—
Vinte anos de saudades, amiga —.
Por que
temos que guardar o segredo de uma história sempre para o final? — não seria
melhor nos livrarmos logo dele; aí então o relato fluiria de maneira mais
honesta e tranquila, sem o trunfo incômodo de um mistério apenas conhecido por
nós!?
Sempre me
impressionaram os que começam seus enredos desvendando esse enigma: tiram um
peso das costas, desprezando assim toda a nossa ansiedade — jogam as armas
fora, lançam-se de peito aberto ao leitor. Torna-se, então, mais difícil
construir uma aventura abrindo mão deste trunfo?... Não temos nada além das
palavras, a não ser a própria aventura, e o nosso pouco talento.
A verdade
é que decidi dizer logo que Suely morreu — e morreu de morte besta, dessas que
não se encontra justificativa senão no acaso, ou no destino, ou… Sabe-se lá o
que rege o mundo. Terminou os estudos, casou, teve dificuldades financeiras,
mudou-se junto com o marido para uma terra distante. Todo mês a cartinha certa
aos pais, o papel embebido em lágrimas — a promessa constante de uma visita no
fim do ano. Não fosse o implicante destino.
Uma
festinha de aniversário, uma briga louca de bêbados na calçada, um tiro errado
e uma bala na nuca; logo a dela. Sexta à noite. Telefone deixando recado para
os pais. Arrodeios, depois a notícia triste. Providência dos amigos. Vaquinha
para o avião. Embalsamado o corpo — hospitalizado o sogro. Domingo de noite o
corpo chegando (a promessa finalmente cumprida), a cidadezinha inteira
acordada, desmaios, sofrimento prolongado. Segunda-feira pela manhã o caixão na
cova. As lágrimas finas sem serventia. O cansaço, a casa vazia, um silêncio
fundo: essa mistura de frustração e revolta. Tarde dessa mesma segunda: a carta
inesperada. O carteiro, também, incrédulo. Olhos nas janelas. O choro
recomeçado, sem fim, a imagem do Coração de Jesus no abraço apertado da mãe.
Carta,
sim! Remetida por Suely — a última, feliz, desta vez perfumada, prometendo a
eterna visita no fim do ano, dizendo da gravidez —, que a pôs nos correios na
sexta pela manhã. No final até consola a mãe da doença grave de uma vizinha:
sofresse não, a vida era assim!
A carta,
pois, remetida na sexta pela manhã: Recebida na segunda à tarde.
Antes
dela, Suely.
Prezado Raymundo
ResponderExcluirQual o seu e-mail,pois preciso lhe enviar uma
nota.
Abraço.
Waleska Frota.
raymundo.netto@gmail.com
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