quinta-feira, 29 de setembro de 2011

"Gentilândia Sitiada", crônica de Pedro Salgueiro para O POVO (28.9)


Estádio Presidente Vargas, o PV, nos anos 40

Faz três anos que voltei a morar na Gentilândia (capital do Benfica), já havia residido por sete anos aqui na época em que eu era estudante. Peguei nestes dez anos um amor pelo bairro, principalmente pelo charme de ser um reduto boêmio, de muita diversidade cultural. Um recanto da cidade que cheira a juventude, a movimento estudantil, a futebol, devido principalmente à presença da Universidade Federal do Ceará (e seus vários equipamentos, como Museu e Rádio Universitários, Casas de Cultura, além dos inúmeros cursos de humanidades), Escola Técnica Federal (que todo ano muda de nome e sigla), Ginásio de Esportes Aécio de Borba e Estádio Presidente Vargas (o charmoso e querido PV).
A pracinha da Gentilândia é o coração do Benfica, o local para onde tudo (de bom e de ruim) do bairro conflui... Tudo mais cedo ou mais tarde acaba sempre na pracinha: manifestações culturais e políticas e (naturalmente) seus diversificados lazeres.
Acontece que diferentemente de outros bairros, a população deste essencial reduto de Fortaleza é, em sua maior parte, flutuante. São os milhares de estudantes (professores e funcionários) da universidade, da escola técnica e de inúmeros colégios públicos e particulares, são ainda outros milhares de desportistas que em pelo menos duas vezes por semana invadem suas ruas, são centenas de boêmios que se espalham diariamente pelos infinitos bares.
Então a população do bairro não é somente a que reside (como eu e quase toda a minha família) nele, e sim uma multidão de moradores de outros sítios, que frequentam suas ruas de madrugada a madrugada nos sete dias da semana.
Outro fator fundamental para entender a quantidade de problemas que assolam o bairro e que o fazem ser hoje um dos mais violentos (em assassinatos e assaltos e distribuição de drogas) de nossa capital. Ele fica entre duas áreas pobres da cidade: o Jardim América (e suas diversas favelas) e os inúmeros becos da Marechal Deodoro (ambos redutos de muitos trabalhadores pobres, mas também de bandidos, traficantes, assassinos etc. etc.).
Pois bem, juntemos os pacatos moradores deste aprazível bairro, a enorme população flutuante de boêmios, estudantes, trabalhadores e desportistas que o frequentam, e temos o prato suculento e ideal para os (também) muitos que querem roubar, assassinar e distribuir drogas.
Em resumo: as autoridades não podem tratar um bairro com estas características como se fosse um bairro qualquer, não podem deslocar seus muitos agentes (de trânsito e de repressão) levando em conta apenas os números de seus moradores (e principais vítimas de tudo de ruim que acontece atualmente aqui).
Resumindo mais ainda (suas burras autoridades): este bairro não é somente este bairro, 90% dos frequentadores deste sítio são de outros locais, então a violência é também multiplicada por mil.

Cuidar do Benfica é cuidar de quase toda a nossa capital, a nossa querida loirinha desmiolada pelo sol.
***
O Benfica, a Gentilândia pedem socorro!!!!!!!!!!

Fonte: "Movimento Esperado", blogue de Pedro Salgueiro 


"Contra o Suicídio", Terça Montenegro para O POVO (28.9)



