Um vitral pode ser bonito como for, mas
se não existir luz, principalmente solar, ele perde o brilho, sendo apenas um
conjunto de recortes de vidro colorido. A luz, esse brilho, é o que lhe confere
beleza e é o que dá valor a todas as coisas.
As pessoas também são assim. Podem
comprar joias, acessórios de luxo, rouge,
batom, sapatos, vestidos, ternos, automóveis cintilantes, artefatos
tecnológicos, colocar até peitos e rasgar gorduras, ficando aparentemente mais
apetitosas, atraentes, ou apresentarem uma estampa dissimulada que só ilude, e
temporariamente, os “rasos” ou interesseiros, e nunca as pessoas com mais
conteúdo, sensíveis e inteligentes, não facilmente enganadas pelo grande
espetáculo da tragédia/comédia consumista.
Essas pessoas, os atores genéricos da
sociedade emergente, que “não são recôncavos nem podem ser reconvexos”, tentam
menosprezar e até “calar” essa luz, pois sabem que não podem comprá-la, alugá-la,
pedir de empréstimo mesmo com altas cifras de juros, nem têm como pendurá-la na
parede. Não podem encontrá-la facilmente nos bistrôs, nos fundos de garrafas
envelhecidas de 12 anos, nem em megastores,
muito menos em joalherias de shoppings. Essa luz, ao contrário da pregação
capitalista, é adquirida em vida, construída como um patrimônio que, embora
seja “transferível”, não pode ser regateado, nem dado e custa muito tempo para
adquirir e uma eternidade para se apagar. O brilho dessa luz, ao contrário do
que se diz, é próprio. Triste daquele que só brilha ao lado de medalhas, joias
e cifrões. É um humilhado, um eterno carente a montar seu teatro em vida,
contratando atores, palcos suntuosos e muita bebida para receber aplausos não
convincentes que só enganam mesmo nas fotografias.
Não me estranha assim a superficialidade
da sociedade, das relações, a violência, o descaso com a educação e com a
cultura, a desigualdade e injustiça social. Isso tudo existe pela inexistência
da luz verdadeira na direção e comando desse mundo.
Muitos dos falsos “privilegiados” nasceram
em berço acolchoado, tiveram uma demão de tinta, uma caiagemzinha que,
naturalmente, faz com que se sintam superiores, pois falam uma outra língua, ou
quase todas, já deram voltas e voltas pelo mundo, conhecem gente que OCUPA
cargo importante — o que é anos-luz de
diferença de SER uma pessoa importante —,
e só ostentam conforto financeiro por meio de laços (ou ligas) familiares que assim o permitiram.
Alguns precisam lamber botas, fingir, emprestar
a cabeça de capacho para conseguir margear as sobras da pessoa de sucesso mais
próxima. Ora, nem sempre podemos afirmar que pessoas com prestígio financeiro
são imediatamente pessoas com sucesso. Dinheiro vem; dinheiro vai. O empresário
Eike Batista, por exemplo, que até há pouco tinha uma fortuna e era
paparicadíssimo, de repente abre a boca para dizer que é um baque, uma tragédia,
voltar à classe média. Bem-vindo ao nosso mundo, Eike, e parabéns, agora você vai
descobrir quem é e se tem algum amigo...
Os valores, verdadeiros valores, trazemos
no peito, antes de na cabeça. Há uma diferença enorme entre os valores do mundo
e os do homem. Assim, é preciso muita coragem para se impor nesse mundo, falar a
sua língua, dizer o que se pensa sem temer ser o que é, sem precisar se conter
de desejos, e ainda conseguir dizer não.
É muito triste assistir a pessoas que
crescem em seu trabalho, seja lá o que for, estando com o fundo das calças a
mostra, pintado de vermelho e salpicado de luzinhas neons que asseguram “Eu te
amo mais do que tudo, chefinho..”
Dinheiro é bom, principalmente quando é
resultado do trabalho bem feito, e, de preferência, um trabalho que orgulhe,
que perdure, que tenha valor para a sociedade. Mas quando o dinheiro passa a
ser a razão de tudo, comprando a própria alma, o resultado disso só pode ser
muito ruim, e, como praga, toma conta das gerações futuras. Infeliz de quem é
vazio!
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