Mauro Fagiani - 23.jan.2016/Pacific Press/Alamy
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MARCELO NINIO, de Washington
06 de outubro de 2016
Apesar das
dificuldades financeiras vividas por jornais ao redor do mundo e da explosão da
internet, são eles que continuam sendo a mais importante fonte de informações
confiáveis, diz um veterano jornalista, que ficou famoso ao ser interpretado
pelo ator Michael Keaton no cinema.
Bom de papo
e apaixonado por sua profissão, Walter
Robinson, 70, chefiou a equipe de reportagem investigativa do jornal Boston Globe que revelou a enorme escala
de abusos sexuais em série cometidos por padres católicos na cidade em 2002.
A história
deu origem a Spotlight: Segredos Revelados, que ganhou o Oscar de melhor filme neste ano.
Em sua
primeira visita ao Brasil, Robinson participa neste sábado (8) de um painel
do Festival Piauí GloboNews de Jornalismo, em São Paulo.
Pouco antes
de embarcar, ainda sem compreender a demora para obter o visto para o Brasil
—que lhe exigiu três idas ao consulado—, Robinson conversou com a Folha por
telefone sobre a reportagem que rendeu à equipe o prêmio Pulitzer, o mais
importante do jornalismo americano, o filme e o futuro da profissão.
Analisados quase uma
década e meia depois, já com o conhecimento dos fatos, é difícil entender
porque os abusos cometidos por padres em Boston, com o acobertamento da Igreja
Católica, só foram revelados em sua verdadeira extensão quando a equipe de
Robinson mergulhou no assunto. Segundo ele, um dos motivos foi a
"deferência" à igreja em Boston, que tornava o assunto de certa forma
intocável.
"Se alguém dissesse
há 30 anos que milhares de padres católicos haviam abusado de dezenas de
milhares de crianças e que a igreja havia acobertado tudo, essa pessoa seria
considerada louca. A ideia de que a igreja estava envolvida em algo assim era
inimaginável. Depois descobrimos que uma grande quantidade de casos era
conhecida da polícia e dos procuradores, mas eles não fizeram nada por deferência
à igreja", conta.
'FORASTEIRO'
Nascido em Boston há 70
anos e desde 1972 no Boston Globe, o
jornalista reconhece que foi preciso um "forasteiro" para empurrar a
reportagem, o editor Marty Baron, que chegou de Miami com um "olhar novo e
sem se importar com quem iria ficar ofendido". O início do trabalho foi
motivado "por medo do chefe", diz Robinson. "Parece piada, mas
fizemos por medo."
Partindo de um caso
antigo de um padre que havia sido acusado de abusar crianças nos anos 1980, em
uma semana a equipe de Robinson entendeu que aquilo era "apenas a ponta do
iceberg".
O que no início parecia
ser no máximo uma dúzia de casos revelou-se muito maior, com quase 250 padres
envolvidos em abusos de crianças em Boston. O trabalho rendeu à equipe o mais
cobiçado Pulitzer, o de serviço público. Algo que Robinson, sem modéstia,
considera totalmente justificado.
"Dada a extensão
dos crimes e o fato de que sua exposição levou a mudanças significativas na
forma como a igreja opera, acho que não dá para imaginar um serviço público
melhor", diz.
Com recursos cada vez
mais escassos para reportagens de fôlego, Robinson lamenta que os jornalistas
têm deixado escapar muitas histórias importantes, mas acredita que os jornais
continuam fundamentais.
"Os jornais ainda
são a principal fonte de informação e reportagens de fundo", afirma
Robinson. "O problema é que demos de graça o nosso produto por tanto tempo
[na internet] que é difícil convencer o público de que, se você de fato quer
notícias com profundidade, tem que pagar por elas."
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