A imprensa não costuma noticiar mortes por suicídio. Tal aspecto, por um lado, é sinal de respeito para com a família enlutada, que certamente não precisa de holofotes midiáticos sobre si, naquele momento. Por outro lado, o silêncio é também uma medida de preservação da vida, se pensamos que certos imitadores podem achar que se matar virou uma espécie de moda, propagada pelos veículos de comunicação. Afinal, dizem que depois que Werther (personagem de Goethe) deu cabo da própria existência, houve uma imensa adesão de fãs, buscando copiar aquele destino trágico... Há ainda o fato de que o suicídio permanece sendo um tabu, no sentido religioso e em vários outros aspectos. Silenciar, então, parece uma boa saída para não criar polêmicas ou problemas.
Quando acontece, porém, de uma pessoa famosa se matar, não se pode evitar a notícia – embora ela deva ser transmitida com cautela. Um “disfarce da situação” seria desastroso e, a longo prazo, uma falsidade histórica. Foi pensando assim que, outro dia, estava com o amigo Urik Paiva (que é especialmente imaginativo) desenvolvendo esse tipo de suposição. Imaginamos que se instalava no mundo uma paranoia do termo “suicídio”. Isso chegava a tal ponto que as divulgações dos óbitos passariam a ser distorcidas, com elementos fantasiosos para negar os gestos voluntários. Assim, por exemplo, a poetisa Ana Cristina César, que se jogou de um edifício da década de 80, poderia ser computada como uma vítima de acidente com bungee jumping. Sylvia Plath, escritora que abriu o forno e pôs a cabeça lá dentro, na verdade teria escorregado em batatinhas enquanto cozinhava e – plath! – caiu no chão, fraturando o crânio.
 Nessa linha de raciocínio, o afogamento de Virginia Woolf também surgiria como uma fatalidade. Diriam que a romancista inclusive era exímia nadadora e costumava atravessar metros do rio Ouse todas as tardes – infelizmente, naquele 28 de março um polvo gigantesco surgiu e laçou as pernas da escritora, arrastando-a para as profundezas da água. 
O autor japonês Mishima tampouco teria cometido haraquiri, mas sua morte foi resultado de uma brincadeira desastrosa, com a faca usada para limpar o peixe. E Hemingway jamais atirou contra si mesmo; ao contrário, foi alvejado por um colega caçador (que não estava tão camuflado quanto ele), num safári.
A lista de hipóteses cresce para além dos literatos, e de repente nos damos conta da enorme quantidade de suicidas famosos. O espaço para este texto chega ao fim, mas a imaginação, claro, nunca acaba. Nosso exercício de censura ao suicídio passa pelo riso porque divertir-se talvez seja a melhor maneira de sentir-se vivo.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Airton Soares e "Cuide Bem do seu Jardim" no projeto Bazar das Letras do SESC (27.9)


Clique na imagem para ampliar!

O convidado desta edição do Bazar da Letras, Airton Soares, nasceu em Ipu, Ceará.
Phd – Poeta, Humorista e Didata
É formado em Letras, e se especializou em Literatura Brasileira.
Publicou: O mundo fora de esquadro.
Há 20 vinte anos ministra cursos e palestras, para empresas e estudantes, nas áreas de Recursos Humanos, Comercial e Administrativa usando como metodologia o Teatro Empresarial

domingo, 25 de setembro de 2011



Quando o Amor Vacila

Eu sei que atrás deste universo de aparências,
das diferenças todas,
a esperança é preservada.

Nas xícaras sujas de ontem
o café de cada manhã é servido.
Mas existe uma palavra que não suporto ouvir,
e dela não me conformo.

Eu acredito em tudo,
mas eu quero você agora.

Eu te amo pelas tuas faltas,
pelo teu corpo marcado,
pelas tuas cicatrizes,
pelas tuas loucuras todas, minha vida.

Eu amo as tuas mãos,
mesmo que por causa delas
eu não saiba o que fazer das minhas.

Amo teu jogo triste.

As tuas roupas sujas
é aqui em casa que eu lavo.

Eu amo a tua alegria.

Mesmo fora de si,
eu te amo pela tua essência.
Até pelo que você poderia ter sido,
se a maré das circunstâncias
não tivesse te banhado
nas águas do equívoco.

Eu te amo nas horas infernais
e na vida sem tempo, quando,
sozinha, bordo mais uma toalha
de fim de semana.

Eu te amo pelas crianças e futuras rugas.

Eu te amo pelas tuas ilusões perdidas
e pelos teus sonhos inúteis.

Amo teu sistema de vida e morte.

Eu te amo pelo que se repete
e que nunca é igual.

Eu te amo pelas tuas entradas,
saídas e bandeiras.

Eu te amo desde os teus pés
até o que te escapa.

