Se hoje gasto pouco
tempo com exercícios físicos, houve uma época em que eu era sedentaríssima.
Quando lecionava em colégios, tinha de trabalhar tanto, e num ritmo tão
alucinado, que não me restavam forças para qualquer movimento nas horas vagas.
Eu tentava me iludir, acreditando que o desgaste da profissão queimava calorias
– mas o fato é que bater palmas (para pedir silêncio aos alunos), andar para lá
e para cá durante as aulas, gesticular e escrever na lousa não são um
programa de exercícios completo. Como resultado, constantemente eu adoecia,
sentia-me exaurida e pálida, enquanto ativava a imaginação (ao menos, essa!)
para pensar nas modalidades esportivas que jamais conheceria.
Via-me com equipamentos de alpinismo, esqui ou mergulho, e às vezes inventava a
sensação de lidar com bolas de tênis, vôlei ou basquete. Nos dias mais
cinzentos, desejava patins para dança no gelo. Gostava especialmente da ideia
de me tornar amazona, galopando por hípicas intermináveis – ou, talvez, eu
pudesse ter sido uma ginasta, flexível e rápida. Todas essas versões utópicas
de minha identidade eram motivadas por atividades físicas que nunca tive.
Mas não pense o leitor que foram apenas esportes de inverno ou caros que me
fugiram do alcance. Um simples passeio de bicicleta ainda é para mim algo
inviável! Minhas intenções de equilíbrio são sempre vencidas pela atração
gravitacional, e por mais que eu me esforce não há jeito. Já me conformei com a
hipótese de um carma ou maldição – até porque outro dia sonhei que de novo
nascia, e o médico segurava minhas perninhas de bebê e fingia dar umas
pedaladas. Depois ele ria como um psicopata, dizendo: “Rá-rá-rá, essa aqui
nunca vai aprender!” Classifiquei a imagem como sonho, mas agora estou pensando
se não sofri uma regressão e recuperei uma incrível memória dos tempos de
infância...
De qualquer modo, se hoje eu pudesse escolher, de imediato me entregaria à
esgrima – pelo prazer de usar máscara, luvas e colete protetor. E erguer um
florete, acima de tudo: palavra que é delícia e perfume desde os tempos em que
li “O chamado”, da Lygia Fagundes Telles. Nesse texto, a escritora (que se
formou em Educação Física) fala da disciplina e da rapidez que o esporte lhe
ensinou. Porque a esgrima – exatamente como a ficção – consiste em avançar
veloz, para atingir um coração exposto.