Nicolas Behr, Ana Miranda, Raymundo Netto,
Pedro Salgueiro e Tércia Montenegro
Pedro Salgueiro e Tércia Montenegro
O escritor
argentino Jorge Luís Borges nos deixou, num pequeno manual de zoologia
fantástica, um dos trechos mais tocantes de sua obra. Ele imagina a primeira
vez em que uma criança é levada a um jardim zoológico e, estranho, essa
criança, que pode ser qualquer um de nós, irá esquecer esse momento tão
fundamental para a sua consciência e o seu espírito.
É um jardim
impressionante, diz Borges, em que surgem animais como jaguares, abutres,
bisões, ou o mais belo e altivo do reino animal: a girafa. Borges não menciona,
mas logo nos lembramos de elefantes, macacos, hipopótamos, tatus, onças negras,
lobos, borboletas, siriemas... cada um desses animais, uma surpreendente,
encantadora, ou divertida figura. Quase um sonho, quase um absurdo da
imaginação criadora da natureza. Urros, uivos, rugidos, pios, cantos, odores,
saltos súbitos, rufar de asas... E esse espetáculo que poderia causar medo à
criança, no entanto, é apreciado, e tão apreciado que ir ao zoológico é uma
diversão infantil.
Por que as
crianças não têm medo nos jardins zoológicos? Pergunta-se Borges. Talvez porque
elas já tenham visto os animais nos livros, nos brinquedos de pelúcia, nos
filmes. Porque os pais as levam pelas mãos e as crianças confiam nessas
indicações silenciosas. Talvez porque a criança seja, por definição, um
descobridor, e descobrir o camelo não é mais estranho do que descobrir o
espelho, a água, ou as escadas, diz Borges. Confirmando as palavras do escritor
argentino, não me lembro de minha primeira ida ao zoológico, em minha infância.
Mas lembro de levar meu filho, meus netos, e do encanto arrebatador que eles
sentiam ao descobrirem os animais. E ver, e rever, e rever infinitamente.
Os
zoológicos não são mais vistos com bons olhos, ali os animais vivem em
cativeiro, fora de seu habitat, subjugados pela raça humana... Mas aqui em
Fortaleza há um zoológico educativo. É o Ecopoint
Parque Ecológico. Levei duas vezes os meus netos lá, com uma criançada da
Prainha. E agora, tempo de férias, é um programa imperdível para os pequenos
descobridores. E para os pais e avós, com o pretexto de levar as crianças.
Alguns
animais ali também estão em jaulas, ou viveiros, mas há uma diferença: o
Ecopoint recebe animais silvestres apreendidos pelo Ibama ao tráfico, em comércios
irregulares, denúncias de maus tratos, também animais perdidos na cidade, ou
mesmo de outros zoológicos onde não podem mais cuidar deles. Esses bichinhos,
quase sempre maltratados, doentes, famintos, são entregues ao Ecopoint, e
recebem cuidados de veterinários, biólogos, tratadores, até se restabelecerem.
Se voltam às condições naturais, são devolvidos ao seu habitat, libertados. Se
não, passam a morar no Ecopoint. Ali estão espécimes de corujas fabulosas de
olhos imensos, da arara-azul, que é a mascote do lugar, papagaios espertos, o
severo gavião, as engraçadas capivaras, os divertidos macacos, as fascinantes
onça-pintada e onça-parda, iguanas contemplativas... Todos animais brasileiros,
alguns exclusivos das nossas caatingas, uns ameaçados de extinção.
A história
desse lugar começou nos anos 1930, quando o senhor Franz Wirtzbiki adquiriu um
sítio, ali no bairro de Jóquei Clube. Chamou-o de Gluck-Auf. Na região onde Wirtzbiki passou a sua infância, na
Alemanha, a expressão era usada para receber os mineiros que retornavam do
fundo da terra. “Feliz regresso!” Nem todos conseguiam voltar à superfície, e o
menino guardou esse sentimento na lembrança. Homenageou os antepassados
batizando o estimado sítio com a expressão de esperança. Os descendentes de Wirtzbiki
honraram sua memória criando um instituto ambientalista, chamado Aba-Yby –
homem-terra em tupi – e no sítio funciona o criadouro conservacionista
Ecopoint.
É agradável
o lugar, cheio de gramados, samambaias, árvores refrescantes e belas. Há
parquinhos, fazendinha, arvorismo, cascata, aldeia indígena... Bichos soltos,
como pavões, patos, marrecos... Crianças por todo lado, em famílias, grupos, ou
excursões escolares, assistem ao espetáculo da desatinada variedade do reino
animal, e ali são elas mesmas um espetáculo de sonhos e fantasias. Ali talvez
aprendam a amar os animais. Decerto vão fazer descobertas. Mesmo adultos podem
ter surpresas. Foi ali que vi, pela primeira vez, a jandaia, ave que é símbolo
do Ceará. Eu a conhecia apenas da frase de Alencar sobre a terra natal, “onde
canta a jandaia nas frondes da carnaúba”. Ali, a jandaia tornou-se realidade,
toda colorida, linda, dando seus chamados estridentes.
(*) Raymundo Netto: Uma coisa que a Ana, creio, não sabe, é que a Rachel de Queiroz, novamente ela, ainda jovenzinha, visitou várias vezes o local do Parque Ecopoint. Morava não muito distante (no denominado Pici), e seu pai, Pedro, era amigo de Franz Wirtzbiki. Rachel gostava de ouvir o velho alemão e ao tornar-se adulta, quando de seu casamento, o convidou para ser seu padrinho na cerimônia.
(*) Raymundo Netto: Uma coisa que a Ana, creio, não sabe, é que a Rachel de Queiroz, novamente ela, ainda jovenzinha, visitou várias vezes o local do Parque Ecopoint. Morava não muito distante (no denominado Pici), e seu pai, Pedro, era amigo de Franz Wirtzbiki. Rachel gostava de ouvir o velho alemão e ao tornar-se adulta, quando de seu casamento, o convidou para ser seu padrinho na cerimônia.
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