Eu te amo de alma para alma.
E mais que as palavras,
ainda que seja através delas
que eu me defenda,
quando digo que te amo
mais que o silêncio dos momentos difíceis,
quando o próprio amor
vacila.

http://www.vagalume.com.br/maria-bethania/quando-o-amor-vacila.html#ixzz1Z08Cc600

"Verdade Inventada", crônica de João Soares Neto para O ESTADO



Com uma semana de antecedência ela comemora a sua data. Tem pressa para viver no presente. O passado está emoldurado. E o faz cercada da família, das filhas meninas, de um batalhão de colegas e amigos que a acompanham desde o “Canarinho”, o “Santa Cecília”, o “Batista”, “Boca Ciega” e a UECE.
Como defini-la? alegre, irreverente, avant-garde, comunicativa, derramada, afetiva, curiosa, corajosa, calorosa, inteligente, braba, meiga, chorona e beijoqueira.
Nasceu em uma sexta-feira, o dia em que todos se preparam para a festa que é o fim de semana. Ela foi à festa. Primogênita em série que a sucedeu com o mesmo calor, amor e carinho. No seu convite, cita, de forma resoluta, Clarice Lispector: “Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada”. Parece que acertou em cheio. Sua vida é verdade inventada por ela mesma, sem palpite de pai ou mãe.
Fui, além da mãe e da equipe médica, o primeiro a vê-la e beijá-la. Que nome dar a ela? Havia comprado um livro com centenas de nomes, mas nada ficara decidido. A mãe, pressurosa, sugeriu o nome de uma czarina russa. Assim ficou. Como pai-coruja já estava escrevendo deslumbrado no seu livro do bebê. Depois, abreviei o nome, de forma mais conexa.
Primeiro dia de aula. Lá fomos, a mãe e eu, levá-la ao maternal. Haja choro. Nós acabamos chorando, também. Depois, veio a adaptação e a formação de laços de afeto com os coleguinhas. Acontece que a vida não produz só flor. Dizia o doce Vinícius que “filho é uma raiz de dente exposta”. Passamos sete dias em Belo Horizonte. Legal. Findo o maternal, era hora de procurar colégio novo, maior e adequado para o seu perfil. Vai para o Santa Cecília onde esteve por anos. Fazia parte do processo. E a menina recebeu, com alegria, a chegada das irmãs, uma, duas e três. A última, por mãos da natureza, nasceu no mesmo dia que ela, por conta de uma casa de bonecas.
Começam as aulas de balé, aprender a nadar e o inglês. Festivais, carnavais e que tais. A casa de praia nas férias em que ficávamos brincando e recebendo amigos. Quebra um braço e lá se vai o fim de semana para o ar. Chega a puberdade, florescem dúvidas, abrolha a angústia. Nós, atentos e confusos, sem saber como lidar com as mudanças advindas para todos. Surge a ideia do intercâmbio nos USA. Viajo como destacamento precursor, para ver escola, conversar com a direção e acertar, com os tios, a estada. Levei e voltei com duas, carro atulhado, pois a segunda a acompanhava. Fez amizades com colegas e uma delas deve estar agora na festa de que falei no primeiro parágrafo. Choro em rodoviária. Termina o colégio e entra direto na Universidade Estadual do Ceará.
Lá do outro lado da cidade, todos os dias. Mesmo com resmungos, ups e downs, termina o curso sem problema. Resolve estudar teatro e participa de curso completo na Unifor. É bom lembrar ter sido sempre a coreógrafa de sua turma. Reunia irmãs e filhos de amigos comuns, montava peças, desfiles e jogos, tudo sob os nossos olhares.
Viajou mundo afora. E a moça quis casar. E assim o fez, como quis, concebendo duas belas filhotas. Agora, no limiar da segunda metade do existir, decide, cria, arregimenta família e amigos para um “happening” vespertino com o seu feeling e modo de ser. Parabéns, Deus a abençoe, agora e sempre. Cheiro. Estou por perto. Take care.

