Banda The Clevers, numa festa de São João na TV (divulgação)
Anavã! Chegamos a junho, mês em que aconteci
neste mundo, no meio do caminho, feito Pedro, ligeiro e cianótico, fugido de
Natal, dependurado no bico de cegonha trapalhã e berrando: “Eu quero nascer é no
Ceará!” Por isso, de não conhecer na Terra nada que me papoque mais as
lembranças do que festas juninas, balõezinhos chineses, barraquinhas de palha
de coqueiro, o cravo tinindo na castanha do pé-de-moleque ou a voz ecoada do
Gonzagão em pagode russo na boate Cossacou: “Foi numa noite/igual a esta/que tu
me deste o teu coração./ O céu estava/todinho em festa/ pois era noite de São
João.”
Hoje, a cultura invasiva da sociedade do
espetáculo sapucaicou as nossas festas, que deperecem ao afetado glamour e ao
som de axé ou forró de plástico, que nem de longe imita o que nos fere a
saudade.
Por outro lado, dia desses, ao me
encostar em mesinha de plástico, numa praça em areias na rua do Sabão, onde se
dava uma quermesse de igreja, olhava para o cimo céu estrelado de bandeirinhas
coloridas de papel, e recordava a animação dos bairros de uma Fortaleza
interior, quando os jovens se aproveitavam das festividades para escolher como
par de quadrilha aquele ou aquela a quem o peito devotava gemidos de paixão, mas
era desencorajado de se achegar. Nos dias de ensaio e de preparação, porém, estariam
juntos, mesmo que disfarçando o ribombar da emoção e o desafino típico de
primeiro amor, mas de nunca sentir tanta alegria, cortando papel de seda de
cor, colando com grude de panela bandeirinhas no barbante de corda, pedindo
pelamordedeus que a mamãe não esquecesse de emendar aqueles retalhos na calça e
na camisa ou mesmo de costurar o vestido florido de chita.
Afinal, o dia da festa, foguetório no ar:
a rua de pedras toscas tomada de barraquinhas de jogos e tabuleiros de paçocas,
baião de dois, espetinhos, vatapá, bolos, refrescos e aluá. A fogueira de lenha
estalando calores nos olhos curiosos da meninada e os quadrilheiros chegavam: as
“damas” com vestidos de babados e tranças caídas em fita nos ombros, e os “cavalheiros”,
sob chapéus de palha, ao pescoço lenço de cor, em camisa e calças rotas,
bainhas tortas e alpercatas de couro. Encontravam-se os pares a ensaiar um
passo diferente de “motocicleta”, “cavalo” ou “aleijado”. A moça, mais ousada,
pintava a lápis o bigode, a costeleta, o cavanhaque no par desajeitado. Ele, a
pretexto de lhe tocar o rosto, ali pintava uns três ou quatro pontos negros, deitando
o olhar já cativo àquele sorriso que lhe parecia feito de luar.
Vinha lá o pai Francisco tocando o seu
violão bi-rim-rim-bão-bão e o seu
delegado. Após o casório, a quadrilha começava com anavãs, anarriês, balanceio,
serrote, túnel, parafuso e passeio: “Lá vem a chuva!” “Olha a cobra!” As
senhoras alimentavam de gás os candeeiros, enquanto o sanfoneiro, no resfolego
do seu fole de oito baixos, convidava para o rapapé no salão, que ameaçava ir
até amanhecer e a palha voar. Enquanto o cavalheiro, com o coração molinho,
molinho, despontava um inocente “Olha pro céu, meu amor, veja como ele está
lindo...”, sendo acolhido por um beijo de assalto “tão bonito e tão sincero
feito festa de S. João”.
Esse neto do seu Raymundo e suas crônicas deliciosas feito festas juninas das antigas.
ResponderExcluirAssinado; Tião Ponte
Puxa vida. Fiquei agora tão empolgada quanto era menina, na rua da Aerolândia, pulando fogueira, comendo batata doce no dia seguinte que ficou na brasa da fogueira. As festas juninas pra mim são os primeiros anos, em que apesar de muitas dificuldades, ser menina representava muita esperança de mudança na vida.
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