O jovem Castro Alves
Como se
retrocedesse na cápsula do tempo neste 2015 tão complicado – e ainda estamos em
março –, desembarco no ano de 1868, cem anos antes do revolucionário 1968: o ano que não terminou, seguindo
livro homônimo de Zuenir Ventura e outros escritos por franceses.
Chego e encontro
José Martiniano de Alencar Júnior no Rio. Famoso, nosso escritor maior, político
importante, faz, afirmo, tráfico de influência. Olhei e vi a carta de 18 de
fevereiro de 1868, do autor de Iracema
para Machado de Assis.
A carta vai
resumida, em etapas. Começa assim: “Ilmo. Sr. Machado de Assis. Recebi ontem a
visita de um poeta. O Rio de Janeiro não o conhece ainda; muito breve o há de
conhecer o Brasil. Bem entendido, falo do Brasil que sente; do coração, não do
resto”. (LEIA MAIS)
Como se vê, José
de Alencar, que era político, tal como o pai, lembro, enxergava a dicotomia.
Havia dois brasis. Um: o que se
sente; do coração. Outro, o do resto. Assim, a coisa vem de longe.
Voltemos à
carta, a do Brasil do sentir. Alencar continua: “O Sr. Castro Alves é hóspede
desta grande cidade, alguns dias apenas. Vai a S. Paulo concluir o curso que
encetou em Olinda. Nasceu na Bahia, a pátria de tão belos talentos: a Atenas
brasileira que não cansa de produzir estadistas, oradores, poetas e guerreiros.
Podia acrescentar que é filho de um médico ilustre. Mas para quê? A genealogia
dos poetas começa com o seu primeiro poema. E que pergaminhos valem estes
selados por Deus?”
Agora, Alencar
fala das referências do logo futuro poeta condoreiro: “O Sr. Castro Alves
trouxe-me uma carta do Dr. Fernandes da Cunha, um dos pontífices das tribunas
brasileiras. Digo pontífice, porque nos caracteres dessa têmpora o talento é
uma religião, a palavra um sacerdócio”.
Alencar elogia
Joaquim Maria Machado de Assis, a quem a carta é dirigida, lembre. Diz o
tísico, míope e brilhante filho de padre: “Lembrei-me do senhor. Em nenhum
concorrem os mesmos títulos. Para apresentar ao público fluminense o poeta
baiano... Seu melhor título, porém é outro. O senhor foi o único dos modernos
escritores que se dedicou à cultura dessa
difícil ciência que se chama crítica... Do senhor, pois, do primeiro crítico
literário brasileiro, confio a brilhante
vocação que se revelou com tanto vigor”.
E conclui: “Seja
o Virgílio do jovem Dante, conduza-o pelos ínvios caminhos por onde se vai à
decepção, à indiferença e finalmente, à
glória, que são os três círculos máximos da divina
comédia do talento”.
Machado de Assis
respondeu no dia 28, do mesmo mês de fevereiro: “Exmo. Sr. – É boa e grande fortuna conhecer um
poeta; melhor e maior fortuna é recebê-lo das mãos de V.Exa., com uma carta que
vale um diploma, com uma recomendação que é uma sagração. A musa do Sr. Castro
Alves não podia ter melhor introito na vida literária. Abre os seus primeiros cantos, obtêm o aplauso de um
mestre”.
Devo dizer, tal
como José de Alencar, a carta de Machado é longa. Cada um rasga-seda maior.
Poupo-o de páginas e vou direto ao final da missiva quando, após considerações
críticas, Machado aduz que o jovem poeta Antônio Frederico de Castro Alves
ainda não está pronto: “A mão é inexperiente, mas a sagacidade do autor supre a
inexperiência. Estudou e estuda; é um penhor que nos dá. Quando voltar seus
arquivos históricos ou revolver as paixões contemporâneas, estou certo que o
fará com a mão na consciência. Está moço, tem um belo futuro diante de si.
Venha desde já alistar-se nas fileiras dos que devem trabalhar para restaurar o
império das musas. O fim é nobre, a necessidade é evidente. Mas o sucesso coroará a obra?...
Lembro ao leitor
que o recomendado Castro Alves escreveu a sua obra capital Navio Negreiro no ano seguinte, 1869, e morreu, tuberculoso, em
1871, aos 24 anos. Alencar desde cedo enfrentou a tuberculose e se quedou em
1877, aos 46. Machado de Assis, com todas as mazelas advindas da epilepsia,
varou o século e se foi aos 69, em 1908.
Volto ao 2015. Chove. Ouço barulhos.
Netto. Onde posso conseguir a carta, na íntegra, de José de Elencar para Machado de assis, apresentando o poeta lavo Bilac, bem como a resposta de Machado a José de Alencar. Lia-as há muito anos, mas atualmente o golgle não fornece mais. Meu irmão é louco por essas cartas e eu queria surprendê-lo com elas. Você me dirá a dica? São cartas para a gente guardar, documentos histórios e literários do Brasil;Preciosidades. Grata pelo empenho.
ResponderExcluirHelena, bom dia. Essa publicação se deveu ao João Soares Neto. Eu mesmo não sei como consegui-las. Nem sei se ele teria acesso a outras. Mas posso tentar procurar e passo o link para você. Pode ser?
ResponderExcluirPode ser, Netto. Ciao.
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