"Amor Barato", de Chico Buarque



Amor Barato
(Chico Buarque)

Eu queria ser um tipo de compositor
Capaz de cantar nosso amor
Modesto
Um tipo de amor
Que é de mendigar cafuné
Que é pobre e às vezes nem é
Honesto
Pechincha de amor
Mas que eu faço tanta questão
Que se tiver precisão
Eu furto
Vem cá, meu amor
Aguenta o teu cantador
Me esquenta porque o cobertor é curto mas levo esse amor
Com o zelo de quem leva o andor
Eu velo pelo meu amor
Que sonha
Que enfim, nosso amor
Também pode ter seu valor
Também é um tipo de flor
Que nem outro tipo de flor
Dum tipo que tem que não deve nada a ninguém
Que dá mais que maria-sem-vergonha

Eu queria ser um tipo de compositor
Capaz de cantar nosso amor
Barato
Um tipo de amor
Que é de esfarrapar e cerzir
Que é de comer e cuspir
No prato
Mas levo esse amor
Com zelo de quem leva o andor
Eu velo pelo meu amor
Que sonha
Que, enfim, nosso amor
Também pode ter seu valor
Também é um tipo de flor
Que nem outro tipo de flor
Dum tipo que tem
Que não deve nada a ninguém
Que dá mais que maria-sem-vergonha

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Lançamento "Pela Moldura da Janela e Outras Histórias", de Lourdinha Leite Barbosa (22.9)


Pela Moldura da Janela
& outras histórias
(Topbooks Editora)
de Lourdinha Leite Barbosa
— ganhadora do Edital de Incentivo às Artes da
Secretaria da Cultura do Estado do Ceará –

Data: 22 de setembro de 2011 (quinta-feira)
Horário: a partir das 19h30min
Local: Ideal Clube (Av. Monsenhor Tabosa, 1381, Meireles)
Apresentação da Obra e do Autor: Laéria Fontenele, psicanalista e professora do curso de Psicologia da UFC.

Sobre Pela Moldura da Janela & outras histórias:

 “(...) Este novo livro de contos da escritora Lourdinha Leite Barbosa é fruto de uma ‘brincadeira’ estética que exigiu muito engenho e arte, muito diálogo interno e refinado senso de percepção. Em cada novo conto, transparece sua habilidade de construir personagens, desembaraçar mistérios e desenredar sentimentos. Sua matéria-prima são as vivências e as relações dos sujeitos com seus objetos internos e externos. Lourdinha é capaz de mergulhar fundo para em seguida voltar à tona.(...)”

Beatriz Jucá, na orelha de Pela Moldura da Janela.

Sobre a Autora: Lourdinha Leite Barbosa  é professora da Universidade Estadual do Ceará, mestre em Literatura Brasileira e vice-presidente da Academia de Letras e Artes do Nordeste/CE. Tem diversos contos, artigos e ensaios publicados em antologias, jornais e revistas especializados em todo Brasil. É autora de A Arte de Engolir Palavras e Protagonistas de Rachel de Queiroz: caminhos e descaminhos, além de organizar 100 anos de Rachel de Queiroz: vida e obra (com Cleudene Aragão), dentre outros.

Apoio Cultural
Secretaria da Cultura do Estado do Ceará
Ideal Clube
Academia de Letras e Artes do Nordeste/CE
Topbooks Editora

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

"Coisas Engraçadas de Não se Rir XIII: O verso do espelho", crônica de Raymundo Netto para O POVO (21.9)


