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Confesso (e não é
força de expressão) que perdi a conta dos prefácios e introduções que escrevi
para livros de escritores de nossa terra, mortos e vivos.
Mas revelo que é sempre
com prazer que recebo o convite de um escritor para apadrinhar um novo livro
seu. Raymundo Netto, que conheci em 2005 numa viagem a Aracati, é autor de dois
ou mais livros de ficção e cronista d’O
POVO, o “mais tradicional e antigo (em exercício) jornal do estado do
Ceará”, como ele orgulhosamente lembra. E é justamente uma seleção das crônicas
desse periódico o livro que se vai ler.
Estive quase para dizer ao
meu amigo que Crônicas Absurdas de
Segunda dispensam qualquer apresentação, principalmente minha, mas, para
ser sincero, aqui se juntaram a honra do convite e o fato, nada despiciendo
(que passe a palavra), de se tratar de textos que falam do Ceará e, bem ou mal,
meu nome estar ligado à literatura cearense.
É interessante a maneira como
o escritor trabalha com autores vivos e com autores mortos, indistintamente.
Claro que não falarei aqui de
todos os autores que são personagens deste livro, mas Rachel de Queiroz, com
quem tive o prazer de estar diversas vezes, hoje habita, em bronze (será
bronze?), um banco na praça General Tibúrcio, ou praça dos Leões, pertinho da
Academia Cearense de Letras.
Lembro Quintino Cunha, que
não alcancei (ele se foi quando eu tinha cinco anos de idade) e que Raymundo
homenageia com rara felicidade, aproveitando trechos das famosas anedotas do Quintino, nem todas
referendadas pela Lourdite Cunha, filha mais velha do poeta, orador e boêmio.
Meu saudoso amigo e mestre
Moreira Campos não poderia ficar de fora, e o cronista o ressuscita
literariamente, dando-lhe o destaque que ele merece como grande contista, o
maior da nossa terra, a meu ver.
Milton Dias, nosso cronista
maior (pelo menos na minha opinião), escritor que por mais de vinte anos
iluminou com sua verve as páginas do mesmo citado jornal, é lembrado comme il faut. É louvável a lembrança de
Netto pelo fato de Milton não ter sido em nossos dias, a meu ver, homenageado
como merece por sua personalidade e por sua obra.
Sou obrigado a confessar que
me comoveu profundamente o texto focalizando José Alcides Pinto, esse um amigo
querido, poeta e ficcionista, com quem eu tinha um pacto do qual não me
envergonho: se alguém falasse mal de mim em sua presença, ele me contava,
fazendo eu o mesmo se eu ouvisse alguém falando mal dele...
E Demócrito Rocha, e Eduardo
Campos, e Francisco Carvalho! Quanta gente que se foi e que entretanto palpita
cheia de vida nas crônicas de Netto!
Minha comoção maior ocorre
por conta da crônica falando do livro
Dolentes, de Lívio Barreto, cuja terceira edição, preparada por Raymundo
Netto para a Secretaria da Cultura do Estado do Ceará, teve uma segunda tiragem
para corrigir erros de digitação. O cronista tratou essa edição com todo o
carinho e foi, ele mesmo, fazer o lançamento do livro em Granja, terra do
poeta. No livro está reproduzida a introdução que escrevi em 1970 para a edição
do Centenário do autor, a pedido de Raimundo Girão e de Braga Montenegro. E
Raymundo reproduz, na abertura do livro, um fac-símile da folha de rosto da
edição príncipe, de 1897, que guardo com carinho, presente que foi da
professora Maria da Conceição Souza, minha amiga.
Lívio Barreto foi tema do
primeiro artigo que escrevi sobre escritor cearense, e ocupa cerca de 15
páginas de Poesia de todo o tempo, na secção “O Livro de Clã”, estampado no nº
24, de revista, em 1968, quando eu tinha 30 anos de idade. Em 1970, sairia como
livro autônomo.
Nos anos 60 do século
passado, como revisor d’O Estado de S.
Paulo, convivi com Lívio Xavier, sobrinho do poeta, e aqui vim a conhecer
mais dois outros sobrinhos, dona Líbia Xavier e Emanuel Xavier.
Para encerrar, direi que meu único filho chama-se Lívio,
claro que em homenagem ao poeta cujo livro já afirmei ser “o livro máximo do
Simbolismo no Ceará...”
Disse que Raymundo contempla mortos e vivos, e aqui
desfilam escritores atuais e atuantes, como Angela Gutiérrez, Horácio Dídimo,
Pedro Salgueiro, Ana Miranda, Socorro Acioli, Jorge Pieiro e outros mais.
Há até uma crônica na qual
Netto reinventa “a verdadeira história da Padaria Espiritual”, com a
participação de vários escritores atuais, inclusive eu, e... Antônio
Sales! Quando essa crônica foi estampada
no jornal, Noemi Elisa Aderaldo, presidente da Comissão de Redação da Revista da Academia Cearense de Letras,
sugeriu sua inclusão num dos números desse periódico, o que foi feito...
A presença do meu nome, mais
de uma vez, neste livro, é apenas mais uma prova da amizade que me liga a
Raymundo Netto, o que muito me honra.
Sânzio de
Azevedo (na Apresentação da Obra)
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