sábado, 3 de maio de 2014

"Dois pra Lá; Duas pra Cá...", crônica de aniversário de Raymundo Netto, para Lua e Lia (02.5)


Liana e Luana

Dois de maio de dois mil, quarto duzentos e vinte e dois (eu lia "dois dois dois"), foi quando vi pela primeira vez, de perto, minhas duas filhas, as gêmeas Luana Rachel – uma homenagem à mãe, Ana Rachel – e Liana Rebeca, nascidas de oito meses, ainda miudinhas. Chamá-las de "minhas", soava-me estranho, quando sabia ser na conferência dos brincos o seu reconhecimento: Lua, a que nasceu primeiro, usaria os de ouro; a Lia, os de pérola.
Saímos do hospital logo, e a Rachel, extremamente zelosa, pôs-se a cuidar de tudo: ajeitar o berço, trocar roupinhas (ela pessoalmente havia bordado lençóis, pagãozinhos e outros itens que a sua mãe, a d. Fátima, havia costurado), escovar os fios raros de cabelo, e, juntamente com suas irmãs, cunhados e sobrinhas, paparicava aquelas recém-chegadas dorminhocas, num quarto cor de rosa, cheiroso, à pouca luz e tomado de música de ninar e de muitas expectativas anteriores. Medrando "quebrá-las", passei dias as evitando. Um dia, porém, Rachel, após contínua rotina mal dormida, não atendeu a um chorinho despontado. Atrevi-me assim, a tirar a criança do berço e a fazê-la dormir. Era Liana. Naquela noite, pela primeira vez colocaria uma filha nos braços. Sentei-me na cadeira de balanço e a encostei no meu peito, sentindo no seu, o coração bater forte e ligeiro. Acariciei-lhe a cabeça e assisti-a dormir, bocejando gostoso com um bico rosado, a mão de dedos compridos descansando em mim, numa paz de fazer inveja e amor.
Nos outros dias, levantava-me à noite mais constantemente, já as acolhia com mais segurança, trocava-lhes as fraldas, e, com o tempo, elas foram crescendo, se relacionando com nosso mundo, sorrindo com a boca banguela e, balançando a cabeça desajeitada, subtraindo-nos de nós mesmos, envolvidos numa aura sincera e desinteressada de renúncia, num exercício único de afeto.
Daí, durante um ano não soube o que era dormir uma noite completa. Torcia para que não acordassem juntas, o que acontecia, mas raramente. Então, as acobertava em mantos coloridos (um amarelo e outro rosa), as abraçava (cada cabeça deitada num ombro) e as levava para passear nos jardins do condomínio da Bela Vista, olhando estrelas frias num passo cadenciado pelo quase sussurro de musiquinhas infantis. Geralmente, ao chegar no último bloco, elas se entregavam e dormiam, mas, se isso não acontecesse, eu tinha a certeza de que aquela noite seria comprida. Lembro-me da sensação de admiração que tive quando acordei, pela primeira vez, com o sol brilhante dependurado no céu, fosse essa a coisa mais invulgar do mundo.
Desaforadas, elas cresceram e, hoje, aos 14 anos, não posso carregá-las mais (embora ainda me caibam) nos braços, nem elas dormem com "musiquinhas". Preferem curtir o One Direction, Little Mix, Selena Gomez, Ariana Grande, Demi Lovato... Não suportam "posers"; leem John Green (elas chamam "João Verde"); se riem do "Sismance", vlog de meninas, Alana e Karina, que trocam até mensagens com elas; gostam de História (da "professora má", a Virgínia, e do Alexandre), são loucas de paixão por animais, principalmente pelo rabugento Lupi; e, o mais importante de tudo: escondem, mas têm o sorriso mais feliz de todo um mundo. Parabéns, filhas.

8 comentários:

  1. Emocionante! Linda crônica, fruto de um grande amor. Parabéns, amigo. Abraços.

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  2. Obrigado, amiga Lucineide, pela sensibilidade e amizade de sempre. Abração.

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  3. Lindas... As filhotas e a crônica.

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  4. Nossa! Lindo esse texto, foi possível imaginar cada cena! Parabéns pelas filhas!

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  5. Atrevi-me assim, a tirar a criança do berço e a fazê-la dormir. Era Liana. "Naquela noite, pela primeira vez colocaria uma filha nos braços. Sentei-me na cadeira de balanço e a encostei no meu peito, sentindo no seu, o coração bater forte e ligeiro. Acariciei-lhe a cabeça e assisti-a dormir, bocejando gostoso com um bico rosado, a mão de dedos compridos descansando em mim, numa paz de fazer inveja e amor." Parabéns Luana e Liana e parabéns também por terem um pai carinhoso e atencioso!

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  6. Bonito é ter um amor que transborda da gente. E você tem dois! Parabéns, meu caro!

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  7. Minhas amigas, você são muito "gente". Privilégio poder compartilhar essa leitura tão (especialmente para mim) importante. Abraço imenso em vocês.

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  8. Linda homenagem! Ser pai é um presente de Deus. Parabéns! Grande abraço!

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