Almoçava sozinho no L’Escale, o melhor lugar para almoçar na cidade, claro, depois da casa da sua mãe, quando chegou-me, ante a mesa, um rapaz a estender-me as duas mãos: “Raymundo Netto, leio sempre de você no jornal. Sou seu fã!”
Brinquei com piada velha: Ah, então é você? “Ora, devem lhe dizer isso sempre...” Não, isso nunca aconteceu comigo antes, e digo isto sem folclore. Tem a minha mãe a garantir não haver no Ceará, quiçá no Brasil e nas redondezas, escritor melhor do que eu, embora nunca me leia nada e assine o jornal concorrente. Sabe como é mãe: “Não li e já gostei”.
Sem cerimônia, puxou a cadeira. Sacou guardanapo, caneta e pediu autógrafo. Senti-me o próprio Moacir Franco ou Odair José, de uns 15 anos, em pleno revival. Tirei do cinto de utilidades um “Cadeiras na Calçada” e o dediquei. Ele abraçou o livro: “Essa edição eu não tinha!” Para não esfriar de todo o meu prato, prenunciada a tardança, pedi: falasse algo de si. Não queria. Preferia expor a sua compreensão dos meus textos, compreensão essa largamente estendida. Tudo lhe era suposto, acreditado, evocado e tão ampliado em sua imaginação, de fazer percebê-la bem mais generosa que a minha. “Eu entendi o que você quis dizer quando...” e ria, ria bastante dessas “coisas de não se rir”.
O fato: Eu não queria dizer exatamente aquilo. Poderia. Talvez gostasse até do dizer além, ou não. Escrever é exercício de desconfiança em si mesmo, uma constante autocrítica. O pensamento dando voltas em nossa cabeça até desmanchar-se em letras a unhar o papel. As palavras não se permitem domesticar. São livres e, acima de tudo, libertadoras. A nossa segurança única é o ancorar do ponto final, o fechar da porteira. Demais, ser escritor, em tese, é quase nada. Escrever pode ser, mas ler é muito mais.
Droga, aquele cara era bom! Passou-me pelo lado cafajeste de todos nós a ideia de sugerir a sua inspirada leitura antes de pôr o selo de envio à redação, mas assim nem tinha graça. Acabei por perguntar se escrevia. “Que me dera... Não tenho esse talento.”
Pelo jeito, nem eu. Tento. Um dia aprendo ou tomarei o túnel do esquecimento, em fila epopeica com alguns melhores do que eu, com o consolo do igual deslembramento de minhas falhas, das atrapalhadas histórias nem sempre alegres ou tristes mesmo às minhas janelas.
Como era o seu nome? “Raimundo. Entretanto, Raimundo de pobre com ‘i’ mesmo”. Pobre, dizia, mas fazia questão: pagar-me a conta, mais salgada que o prato, garanto. Não satisfeito, ofereceu-me carona, “podia dizer para onde”, sabia da minha inaptidão ao guidom, dentre outras que citou zombando a valer — nunca de supor minha tragédia tão divertida. Não aceitei. Deus me livre de saber até onde morava. Jamais.
Porém, tomou-me, não tive como evitar, o número do meu celular. Pensei se ligaria, a cada crônica publicada, a me ferir os brios com tudo aquilo de nunca escrito. Ao mesmo tempo, registrado também o seu número, poderia não atendê-lo, e engendrar, a cada ligação, toda a sua literatura presumida. Nós dois, Raymundo e Raimundo, passaríamos a ser ficção de nós mesmos, como duas faces de espelho num jornal, a tentar nos encontrar no pasmo eterno de nosso próprio reflexo.

Raymundo Netto. Contato: raymundo.netto@uol.com.br

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Lançamento "Depois do Sempre", de Alexandre de Lima Sousa (22.9)



Depois do Sempre
(Expressão Gráfica e Editora)
de Alexandre de Lima Sousa
— ganhador do Prêmio Literário para Autor (a) Cearense
Prêmio Caetano Ximenes Aragão, de POESIA, da SECULT/CE —

Data: 22 de setembro de 2011 (quinta-feira)
Horário: a partir das 19 h
Local: Livraria Lua Nova (Avenida 13 de Maio, 2861, Benfica)
Apresentação da Obra e do Autor: Raymundo Netto, escritor e coordenador editorial SECULT.
Para aquisição de livros e contato com o Autor: alexandre76sousa@gmail.com
Organização de lançamento: Dedos de Moça Editora

Sobre a Obra: Recados recebidos das coisas, das instâncias, das passagens e das dispersões. Recados emitidos, retransmitidos, incididos no fora. Rol de atalhos, uma saída, pausa, descontinuando. Cadernos no começo. Em seguida Estado de Sítio. Depois do Sempre é não mais o mesmo gesto e já outro enredo. Terceiro livro de poemas.

Alexandre de Lima Sousa.


