quarta-feira, 19 de setembro de 2012

"Coisas Engraçadas de Não se Rir XXIV: Feticharia", crônica de Raymundo Netto para O POVO (19.09)



Era noite. Precisava de uma venda para olhos. Coisa simples, solicitação de participação em uma inocente dinâmica de grupo na manhã seguinte. Passei, por acaso, em frente a um sex-shop. Veio-me à cabeça, talvez, ali, encontrá-la. Entrei.
O proprietário da loja me atendeu com aparente cordialidade e discrição — nesse ramo, é muito —, não deixando de transparecer, entretanto, certo olhar estranhamente pervertido: “Uma venda, hein? Hummm... de couro ou de pelúcia?” “Só tem essas, é? De pelúcia, rola não, chapa...” Nisso, um rapaz franzino se chegou. Encostou-se ao balcão, quase a sussurrar, apontando: “Quanto custa ‘aquilo’?”. “Aquilo o quê?”, fingiu estranhamento o dono da loja. “Aquele ali!” “Ah, a bombinha peniana manual?”, exclamou desavergonhadamente enquanto o rapaz me parecia cada vez menor e mais precisado de tal “bombinha”. Depois, entrou um casal. A moça sorria aberta de felicidades por ela e pelo namorado, que o preferia fazer apenas por dentro: “Moço, e esse par de algemas?” “Essa de oncinha?” Logo, entraram mais umas quatro estudantes. Enquanto esperava para pagar a tal venda, pus a explorar aquele templo de fetiches, numa espécie de “turismo sexual”. “Tinha-se de um tudo”, orgulhava-se o gerente: pênis artificiais de todos os tamanhos, formatos, cores e texturas, até fosforescentes — provavelmente para não se correr o risco de perdê-lo de vista —, com display de contagem de perda calórica — para quem pratica o sexo como método de emagrecimento —, e incluindo os formatos especiais “Sheik” (pensei ser “SHREK”), “Czar” e “King”, além da exclusiva super-mega-plus prótese maciça “créu”, na cor preta, em PVC atóxico e cinta regulável; dedais e linguais vibratórios, cintas-liga, espartilhos, tapa-seios adesivos, tangas e calcinhas, com especialidade as comestíveis — sabor chocolate e morango — a advertir na embalagem: “Nela, não há nutrientes. Favor não degustar em cinemas. Ao utilizá-la, não esquecer sobressalente.”; baralhos eróticos, dados para strip tease, vibradores wireless, bolinhas para pompoar (conhecido “colar tailandês”), lubrificantes e preservativos em diversos sabores, dentre eles a novidade “melancia”. Os PETs, ou porta bullets — animaizinhos (bois, macacos, coelhos) com enormes falos que dormem, ou melhor, nunca dormem, ao lado de suas donas. Na seção “casal perfeito: tu gosta (sic) de apanhar e eu de bater”, via-se calcinhas com argolas e correntes, máscaras, vendas, coleiras, saqueiras, chibatas, algemas — famosos kits de tortura erótica. Fantasias de policial, bombeiro, marinheiro, salva-vidas, enfermeira, colegial, garçom, criada e do super-herói “Trepoman” — dispensando a braguilha. Seção de produtos para banho, óleos de massagem e perfumes, com a promoção, “pour homme”, da fragrância “Cafajeste”, de grande aceitação. Na mesma linha, encontrei o “X-Man”, gel prolongador de ereção. Para as moças mais curiosas, produto de lançamento: o “pintômetro”! Claro, havia uma seção especial para voyeurs com DVDs pornográficos de todas as categorias. Logo à frente um título curioso: “Atolando o Pé na Jaca 5: três negrões para cada gostosa”. Havia bonecas infláveis, coisa antiga: “Britney”, “Nancy”,  “Jéssica”... Surpreendeu-me, porém, o aparecimento do boneco “Butch”, espécie de “Ken” da modernidade, um pouco maior e mais devasso. E, pasmem, uma “Cabra”, “perfeita para sua despedida de solteiro”, e um burrinho inflável sonoro, “experiência sexual excitante e diferente”. Para casais apaixonados, a sugestão dos estojos: “caixinha safada” e “coração efervescente”. De novidade: aparelhos que sincronizam música com vibração (com uma estação para iPod) ou que emitem impulsos elétricos capazes de gerar orgasmos como fossem pensamentos. Prático demais para quem não pode perder tempo com coisas como: “Como foi seu dia hoje?” ou coisa parecida... Tardava, acusei pressa, o gerente largou as clientes e ainda arriscou: “Vai mesmo só levar a venda? Tem certeza que não gostaria de levar o chicotinho? Combina demaaaais com você...” Então. Pois que o sexo também é cultura, como diria agora a Marta, não é?

2 comentários:

  1. Mas rapaz, e você conseguiu sair de lá apenas com a venda? Muito bom seu texto.

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  2. rsrsrsrs Apenas com ela. Sou objetivo (vê-se, né? ). Abração.

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