Circulou em vermelho o anúncio de jornal.
Viera do
sertão esperançando melhoras de vida. À procura de um emprego, tinha passados
os dias e, mesmo batendo em diversas portas, só recebia nãos.
Fora
acolhido à casa de um irmão e passava bem tantas e quantas vezes, porém, de um
momento para outro, ansiou empregar-se sem tardança.
Tudo porque
percebera que a cunhada se dava ao entusiasmo de sua presença. Dias-há, a sonsa
dera para cruzar seu caminho a camisolas e distraía-se: porta do banheiro
aberta quando a feita do banho. Ademais, nunca levava a toalha para o banheiro.
Era chegar ao chuveiro e gritar: “Fulano, traz a minha toalha... Eu esqueci!”
Temia que
seu irmão percebesse a folga da esposa e viesse lhe tomar satisfações.
Decidiu: tão
logo arranjasse um emprego, fosse qual fosse, alugaria um cantinho, um
quarto-e-sala qualquer, mas sairia dali antes que o pior se abancasse.
Naquele
dia, então, acordara mais disposto, diferente, entusiasmado. Refletia
esperanças!
Cedo,
encaminhou-se ao endereço do anúncio: um escritório. Cerrou com os dedos o nó
meio que penso da gravata, sacudiu a mão nos ombros, segurou firme a pasta do
currículo e adentrou.
Sentou-se
na recepção entre outros candidatos e esperou a sua vez.
Por motivo
ignorado, a secretária logo lhe devotou um olhar sorridente e sedutor,
desusando o recato. Encabulado, respondeu com falsa simpatia e polidez.
Chegara a
sua vez, finalmente. Ela o pegou pela mão e o encaminhou, com olhos fitos nele,
à gerente. Esta, por sua vez, pareceu surpresa, admirada com sua presença e,
imediatamente, para seu estranhamento, pôs-se a tratá-lo com gentilezas
explícitas.
Ela o
ouvia, o ouvia, mas limitava-se a observá-lo em olhar profundo, tão íntimo e
contemplativo que o confundia. Foi quando ela moveu os lábios uma única vez e
sussurrou suspirosa: Já está contratado! Só!
Sem
acreditar, ele perguntou o que iria fazer, qual a sua função, mas ela insistia:
não importava, faria qualquer coisa, ou coisa nenhuma; poderia, se assim o
quisesse, e se não, que não o fizesse... Estava contratado!
Agradeceu
e, quando quis sair, ainda ouviu a insistência da gerente e da secretária:
ficasse mais um bocadinho...
Na rua, deu-se
o mesmo: as mulheres, de todos os lados, miravam-lhe com sorrisos desvelados,
irrefletidos, sem pudores, enternecidos... Esbarravam-se nele, como ao acaso,
como quisessem vê-lo mais de perto, tocar-lhe, senti-lo.
Correu para
casa, trancou a porta e foi ao banheiro. Torceu para que a cunhada ali não
estivesse.
Encostando-se
à pia, teve a conclusiva revelação: ante o armário do banheiro, percebeu que,
ao invés de sua costumeira face, havia apenas um espelho!
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