No escuro, de olhos fechados
e o sono não chega. Há quanto tempo estou assim, imóvel, tentando não pensar em
nada... Duas horas? Nem sei... Súbito, ouço a porta de meu quarto se abrir e os
passos de uma criancinha correndo para a minha cama. Joga-se e se encosta toda
em mim, aconchegando-se. Apesar do susto, continuo imóvel. Lembro-me
imediatamente de minha filha: era assim que ela fazia todas as noites. Mal ouso
respirar. Logo a criança se afasta para a beira da cama e lá permanece. A porta
se abre pela segunda vez e reconheço os passos de meu marido em direção ao
banheiro. Minutos depois sai sem nada falar. Penso: voltou para a cadeira do papai
onde gosta de dormir diante da televisão ligada, lá na sala. Não parece ter
notado nada fora dos eixos. Acho que finalmente cochilei, mas logo abri os
olhos. Ainda estava escuro, começando a clarear. Ninguém no quarto, somente eu
e uma tremenda sensação de vazio. Senti um mal-estar de mundos sombrios, nas
caladas da noite. Fui ao quarto de minha filha que estava pacificamente
dormindo. Sentei na beirada da cama e ela, pressentindo minha presença, com a
voz arrastada, perguntou: — Que foi, mãe? Eu respondi: Nada, você está bem?
Acho que tive um pesadelo esquisito... Voltei à cena inusitada: sensações muito
nítidas impregnadas em mim, como se conseguisse visualizar a cena, mesmo de
olhos fechados. No dia seguinte, ainda abalada pela imersão dessa realidade
absurda no meu real, comentei o fato com minha empregada. — Foi alma pedindo
reza, dona Vera. A senhora rezou? Não, não rezei. Mas as imagens fantásticas e
aquele susto estranho, irrompendo inesperado, me perseguem até hoje. Em que
esferas do inconsciente levitei?
Nenhum comentário:
Postar um comentário