Cunha, entre acunhadores, sendo convidado a desacunhar
O Brasil, como pátria educadora que
nunca foi, abriu a grande sala de aula ao vivo e em cores no temível domingão da
Câmara de Deputados que, com ares de um stand-up
comedy de mau gosto, saiu do anonimato para mostrar sua carantonha,
envergonhando-nos colonialmente perante o mundo.
Quem acompanha noticiários e/ou lê
jornais mais regularmente, sabe bem que a Câmara, e nosso legislativo como um
todo, nos prova: há pelo menos 3 coisas que não tem competência para fazer: representar o povo brasileiro, legislar sobre os
assuntos de interesse nacional e fiscalizar a aplicação dos recursos públicos.
Não seria extravagante se
perguntar que tipo de representação essa Câmara sustenta, quem afinal é esse
“povo brasileiro”, se algum deles tem noção do que se configura como interesse
nacional e, quanto ao último item, vale a máxima de que não se deve colocar lobos
para tomar conta de ovelhas.
Tirando o Sérgio Reis,
que provavelmente estava ali por engano para uma palhinha de Jeca triste, e
assim o foi, os demais chegaram ao microfone cercados por homens e mulheres
que, buscando o cinegrafista, vaiavam, assobiavam, aplaudiam e cuspiam numa
balbúrdia de bingo de centro da cidade.
O burlesco Plenário –
não ouso dizer “palhaçada”, pois esses artistas são sérios e o Brasil, num dito
francês, não o é –, como de costume, usou da espetacularização do momento.
Coisa preparada para o álbum dos quinze minutos de fama e de sem noção. Cada
um que saudava a Deus, à família, ao gato e ao papagaio e aqueloutros que ainda
tinham estômago para “recadinhos do coração", comprovava a sua
inobservância da causa, da sua função de representatividade e do seu papel de
servidor público.
No Domingão da Câmara foi perceptível
para as pessoas que não estavam apenas interessadas no placar de seu “time” –
muito no nível de torcida organizada de equipe em terceira divisão –, a falta
de decoro, a descompostura, a improbidade e a não idoneidade. Pior: o resultado da
ausência de educação de cidadania para o exercício do poder. E, convenhamos,
não há como falar em civilidade e progresso num país no qual pelo menos metade
de seu Congresso Nacional responde (alguns já condenados em primeira instância)
a inquéritos, ações criminais e cíveis, entre outros. Dizem até que aqueles que
nessa lista não constam, já se consideram “classificáveis”.
Para não sair da harmonia dessa bizarra
orquestra, o presidente-maestro também traz um currículo invejável de alta propinagem.
Durante o show, apresentava uma fingida apatia de quem percebe que a cacetada
vai ser grande, mas que não teria como escapar da sua, o que acontece agora,
por unanimidade, com um supremo pé na bunda. O seu substituto também é
investigado e, em breve, o presidente do Senado também cairá. E nisso, numa
democracia de instrumentos e defensores acanhados, a política é engenhosamente
articulada para não permitir mudanças, propiciando a corrupção de praxe, em
nome da governança dessa pátria mãe tão distraída sempre mercadejada em acordos, a maioria, para não gastar saliva, imorais. A nossa Independência foi
golpe, a proclamação da República, outro, assim como o Estado Novo, a
“Revolução” de 64, a chacina do Curió – só para não cair em esquecimento – e o
processo desse impeachment.
Infelizmente, o maior e melhor golpe
poderia emanar do povo, mas isso só com muita educação, o que nunca fez bater
panelas por aqui. #ocupemasescolas!
Raimundo Netto.
ResponderExcluirVocê me representa. Deixe eu assinar com Você.
Que vamos fazer por esse País?
Desanimador!
Custa crer que esse é o País que tanto amamos!
Excelente reflexão!! Excelente crônica!
ResponderExcluirObrigado, Miguel. Às ordens. Abração, garoto.
ExcluirLuzia, feliz por sua gentil leitura. Olha, na verdade, tirando os humores, o país está passando por uma fase de muito aprendizado. Pena que muitos ousam dispensar aprendizagens, já até o pescoço de preconceitos e medos descabidos, frutos de um país que insiste a viver democraticamente a democracia. Estamos no beabá dela, engatinhando, então a crise pode ser de grande importância, mesmo sendo um remédio tão amargo e tendo que passar por tantas privações. Mas tenho fé de que aos poucos a sua cultura conseguirá se consolidar e nem precisemos chegar a tão fundo. Grande abraço, professora.
ResponderExcluirAh, corrigindo: "um país que parece que resiste a viver democraticamente a democracia"
ResponderExcluir