Apoio Cultural
Secretaria da Cultura do Estado do Ceará

"Ler ou Não Ler", artigo de Adisia Sá para OPINIÃO de O POVO



Ao preparar uma palestra sobre “Mercado jornalístico regional, em foco o Nordeste”- proferida no Recife (PE) - não nego: tomei um susto.
Embora vivendo no ramo há mais de 50 anos e debatendo o tema em congressos e encontros, os dados que colhi me assustaram. 
O Ceará tem uma população de 8.185.286 pessoas (dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística); espalhada em 184 municípios, com Fortaleza à frente com 3.655.259 de habitantes. Em termos de ensino, o quadro é o seguinte: Ensino superior: seis universidades; um instituto federal e 40 faculdades (Capital e Interior). Municípios que possuem faculdades: Aracati (1) Juazeiro do Norte (3) Crato (1), Milagres (1), Icó (1), Maranguape (1), Quixadá (1) e Sobral (3) e Fortaleza, 25 (Dados: Anuário do Ceará 2011). Ensino Fundamental: 96.534; Médio: 338.729 (Dados: Secretaria de Educação Básica do Estado).
Comparemos esses dados com o número de veículos de comunicação existentes no Estado: três jornais em Fortaleza); no Interior nove (Sobral tem quatro); na Região Metropolitana, dez. Em termos de tiragem creio que os três jornais de Fortaleza não chegam a lançar 80 mil exemplares diários.
Confrontemos, então, os veículos de comunicação existentes na Capital e no Interior, com a população alfabetizada do Estado.
O que procuro demonstrar com isto? Que somos um povo que não lê jornais. Em termos de livrarias o quadro não é menos lamentável. Talvez em Fortaleza não tenhamos meia dúzia de livrarias e sim casas que vendem, grosseiramente falando, livros, não literatura, filosofia, ciências.
Também poderia falar nas vendas em dependências de faculdades, mas o número é irrisório em comparação com a clientela universitária. Em síntese: somos um povo que não lê. Daí porque é lamentável e triste a “conversa” das pessoas (entre si), notadamente os jovens. 
O tema é uma provocação. Eu o assumo.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

"Coisas que deveriam ser distribuídas gratuitamente", crônica de Urik Paiva


Caso você seja portador da síndrome de la Tourette, aquela dos tiques nervosos, pode adquirir em qualquer instituição pública de saúde, e sem ônus financeiro, boas doses de haloperidol para seu tratamento, embora eu deva alertar que as chances de cura sejam nulas (nesse momento, sou eu quem pisco para você). A substância também pode ser utilizada em caso de surtos psicóticos (quem nunca os teve?).
Há, entretanto, outras coisas pelas quais os governos mundiais deveriam isentar a todos de pagar, numa atuação sociopolítica capaz de evitar suicídios, conflitos internacionais, finais de relacionamento, audiência para a TV aos domingos e adesão a instituições religiosas de nomes um tanto exóticos (como a Igreja Evangélica Florzinha de Jesus, de Londrina, Paraná).
Posso começar indicando o plástico-bolha, invenção estadunidense que, primariamente, serve para proteger objetos frágeis em transporte; mas é claro que sua principal utilidade é alentar a população mundial através de seu prazeroso estouro. É de se pensar o efeito que o plástico teria na guerra franco-prussiana ou no controle do ciúme do Bentinho. Caso os Estados passassem a produzir e distribuir o genial invento, o mundo seria um lugar mais zen: torcedores de times de futebol rivais se tornariam praticamente amantes, os muçulmanos deixariam Salman Rushdie quieto e os crimes passionais seriam extintos; sem falar na tranquilidade que tomaria conta das bolsas de valores, tornando-as similares aos templos budistas.
Por falar em silêncio, advogo também a presença, nas vidas humanas, de algo necessário se estamos próximos daqueles sujeitos com posses tecnológicas que não se acanham em pôr à escuta do resto do mundo, em potentes alto-falantes, seu juízo musical: os fones de ouvidos. Se estes forem conectados aos aparelhos emissores do som, reinará a paz. Porque muito provavelmente essas pessoas hão de se irritar com uma simples reprimenda à expressão de seu cânone sonoro, devemos agradar-lhes com um sorriso e um fone de ouvido, se já não houverem ido à procura do seu no órgão de direitos humanos da respectiva cidade (não o sorriso, o fone).
Nesse mesmo rumo, e pensando sempre na manutenção da presença da espécie na Terra, posso aludir aos chapéus, acessórios indispensáveis à interação sexual casual; aos isqueiros, que, mesmo para os não-fumantes, são capazes de garantir o início de uma bela amizade; às coqueteleiras, itens recomendáveis àquelas festas que podem começar com duas pessoas e terminar com o entupimento de uma residência; e aos tabuleiros de xadrez, mais fundamentais ao exercício da mente do que à composição estilística dos indivíduos na moda.
Além do que já foi dito, e assim como ao acesso à educação pública de qualidade, deveríamos ter direito a borrifadores. Neles se pode colocar, por exemplo, água (borrifá-la no pescoço castigado pelo sol de um verão me parece aplacante, bem como chamar a atenção de alguém que está sendo traído pelo cônjuge), azeite (assim você o distribui melhor no prato) e molho de pimenta (para inibir ladrões e assediadores). Só não ameace seu chefe com suco de beterraba.
Para as dores do espírito, para as tristezas infindas, para as dúvidas açoitantes, cada um de nós merecia um gerador químico de oxigênio e uma máscara, qual nos aviões, pois o voo da existência é cheio de despressurizações.
Há muitas outras coisas que poderiam fazer parte da agenda governamental de distributivos, mas para não me alongar infinitamente (não, nossa carência não possui fronteira), citarei apenas as malas, porque devemos sempre estar alinhavados à partida, mesmo que efetivamente não se saia do canto; e as bala de café, que deveriam ser incorporadas à cesta básica; e as lanternas, adequadas à insuportável sensação de interromper uma leitura noturna por conta de um avario no sistema elétrico; e viagens com tudo pago para o Rio de Janeiro; e papeis de carta, porque há muito o que se dizer aos outros; e, caso fosse realmente possível, novos corações: os nossos andam gastos de tanto palpitar.


