não é mesmo?) de ver seu
nome estampado, que não ganha nadicas de nada e ainda compra o jornal!
Nenhum comentário:
Postar um comentário