segunda-feira, 15 de abril de 2024

"Ziraldo no Ceará (parte 1)", de Raymundo Netto para O POVO



A última vez que Ziraldo veio ao Ceará participar de uma Bienal aconteceu em 2010, a convite meu, quando estava curador da programação da Bienal Internacional do Livro do Ceará, cujo tema era “O Livro a Leitura e os Sentimentos do Mundo”.

Era abril, o mês do livro e do aniversário da cidade, e eu queria trazer alguns nomes caros à infância brasileira, além de outros que, mesmo não tão badalados naqueles tempos, decerto eram imortais na lembrança dos(as) leitores(as) cearenses de todas as idades, como Carlos Heitor Cony, Affonso Romano de Sant’Anna, Tiago de Mello, Marina Colasanti, Maurício de Souza, Pedro Bandeira, Ana Miranda e Ziraldo. Claro, no quesito literatura infantojuvenil, teríamos os(as) cearenses Horácio Dídimo, Socorro Acioli, Klévisson Viana, Elvira Drummond, Tércia Montenegro, Arlene Holanda, Almir Mota...

Como curador da programação, fiquei responsável em receber os convidados. Naquele dia, iria encontrar o Ziraldo no aeroporto. Disseram-me: “Este não dá trabalho – alguns deram –, pois sempre vem com a esposa ou com o agente dele. Bastava recebê-lo e deixá-lo no hotel.” Assim me disse a produção.

Contudo, não se deu assim. Ziraldo chegou sozinho! Quase correndo, assustado, no meio do povo. Perguntei-lhe pela esposa: “Depois da festa de aniversário que ela deu ontem, eu não sei nem quando ela vai acordar...” E o seu agente?: “Quebrou o dedo do pé.”

Chegamos ao Marina Park Hotel, onde se hospedaria. Apresentei a ele a equipe que estava ali à sua disposição, mas: “Raymundo, eu não fico sozinho!” Perguntou se eu tinha o contato do Mino. Eu tinha. Pediu que eu marcasse um almoço com ele. Teria também uma entrevista marcada, mas não sabia onde, com alunos do jornalismo da UFC – era para a revista Entrevista, sob a coordenação do Ronaldo Salgado.

Enquanto acertava com o Mino o almoço no restaurante da Beira-Mar, tirei de minha mochila uma encadernação com todos os 10 números da revista da Turma do Pererê, pela Abril (1975), o seu retorno após a primeira “temporada” pela O Cruzeiro.

Ziraldo se emocionou. Disse que aquelas ele não possuía. Autografou ao seu estilo. Lamentou que naquele tempo estava chateado com a editora por conta de divergências. “Cabeça-dura”, preferiu cancelar. Por outro lado, sabia que poderia ter se empenhado mais, ter feito mais: “Ninguém falava ainda em Ecologia nem na valorização da fauna nativa ou da cultura brasileira... Tinha tudo para ser um sucesso maior!” Folheou demoradamente e depois me devolveu a minha pequena coleção agora autografada.



De fato, a Turma do Pererê foi a primeira revista em quadrinhos brasileira feita apenas por um só autor, sendo também a primeira HQ a cores publicada no país.

Saímos do hotel para nos encontrarmos com o Mino no restaurante do Faustino, uma excelente vista para o mar. Muito bonito e divertido presenciar o encontro desses dois talentosos cartunistas, ainda mais ciente da importância de Ziraldo no rumo seguido pelo Mino, o pai do “Capitão Rapadura”, o herói que (quase) tudo atura.


Por volta das 15 a 16h, chegou o Ronaldo Salgado acompanhado de um bom grupo de jovens estudantes do 6º semestre do curso de Comunicação.

Pedi que Ziraldo tentasse não se estender muito, pois a mesa dele na Bienal aconteceria no início da noite. Ele me tranquilizou... “Nem gosto muito de falar. Em 15min, eu termino.” Quando sentou-se à mesa, começou a perguntar o nome de um por um. Quando o(a) estudante respondia, ele perguntava: “E por que do seu nome?”. Pronto, ali fiquei certo que seria uma longa, muito longa entrevista.





(CONTINUA)





 

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