domingo, 18 de setembro de 2011

"Jovens Artistas e o Novo Mercado da Arte no Brasil", debate na Assembleia Legislativa com jovens artistas (20 de setembro)




Fórum de Ideias Inovadoras em Políticas Públicas – FIP
“A Juventude no Contexto da Vida Contemporânea”
— Jovens Artistas e o Novo Mercado da Arte no Brasil —

Dep. Lula Moraes
Presid. do Conselho de Altos Estudos e Assuntos Estratégicos

João Paulo Cuenca (LITERATURA)
Escritor e romancista. Autor dos romances Corpo Presente (Planeta), O Dia Mastroianni (Vacatussa) e O Único Final Feliz para uma História de Amor é um Acidente (Cia das Letras). É autor do seriado da TV Globo Afinal, o que querem as mulheres? (2010). Participou das antologias Cem Melhores Crônicas Brasileiras, Prosas Cariocas, Contos sobre Tela, Cenas da Favela, Missives – Nouvelles brésilliennes contemporaines e B39 – Antologia de Cuento Latinoamericano.

Narcélio Grud (Artes Visuais)
Artista visual

Analice Diniz (Fotografia)
Jornalista e fotógrafa. Integrante da Rede de Produtores de Fotografia do Brasil.  
Coordenadora da escola Travessa da Imagem, em Fortaleza.

Ivan Ferraro (Música)
Músico, produtor cultural, presidente da PRODISC, membro do CNPC, consultor para o SEBRAE, coordenador da Rede Ceará de Música.

Dellano Rios (mediação)
Jornalista, editor do Caderno 3 do Diário do Nordeste


Data: 20 de setembro de 2011, às 9horas.
Local: Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (auditório das Comissões)
Informações: 3277.3704/3277.3740

Sobre o Fórum: A juventude é uma construção do século XX e guarda estreitas relações com muitos aspectos e fatos deste período histórico.
Essa experiência mobilizou reinvenções em muitos espaços. Novos mercados, novos conhecimentos, outras formas de arte, de comunicação e de política. Cabem muitas coisas dentro dessa complexidade. Mas as dimensões da cultura e da comunicação, talvez, sejam as esferas em que as invenções da juventude do século XXI expressam-se com mais propriedade.
O 7º Fórum de Ideias Inovadoras em Políticas Públicas (FIP) coloca em pauta os sonhos, as novas formas de política e de arte da experiência contemporânea da juventude. Desvelar, debater, compreender essa experiência é um dos maiores desafios da sociedade atual; e, muito especialmente, das instituições governamentais.
Narrar, ouvir, e ver as manifestações dessa experiência, talvez, seja o caminho mais instigante para a construção de diálogos mais generosos com a juventude.

