No
Brasil, podemos afirmar que a crônica está para a literatura, assim como o
samba está para música. Afinal, quem não gosta de samba bom sujeito não é; quem
não gosta de crônica também não.
O fato é:
nossas crônicas, todas as boas ou todas as más, mesmo as falsas e as miseráveis,
parafraseando um Chico, como nossos sambares, serão bonitas, não importa são
bonitas.
Há de
boçais pregarem ser a crônica um gênero menor. Isso é bobagem. Gênero menor é o
conto, onde se dá por escrever menos. E o que dizer da poesia, uma
garatujazinha trepada em degraus em proposta frustrada do indizível?
In verbis ou on verbis, contextualizada a questão de quem nasceu primeiro, se o
ovo ou a galinha, arriscamos afirmar que foi a crônica, e que esta não é pinto
não.
O
também cronista popular Pedro Salgueiro, atento aos meus desastres de vida,
costuma dizer: “Rapaz, tinham que inventar um emprego de ‘fazedor de sala’...
Acho que nele você se daria bem.” Pois é, não de emprego, mas escrever crônica
é meio que fazer sala, bater papo, conversar. Advirto, entretanto, que a
escrita poupa o leitor da decepção presencial daquele indivíduo muitas vezes
mais interessante por trás de suas palavras. Aquele que, num primeiro ou
segundo momento, há de revelar o pensamento disperso, de engolir as últimas
sílabas quase impronunciáveis, de gaguejar em digressões extensas sem hora de
ter fim, ou de, subitamente, mostrar a face apática de quem se apercebe a
qualquer instante que falar sobre a mais bruta bobagem pode ser mais
interessante do que versar sobre teorias literárias, acordos ortográficos e
gêneros textuais.
Por
outro lado, o cronista, por excelência, é um bom ouvidor. Aliás, andar em
ônibus e ouvir a conversa alheia são alguns dos instrumentos de trabalho do
cronista. Ler jornais, ouvir rádio, prestar atenção nos feitos de outrem, seja
numa agência bancária, num banco de praça, em restaurante, em corredores de
hospitais e mesas de bares, também ajuda. Em contradição, a falta de assunto é,
de longe, um dos melhores e mais frequentes estímulos para o autor. Diante
dela, do branco evidencial, cria-se de um tudo, a partir sempre da recorrente constatação:
não sei mais o que escrever! (e eu preciso mesmo?)
O
Airton Monte, o cronista diário de O POVO, que o diga. Dias há em que conversa
até com as formigas na calçada para extrair-lhes alguma doçura, mesmo que esta,
a todo esforço, ainda vingue por adoçante.
Daí, o
cronista, como convidado do café da manhã de seus leitores, ter a oportunidade
de salvar o dia ou azedá-lo completamente, a partir de uma piada bem colocada ou
da constatação inequívoca de nossa total inabilidade e incompatibilidade para viver
neste mundo – existem outros, acredito.
E é
nisso, enfim, que reside ainda a possibilidade da crônica, no seu fazer, que
deveria ser de todo assim: olhando no olhos, puxando firme o cabelo à
altura da nuca, dando ordens ao pé da orelha, e, se couber, dando uns tapinhas,
com toda a gentileza que só quem traz um amor pode entender.
palavras tratadas com amor real e com direito a toques de pseudoerotismo.
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