Na cafeteria, ele a encontrou sentada em um pequeno
sofá, quase que debruçada por sobre a mesa que havia diante dela. As duas mãos
sustentavam a testa escondida por entre fartos cabelos. Ele se aproximou com interesse,
como se a conhecesse, mas isso ele não a revelou: “Está tudo bem com você?”
Ela ergueu
a cabeça lentamente, deixando à mostra um grande galo na cabeça. Os olhos
amiudavam à presença perturbadora de um sol recém-nascido a lhes chegar através
da vitrine: “Muita dor de cabeça.”
Sem pedir
licença, devagar, ele sentou-se à sua frente, deixou os braços ao lado do corpo
e a observou durante largos minutos de silêncio.
“Eu bati
com o carro”, ela disse, hesitante. Reprimia o choro. Mantinha a cabeça baixa: “Estava
escuro... e eu tonta. Sentei-me aqui.”
Lançando palavras
enevoadas, falou que tentara ligar para a mãe, mas ela não atendeu. Tinha muita
sede, mas nenhum garçom aparecera: “Pede uma água para mim? Minha cabeça dói...”
Ele chamou
um garçom distraído ao fundo da cafeteria vazia. Pediu-lhe um copo de água: “Conte-me,
como foi esse acidente?”
Não se
lembrava. Era tarde da noite. Fora na rua, ali em frente. Subira a calçada. Não
dava para ir à sua casa daquele jeito. Entrou na cafeteria para sentar-se um
pouco, descansar e tentar chamar a sua mãe: “Nessas horas, ela não atende. Não
atende.”
Ele observou
não haver nenhum celular com ela: “Espere aqui. Vou ver o estado de seu carro.
Como ficou. Talvez possa ajudá-la.”
Logo, ele
retornou à cafeteria. Olhou para a mesa e viu que o garçom deixara o copo de
água, porém ela nem o tocara. Continuava com o pescoço curvado, as mãos na
testa, como da primeira vez.
Sentou-se, agora,
ao seu lado. Esperou que levantasse a vista, mas ela continuou inerte, numa cisma
comovente. Por conta dos cabelos, só lhe era possível perceber os lábios
trêmulos. Ele sussurrou ao seu ouvido: “Eu nem sei como lhe dizer isso, mas
acho que você morreu.”
Por alguns
poucos minutos, ela ficou imóvel e muda. Depois, lentamente, tirou as mãos da testa
e virou-se para ele. Trazia o olhar translúcido, perdido: “Foi o acidente? Não
tem jeito?”
Embargando
a voz e disfarçando o abalo, meneou levemente a cabeça e quis abraçá-la. Ela se
esquivou dele. Colocou a mão na testa: “A dor... ela passou. Não sinto mais.
Não sinto mais nada.”
Olhou para
cima, para os lados e apertou os braços cruzados ao peito: “Que lugar é esse?”
Voltando-se
a ele, exigiu: “Um beijo. Eu mereço um beijo. Não quero sair daqui sem um beijo!”
Confuso e
sem pensar, ele tentou lhe dar o seu melhor beijo, mesmo quando nauseava diante
do intenso gosto de sal que lhe tomava toda a sua boca.
Nenhum comentário:
Postar um comentário