"Um gato chamado Gatinho", de Ferreira Gullar


Desenho de Ferreira Gullar


O ron-ron do gatinho

O gato é uma maquininha
que a natureza inventou;
tem pêlo, bigode, unhas
e dentro tem um motor.

Mas um motor diferente
desses que tem nos bonecos
porque o motor do gato
não é um motor elétrico.

É um motor afetivo
que bate em seu coração
por isso ele faz ron-ron
para mostrar gratidão.

No passado se dizia
que esse ron-ron tão doce
era causa de alergia
pra quem sofria de tosse.

Tudo bobagem, despeito,
calúnias contra o bichinho:
esse ron-ron em seu peito
não é doença - é carinho.


O gato curioso

Era uma vez era uma vez
um gato siamês.

Por ser muito engraçadinho,
é chamado de Gatinho

Além de ser carinhoso,
ele é muito curioso.

Nada se pode fazer
que ele não deseje ver.

Se alguém mexe na estante,
está lá no mesmo instante.

Se vão consertar a pia,
está ele lá de vigia.

E o resultado é que quando
viu seu dono consertando

a tomada da parede,
meteu-se com tanta sede,

a cheirar tudo que – nhoque!
levou um baita de um choque!

E pensa que ele aprendeu?
Mais fácil aprendia eu!

Mantém-se o mesmo abelhudo
que quer dar conta de tudo.


Gato pensa?

Dizem que gato não pensa
mas é difícil de crer.
Já que ele também não fala
como é que se vai saber?

A verdade é que o Gatinho,
quando mija na almofada,
vai depressa se esconder:
sabe que fez coisa errada.

E se a comida está quente,
ele, antes de comer,
muito calculadamente
toca com a pata pra ver.

Só quando a temperatura
da comida está normal,
vem ele e come afinal.

E você pode explicar
como é que ele sabia
que ela ia esfriar?



A fala do gato

O gato siamês
tem uns vinte miados:
alguns são suaves,
outros exaltados;
há os miados graves
e há os engasgados.
É quase um idioma
que ainda não entendo
mas o gato bem sabe
o que está dizendo.

E até falou comigo
em linguagem de gente.
Disse: “meu amigo”,
assim de repente.

Então eu acordei
feliz e contente!
Era sonho, claro.
Mas, como se sabe,
é no sonho que ocorre
o que se deseja
e no mundo não cabe.


Companheiro fiel

Se estou trabalhando
– seja a que hora for –
Gatinho se deita ao lado
do meu computador.

Se vou para a sala
E deito no sofá,
Ele logo vai pra lá.

Se à mesa me sento a escrever poesia
e da sala me ausento
pela fantasia, volto à realidade
quando, sem querer,
toco de revés
numa coisa macia.

Já sei, não pago dez:
é o Gatinho que sem eu saber
veio de mansinho
deitar-se a meus pés.


Dono do pedaço

Para qualquer outro gato,
Gatinho não dá espaço.
Em nossa casa ele impera
– é o dono do pedaço.

Certa vez uma vizinha
– que era de fato uma tia –
pediu pra deixar seu gato
conosco só por um dia.

Mal o gato entrou em casa,
Gatinho se enfureceu,
pulou em cima do intruso
que, assustado, correu.

Gatinho saiu-lhe atrás
aos tabefes e às unhadas,
correram os dois pela casa
na mais louca disparada.

No quarto, em volta da cama,
por baixo e por cima dela,
rodaram como foguetes,
sumiram pela janela.

Só depois de muito esforço,
pude conter o Gatinho,
enquanto o outro fugia
pro apartamento vizinho.

Assim acabou-se a guerra
que me serviu de lição:
proibo a entrada de gatos;
só gatas têm permissão.


Final

Era o que eu tinha a contar
sobre o meu gato Gatinho
que muito tem me ensinado
de amizade e de carinho.

Um siamês, pêlo escuro,
olhos azuis, cara preta,
é o bicho – lhes asseguro –
mais “fofo” deste planeta.