Quem o visse chegar ali, caminhando a
passos frouxos e profundos, teria a segura impressão de que estava a entregar o
pescoço à forca. Mas não ele. Não o Eugênio.
Sabia-se lá, mas cruzava o extenso
balcão do cartório numa tristura medonha, maior do que a de uma noite sem
novela.
"O que o senhor deseja?"
Vinha registrar um filho, mais um
último, pois o mais velho dos três também o seria, assim como o segundo ou como
este, e, provavelmente, o próximo.
Recebeu parabéns de um ou de outro circundante:
"Um filho! Que graça. Um filho!" O mais idoso tapou-lhe nas costas a
benção recebida do Grande Pai Celestial. Porém ele nem nem. Tinha pressa.
Registrar a criança e se mandar logo dali.
"Qual será o nome da criança,
senhor?"
Eurrico!, foi o que respondeu. Assim, na
bucha.
"Eurrico? O senhor tem certeza,
senhor?"
Absoluta. Ele era Eugênio, não queria
isso para a criança, que o bichinho não tinha culpa. Culpa mesmo – enfatizava
com o indicador erguido solene no ar – era da mãe. Ali, todos sabiam... era da
mãe!
A atendente, sem entender bulhufas
daquele discurso, tentou contornar:
"Bem, o senhor não prefere, ao
invés de... Eurrico, Eunício?"
Eunício? Deus o livrasse. Que nome
terrível! De jeito nenhum.
Eugênio trazia no peito franzino o
orgulho de criança. Gostava de ler desde cedo. Inteligente. Um gênio de
verdade. Seus pais nunca tiveram problema com ele. Nunca pediu nada demais.
Tudo suficiente, até na respiração. Costume que carregou por toda a vida, numa humildade
e modéstia de fazer vergonha.
"Quem se abaixa muito, mostra o
fundo das calças", dizia a sua avó, impressionada como ele não havia sido
engolido pelo mundo, monstro sedento de gente direita para arruinar.
Mas Eugênio, porque ninguém o notara, vingou,
cresceu, enamorou-se pela primeira mulher a olhar para sua testa rala e casou-se.
Ademais, aquela mulher, provavelmente uma resignada, era bonita. Ninguém, nem a
sua própria mãe, entendia como aquela moça jeitosinha dera cabimento ao sem
graça do Eugênio que, é claro, na sua inutilidade existencial e contagiosa,
acabou por enfear-lhe a vida e a figura.
Restava-lhe um emprego chinfrim, um
ganho de nada, trabalho excessivo e o não reconhecimento, o que o deixava
deveras arrasado nos poucos momentos de folga que tinha, nos quais passava
horas e horas parado, feito estátua de ilustre desconhecido, assistindo à vida
que passava em torno de si. Assim, pensava: de que adianta ser gênio? queria
mesmo era ser rico. Bom mesmo era ser rico. Encucado com isso, botou pra fora a
entranha quando aquela estranha lhe perguntou:
"Qual será o nome da criança, senhor?"
Hã... o nome... deixasse ver... Eurico. Seria
esse: Eurico!
"Eurico de quê?"
De merda.