Em Mumbai, na Índia, em 2013, um partido distribuiu milhares de facas a mulheres
para que elas se defendessem de possíveis
agressores, após o caso de estupro
coletivo de uma estudante.
Publicado em O POVO, pela primeira vez, em outubro de 2011.
Muito bem, estávamos em maio. Era o
Dia Mundial sem Tabaco. Na televisão, no rádio, nas praças, era só no que se
falava: Dia Mundial sem Tabaco!
No Brasil, as campanhas
antitabagísticas rolavam soltas, adeptos à ruma, mas em Bangladesh, país
conhecido pela presença de grandes acidentes naturais, como ciclones, por
exemplo, creio que não, pois foi num repente rodamoinho que nos veio a notícia:
Um cidadão, Mozammel, pai de
cinco filhos, certo de sua doçura, há cerca de seis meses arrastava asas a uma
pós-balzaquiana mulherinha dos arredores. Gentilezas para cá, safadezas para
lá, justo no alarmado Dia Mundial sem Tabaco, o desavisado decidiu empreender
sua campanha a favor da criatura de seu desejo.
A bengalesa Monju, vítima do seu
desajeitoso assédio, há muito desconfiada das intenções do vizinho, dormia,
vejam só, não com uma bengala, mas com um facão embaixo do travesseiro. Assim,
foi o esperançoso, certa fria noite, invadir-lhe a alcova a apresentar-lhe o
pretensioso “buquê” e ela “Dá cá!”, o tomou de assalto, à arma branca,
guardando-o, mais que depressa, num saquinho de bodega, desavisada ela também
do dito: “a paz se faz pelas mãos das mulheres”.
O coitado inda gemia à falta de
sua ferramenta amorosa quando a criatura soleirava à porta da delegacia,
prestando queixa, prova na mão, como antes o queria o agressor, mas não
exatamente dessa forma.
A polícia horrorizou-se: nada
mais cabal!
O sujeito foi parar, claro, no
hospital, insultando a mulherzinha de um tudo, menos de vaca, pois esta,
naquelas bandas, é sagrada. Por lá, nada a fazer, a não ser a espera da
providência divina ou a inscrição eterna no sindicato dos eunucos. Enquanto
estivesse em recuperação, a justiça terrena — e masculina —, solidária à dor, o
preservaria, mas saísse do leito, seria de prestar depoimento, responder em
juízo e recluso pela abobalhada e fracassada tentativa de estupro.
Não haveria como negar, sabiam
todos, a evidência maior — e não tão grande — estava ali, troféu de caça da
bengalesa faladeira que já espalhara pela vizinhança toda, batendo no peito
magro e caído: “Aquele ali, ó, nunca mais se dá ao enxerimento, negrada”.
Pois é, leitores tímidos,
leitoras desforradas, não é que aquela mulher, supostamente tão indefesa, num
ato vanguardista reinventou a pena de Talião, onde a vingança é a melhor forma
de perdão, não somente matando a cobra, mas também mostrando o pau?
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